O groove selvagem da Funk Music.

Como a criação do Funk trouxe uma sensação de libertação para música negra, e a importância do seu efeito revolucionário na década de 70.

Rosa Carolina
Pirata Cultural
5 min readJan 9, 2018

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George Clinton & Parliament — Funkadelic

Pela primeira vez desde sua criação o Hip hop/Rap ultrapassou o Rock e se tornou o gênero mais consumido atualmente, essa conquista vem de um longo caminho em que a música negra foi retirada de sua posição marginalizada e foi reconhecida por um público em massa. Para atingir esse patamar vimos uma revolução musical acontecer durante os anos, provando se aperfeiçoar através do surgimento de novas técnicas e roupagens. Esse aperfeiçoamento trouxe um novo estilo que foi diretamente responsável pelo amadurecimento da sonoridade e abertura ao conservadorismo que começava a se degastar.

Justamente nessa época de transição social e sonora surgiu o Funk/P-Funk, estilo setentista oriundo do R&B juntamente ao rock, jazz e o soul, uma mistura enérgica e sensual da música negra. Sua influencia é sobressalente não só na música, como na cultura da moda e do comportamento em si. O visual era a referência versátil e chamativa, uma mistura de elementos que compunham todo o gênero.

Após a criação da Motown — gravadora de Detroit responsável por artistas como Stevie Wonder, The Jackson 5 e Diana Ross — e a explosão do Jimi Hendrix pro mundo, a música negra foi explorando seu espaço entre as vertentes, fazendo todos os tipos de sons diferentes. Dessa criação, veio os riffs repetitivos, o abraço do baixo elétrico e a bateria criando o groove, destoando do R&B que utiliza das progressões de acordes.

Com a abertura de um campo criativo impulsionado pela mudança social dos anos 60, os produtores e compositores viram a chance de fazer da subversão criada em torno desse termo (o funk na língua inglesa tem uma conotação sexual e “suja”) uma forma de diversão e variedade para experimentar uma mistura de todos os ritmos já existentes. O soul/ R&B com seu poder tocante, o rock como grito de força, o jazz em seu lado mais soft e o boggie para extasiar seus bailes.

Essa conexão firmou-se com a figura artística e ousada de James Brown, padrinho do Funk com sua ponte entre o Soul e teor melódico retirado da escala do blues. O primeiro passo dado pelo mesmo para essa criação é encontrado em 1964 com o lançamento de “Out of sight” na primeira faixa nominada pelo álbum. Após esse lançamento era perceptível a execução de algo revolucionário que mudaria a música dali pra frente.

Em 1967 Jimi Hendrix lançou seu primeiro álbum “Are you Experienced”, com um grande reconhecimento, sua escala poderosa foi uma das bases que inspiraram muitos guitarristas do Funk. O apoio entre os músicos da época era grandioso, Jimi antes de se juntar ao The Experience tocou com The Isley Brothers, grupo de soul e R&B entre 1964 e1965, podemos assim considerar também como marco inicial do Funk — ouça Testify pts 1 e 2.

O estilo de Hendrix influenciou diretamente em guitarristas como Ernie Isley e Eddie Hazel, esse que futuramente viria a trabalhar com George Clinton, grande pai do subgênero P-Funk surgido na década de 1970.

O elo para o surgimento do P-Funk foi no ano de 1968 com a banda Sly and the family Stone que, ao atingir o top 10 da Billboard Hot 100 com hits como “Dance to the music” e “Every day People”, abriu caminho para George Clinton — arquiteto do P-Funk ao introduzir uma sonoridade psicodélica à Funk music.

George foi um compositor da Motown nos anos 60, que ao se ver frustrado na gravadora decidiu explorar o seu lado de produtor, ao trabalhar com músicos de soul independente de Detroit, que formavam o grupo “The Parliaments”. Dessa parceria emergiu posteriormente o “Parliament- Funkadelic” (daí o nome P-Funk), dois grupos gerados por Clinton que dominaram a cena musical dos anos 70, com seus respectivos álbuns enérgicos: “Free your mind…”, “Maggot Brain” e “Up for the Down Stroke”.

Segunda faixa do álbum, guitarra de Eddie Hazel

É importante ressaltar a influência direta na moda trazida por esse subgênero, o visual extremamente extravagante e moderno era a marca registrada, gerando uma adição provocativa e apelativa, casando com o som da época, sensual e dançante.

Acompanhando o hype setentista, as oportunidades para músicos e bandas despontarem na cena foi amplo. Grupos como: Earth, Wind and Fire; Kool and the Gang; Zapp; The Commoders; The Gap Band; Cameo; Chic; Mandrill, Ohio Players; assim como artistas solos como Kurtis Blow (pai do Hip Hop), Betty Davis, Baby Huey e Chaka Khan encontraram seu espaço no mercado.

Graças a esse gênero vimos a ascensão da música negra não só na gringa, assim também como no Brasil. Nomes como Banda Black Rio (Maria Fumaça), Tim Maia (Racional vol1 e vol2), Antonio Carlos e Jocafi (Mudei de Ideia), Jorge Ben (Solta o Pavão), Os Diagonais (Não vou chorar), Miguel de Deus (Black Soul Brothers) e tantos outros foram os responsáveis por representar o gênero em nosso país.

Black Soul Brothers — 1977

Nos anos 80, o funk tradicional foi perdendo aos poucos sua popularidade à medida em que as bandas se tornavam mais comerciais e a música mais eletrônica. Seus derivados, o rap e o hip hop, porém, começaram a se espalhar. A partir do final dos anos 80, com a disseminação dos samplers, partes de antigos sucessos de funk (principalmente dos vocais de James Brown) começaram a ser copiados para outras músicas pelo novo fenômeno das pistas de dança, a house music.

Perdendo sua força e energia acumulada e até mesmo saturada da década de 70, o Funk perdeu sua posição nas paradas de sucesso sendo substituído por diversos gêneros emergentes da época. A Pop music de Michael Jackson começara a dominar os charts e o mundo já se remodelava assim como o discurso e a moda. Mesmo com esse declínio, George Clinton se viu homenageado em outros gêneros, citado como principal influenciador dos Red Hot Chilli Peppers, o mesmo trabalhou como produtor do album ‘’Freaky Style’’ de 1985.

Cover do grande sucesso de Sly, and the family Stone.

A difusão do Funk tradicional é o exemplo perfeito de como a música negra conseguiu se renovar apenas experienciando seus estilos convencionais. Ela é a quebra de um paradigma reverenciando a versatilidade criacionista dos músicos daquela época. Seu surgimento é de demasiada importância para que a música contemporânea possua elementos atemporais mesmo passado quase 50 anos.

Isabela Carolina Rosa

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