O que os novos movimentos musicais estão falando?

Assim começa a banda O Terno “Eu tenho achado tudo chato, tudo ruim, será que o chato aqui sou eu?”

Kaique Zacarias
Pirata Cultural
6 min readOct 1, 2017

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O óbvio se tornou fruto para temáticas musicais nos tempos em que vivemos. O que era crítica ou objeto de medo, tem-se manifestado de forma natural e muitas vezes, de forma intensa e didática para todos. A sociedade que é movida todos os dias, seja pelo celular ou rádio (sim, ele ainda existe) elevada ao som da novidade. Minha pergunta é, estaríamos nós prontos ao novo? Afinal, como dizia o já falecido profeta Belchior:

“Nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam não, você diz que depois deles não apareceu mais ninguém.”

Estaria errada tal afirmação? Ainda existe quem acha que não apareceu mais ninguém? Será que não apareceu mesmo? Dá forma que não existe Legião sem Renato e sim, com André Frateschi. Isso é revelado em projetos como o da banda O Terno com os álbuns “66” ao “Melhor do que Parece”, que reivindicam a busca pelo som independente que aos poucos toma territórios como as telenovelas. A banda é paulista e tem influencias d’Os mutantes aos The Beach Boys. Além disso também tem como influência, o seu pai Maurício Pereira, fundador e integrante d’Os Mulheres Negras, apelida por eles como a terceira menor big band do mundo. Esse fato, torna fundamental no nosso debate. Quando foi que construímos uma visão sobre: O que são as bandas de hoje pós influências?

Todo esse diálogo aponta para chegarmos no selo fonográfico SELO RISCO. Fundado por Gui Jesus e com função de juntar o coletivo de bandas no cenário independente. Podemos destacar os Mustaches e os Apaches, banda difusa do folk americano e Charlie e os Marretas que anunciam em sua música “Quem sentiu o groove…” e “É funk brasileiro com tempero latino”, essa ideia de rompimento de barreiras. A Banda do Mar que é composta por Mallu Magalhães e Marcelo Camelo, segue o mesmo caminho colocando em voga o tabu musical do funk, vulgo passinho do romano. A ideia disso tudo é que, a nova indústria musical é construída através de indústrias independentes dos próprios artistas: Uns Produções, Biscoito Fino, SELO Risco… Enfim, esse debate cabe a outro artigo. Abaixo pulemos para o que realmente importa.

“Hoje uma das tendências é evoluir o quadro para que as bandas possam atingir um limite inatingível que pudesse agregar a todos, o que ainda, não foi possível.” — Tim Bernardes, em entrevista para o Programa Cultura Livre.

Precedentes dos pós-modernos: A pós-modernidade é um conceito da sociologia histórica que designa a condição sócio-cultural e estética dominante no capitalismo após a queda do Muro de Berlim (1989), o colapso da União Soviética e a crise das ideologias nas sociedades ocidentais no final do século XX, com a dissolução da referência à razão como uma garantia de possibilidade de compreensão do mundo através de esquemas totalizantes.

O que realmente acontece é a construção dos movimentos musicais da pós-modernidade brasileira que tardiamente chegaria, assim como a queda do muro de Berlim deixa a cultura homogênea. Obviamente que os traços brasileiros antemão são completamente importantes, ou seja, o trilho da MPB inicial em SP, quando desafiava a Bossa no Rio, o tropicalismo, movimento transeunte e forjado das áreas artísticas (teatro, cinema, arte, linguística e música) formado em 1967 e o som fundamental das desafiadoras guitarras da Jovem Guarda. Hoje o folk e o indie se mostram presentes na música da classe média, enquanto a produção mágica da periferia o funk, o rap, o sertanejo universitário (cultura da área de periférica do interior do Sudeste e Centro-oeste), o tecnobrega (Norte) e o axé music (Nordeste), toda essa produção cultural serve para mostrar que sim, todas essas facetas são cultura, todas essas estruturas são presentes em diversos grupos musicais e como diz Caetano, boa parte dessa estrutura se forja a nova tropicália.

