O que é o Q de LGBTQ?
A identidade Queer faz parte de uma política de ressignificação dos gêneros.
Desde que surgiu como movimento, a união de gays, lésbicas, bissexuais e pessoas trans passou por muitas transformações. No início, se existia uma divisão muito marcada entre as diferentes ‘categorias’, com o tempo e amadurecimento buscou-se unir as amplas expressões de sexualidades e gêneros, com o intuito de somar forças. A partir desse princípio, a atual sigla LGBTI+ (no Brasil), ou LGBTQ (nos Estados Unidos), ganhou outras letras, que surgem por demandas internas.
Muitas vezes são apoiadas por movimentos teóricos, e o Queer em LGBTQ pode ser considerado um destes. A Teoria Queer, que compreende uma série de empreendimentos na sociologia, estudos culturais, antropologia, filosofia, artes e diversos outros campos do saber, é a principal influência nessa identidade.
Pode soar estranho falar em “surgir” uma identidade, mas devemos nos lembrar que identidades servem para afirmar o sujeito perante a sociedade. Quando diversos teóricos queer desconstroem as ideias de gênero e sexualidade, consideram o gênero uma construção social e, por isso, antinatural e passível de subversão, a mera existência de uma corrente assim torna os corpos apagados pela hegemonia heteronormativa em protagonistas de sua própria existência.
O Queer é o corpo abjeto. O corpo estranho, indesejável. A bicha feminina, a transviada, a sapatão caminhoneira. Esse tanto de termos, pejorativos ou não, que denominam outras pessoas. Essas marcações de gênero, o gay feminino demais, a lésbica machona demais, dão espaço a identidade que quer dignidade para esses corpos.
Esses corpos, essas pessoas, também amam. Também precisam de um emprego. Também têm direito de viver.
São constantemente discriminadas e apagados pela sociedade, inclusive por homossexuais, que reproduzem o modelo heterossexual e binário de gênero. Punidos por não “fazerem” seu gênero corretamente, violentados por puro ódio.
A POC, a bichinha que sai maquiada, a feminina do rolê, podem não sentir-se mais contempladas com a identidade gay. Pode não ser o suficiente para a maneira como se expressa no mundo. Pode querer usar outra identidade como protesto.
Aqui no Brasil, a sigla é LGBTI+ (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e intersexuais). O Queer, ainda acadêmico demais, talvez nunca chegue as bases da comunidade. Mas outras denominações começam a surgir, com expoentes nas artes.
É o caso da “bicha travesti” ou “transviada”. A cantora Linn da Quebrada se intitula assim e canta sobre a vida, os relacionamentos e as dores em ser uma transviada em seu disco “Pajubá”. Vejo os termos Queer e Transviada muito próximos, cada um contemplando a realidade de sua língua.
Sendo assim, a existência de uma sigla para corpos que desejam maior representatividade, corpos não completamente contemplados com as identidades atuais, tem o poder revolucionário de terrorizar o gênero (tomando aqui a autodenominação de Linn, “terrorista de gênero”).
Subverter a ordem é questionar o sistema que insiste em subjugar o feminino e valorizar o masculino. Essa lógica é tóxica e afeta muita gente, muito mais do que qualquer sigla, de LGBT até LGBTQIA+, possa conter.