Precisamos falar sobre o pânico

Larissa Cascaldi
Pirata Cultural
Published in
4 min readNov 2, 2017

Roubo título do texto da imagem. A depressão é uma imersão — o pânico também. Somente em 2001, a OMS estimou que pelo menos 5% da população mundial possuía a síndrome do pânico — e esses números se referem apenas a um ano em que a Globalização praticamente acabara de acontecer. Hoje, quase 15 anos depois dessa pesquisa, acho que podemos estimar que essa porcentagem subiu um pouco , ou talvez muito, não achei dados recentes da OMS para fazer a comparação.

Ouvimos e lemos todos os dias: “cresce o consumo de antidepressivos”, “as pessoas estão mais estressadas” e tantas outras manchetes sobre o tema nos cercam, mas ainda assim encaramos esses fatos cegamente. A verdade é: o pânico está aí, a depressão está aí e tantos outros transtornos psicológicos. E fico me perguntando o porquê ainda hoje, momento em que esses transtornos foram denominados “doenças pós-modernas”, nós ainda as consideramos temas tabus ou nem as consideremos.

Não sou psiquiatra para dar uma definição médica sobre o que é o pânico. Mas convivo com ele há 3 anos, então acho que se fosse pra defini-lo seria mais ou menos assim: o pânico é uma crise de ansiedade extrema (não, não é aquele friozinho na barriga que a gente sente antes de falar em público) somada com uma boa dose de medo. Junte os dois ingredientes numa tigela e a receita está completa: pânico. Se racionalizarmos o processo, a crise funciona assim: você está bem → o seu organismo interpreta alguma situação ao seu redor como uma situação de perigo → você fica ansioso → o seu organismo se prepara para a situação de perigo → você perde o controle.

Dentre os sintomas desencadeados pelo pânico estão desde o coração acelerado, até a sensação de falta de ar. Em casos extremos você chega a pensar que vai morrer. Sente formigamento no braço, dor no peito, como se fosse um infarto. E ainda tem gente que insiste em dizer que isso não é nada. Que isso não existe. Que isso é frescura. Tem também até aquele velho argumento: você precisa controlar seus nervos, ser menos histérica. Pois é.

Como eu disse no começo, o pânico é uma imersão. Talvez no auge dos meus 20 e poucos anos essa seja a experiência mais assustadora pela qual eu tenho passado. Identificá-lo não é fácil, aceitá-lo não é fácil e assumir que você precisará tratá-lo pode ser extremamente avassalador, porque infelizmente a psiquiatria ainda é um tabu, e no auge da individualidade pós-moderna as pessoas parecem não se preocupar com nada que não lhes atinja. “Seja mais forte”, eles dizem — afinal, o mundo é feito para as pessoas fortes. Não dá tempo de ter “crise de histeria”, não dá tempo pra mostrar fraqueza, não dá tempo de perder o controle. Só dá tempo de produzir e mostrar resultado.

Uma amiga minha disse uma vez que cada crise de pânico é um recomeço. São mortes e renascimentos constantes com o qual eu tenho que lidar no meu dia-a-dia. E antes de cada morte, o medo se instaura levando, talvez, um pedacinho a mais de mim. São mortes que podem durar minutos, as vezes horas. Só quem viu alguém nesse leito psicológico talvez entenda a pontinha do iceberg que é o Pânico.

O Pânico te consome de dentro para fora. E, assim como um iceberg, se consolida nas águas mais profundas de um oceano. Mas dessa vez, o oceano é você. O Pânico é uma imersão na medida em que, para tratá-lo você precisa olhar para si mesmo. É preciso olhar para essa escuridão interna e ter coragem de jogar uma luz nela. Daí a necessidade da psiquiatria, da psicoterapia, da psicologia e tantas outras esferas que se dedicam a estudar o nosso eu interior.

Se eu pudesse fazer uma avaliação desse “3 anos pós-pânico”, acho que o descreveria como a pior e a melhor experiência da minha vida. Quando você consegue jogar uma luz nessa escuridão e compreender um pouco melhor o próprio interior é que vem o renascimento. Tudo fica mais pesado com o pânico, mas o aprendizado pós-crises ajuda a tornar a vida mais leve. Pensar que a vida não é só produção, mas também saúde, amor próprio.

Me questiono até quando, em um contexto em que o Pânico ganhou o bonito codinome de “doença pós-moderna” vamos no silenciar, não só diante dele, mas também de outras doenças psicológicas. Precisamos quebrar o tabu, precisamos falar sobre o pânico e outras doenças psicológicas, não porque eu, ou qualquer pessoa que enfrente essa situação seja digna de pena. Não, nós não merecemos pena. Merecemos uma sociedade que não vire as costas para problemas tão sérios, mas sim que saiba lidar com isso diante de eventuais situações. Precisamos falar sobre o pânico, porque as pessoas precisam saber o que é, porque a gente precisa desenvolver empatia pelo outro, independente desse outro estar com problemas ou não.

Fica aqui então, meu relato. Depois da escuridão, a luz. Depois da morte, o renascer. E da imersão provocada pelo pânico, lá no fundo onde ele se acomodou, começam a surgir raízes, que finalmente se transformam em flores.

APELO: O Pânico é uma doença que não tem cura, mas é possível estabilizar as crises com a terapia e acompanhamento de um psiquiatra. Se você está manifestando um dos sintomas procure imediatamente ajuda médica. Existem clinicas sociais e as universidades de psicologia também oferecem serviços gratuitos. Procure ajuda e não se cale. Tudo vai ficar bem =)

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Larissa Cascaldi
Pirata Cultural

Uma jornalista observando o mundo, colecionando aprendizados.