“O funk carioca, o sertanejo universitário e os restos da axé music [são a nova tropicália]” — Caetano Veloso, em entrevista para o canal BBC NEWS.

E essa tal pós modernidade? O que ela tem haver com isso? A verdade é que os grupos musicais e o compositores de carreira solo são críticos nascentes dessa pós modernidade. Se nos outros movimentos existiam uma proposito causal ao governo da época, hoje não se mostra diferente, porém as pautas correspondem perfeitamente a outras situações. Vamos exemplificar, a causa LGBT+ apresentada pela Liniker e os Caramelos, Karol Conka e outros artistas.

A causa contra racismo exposta por artistas como Criolo, Emicida e Rincon Sapiencia.

Tulipa Ruiz como outro exemplo traz uma mulher que foge dos estereótipos e apresenta a mulher gorda e latina americana, além do seu total ativismo feminista em sua arte musical e plástica.

Peitos, de Tulipa Ruiz.

Phillip Long é outro artista que apresenta uma pauta muito importante que é o traço do movimento pacifista (Thoreau, Ghandi, Luther King Jr.) lá do século XIX, que vai desencadear em todo século XX até a pós modernidade.

E nesse parágrafo final, que por modéstia parte é fundamental para entendimento deste artigo, eu como historiador ainda pré formado, não poderia deixar de aguçar a curiosidade de vocês, assim como a minha é tremendamente aguçada. Quando em algum momento da história nós seremos completamente recepcionados com a cultura total do século XXI? Afinal toda essa pós modernidade que é citada, a todo momento nesse texto é fruto de um século passado e é essencial de grandes músicos, ou seja, Chico para Criolo, Gil para Sinara, Caetano e Milton para Dônica, Tom Zé para O Terno. Sendo assim, o fruto da música atual brasileira não é apenas fruto de pós modernidade, é fruto de globalização, é fruto da migração. Para esclarecer, até o século passado era necessário que as estruturas dos movimentos, que iniciarem em estados do sudeste tal qual; Bossa no Rio e a MPB em Sampa (hoje não é diferente, porém, essa aglomeração teve sua expansão. Isso é bem claro quando olhamos o panorama nortista por exemplo, a Fafá de Belém). A realidade que quem está envolvido musicalmente a tudo isso, são de certa forma migrantes em maior parte, tal hora do sul, tal hora do nordeste (esse fluxo costuma ser, primeiro os baianos, depois os cearenses…), a verdade, onde chegamos com essa tal globalização? Qual a acessibilidade de plataformas virtuais? Qual a potência que o som pode nos dar? Ou nos deu? Porém nosso artigo de hoje, não tem como foco isso, nosso foco é “o que os novos movimentos estão falando”, clara surpresa, a tendência dos novos movimentos é sem dúvidas a mistura, expor as influências, expor as militâncias (isso inclui sem dúvidas o empoderamento das causas sociais: LGBT+, feminista, negro, pobreza e por fim, a crítica aos meios de informações no nosso tempo). A tendência desses novos movimentos é progenitar arte e com a antropofagia pessoal. Poderia passar dias e meses mostrando novos movimentos musicais e novos grupos: solos; Criolo, Tulipa, Liniker, Johnny Hooker. duplas; Liniker/ Hooker, Ruiz/ Jeneci, Clarice Falcão/ Tim Bernardes, Magalhães/ Camelo. grupos; Trupé do Chá de Boldo, O Terno, Charlie e os marretas, Dônica, Selvagens à Procura de Lei, Tatá Aeroplano. A verdade é: os novos movimentos são críticos à pós modernidade. E por fim, o que será que eles falarão no ano que vem?

Esse texto faz parte da semana temática da Pirata Cultural “Qual é a da música popular brasileira hoje?”. Se curtiu bata palmas e siga a Pirata!

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Kaique Zacarias
Pirata Cultural

Historiador e professor, poeta frustado e fracassado em tentar fazer o trabalho invejável como é o de Nelson Motta. Criador da pagina A R T E s i s m o.