Sofia Coppola traz sutileza feminina ao remake de ‘The Beguiled’

A diretora deixa de lado a concupiscência carnal da versão de Don Siegel e se foca no suspense vivido pelas garotas

PITACO NOVO
PITACO NOVO
3 min readAug 13, 2017

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Talvez por conta de uma identificação mais imediata com as personagens, a versão de Coppola consegue ser mais fidedigna e degustável. (Imagem: Divulgação/ Entertainment)

Por Valsui Júnior

Ao contrário do que poderia se supor assistindo o trailer de The Beguiled (2017) de Sofia Coppola, o filme traz muito menos carnificina. O oposto disso é o que mais pode ser celebrado na versão da diretora: a sutileza em colocar o centro da trama nas protagonistas em um filme que aborda a Guerra Civil (1861–1865). O longa, que conta a história de um soldado confederado achado próximo a um seminário exclusivo para garotas, típico da segunda metade do século XIX, tem o ritmo de Coppola em fazer filmes. Algo como visto em The Virgin Suicides (1999), porém numa pegada um pouco mais comercial e degustável para o público — mas nada comparado a The Bling Ring (2013).

Talvez por se tratar de um filme de época, o figurino, assinado por Stacey Battat, lembra bastante o que já foi produzido por Sofia Coppola em Marie Antoinette (2006). O remake de The Beguiled dá um gosto de como era ser mulher naquela época, num Estados Unidos da América ainda em formação. Há uma diretora superprotetora (interpretada pela Nicole Kidman), uma professora romântica (no papel, Kirsten Dunst) e uma adolescente rebelde disposta a tudo para viver suas experiências (interpretada pela Ella Fanning). Ao contrário das figuras de Clint Eastwood e de Geraldine Page que prevalecem (e muito) a figura das meninas do seminário feminino, na versão de Coppola as meninas que têm o papel principal.

Elle Fanning tem um papel especial como uma adolescente que acaba sendo seduzida pelo cabo. (Imagem: Divulgação)

Esse time maravilhoso de mulheres não poderia dar outra opção do que fazer um filme cuja as interpretações são a cereja no bolo do longa. Muitos detalhes no remake de Coppola, como expressões faciais e pequenos gestos deixam o filme mais degustável para o público do que a versão de 1971. Outra questão que envolve a versão anterior: as cenas de sexo, em especial o take em que todas as mulheres estão deitadas com o cabo John McBurney, tiram da trama esse tom mais detalhado e intimista.

Se Siegel fez um filme conforme o padrão do século em questão, Coppola conseguiu deixá-lo bem mais degustável.

Por outro lado, a versão de Coppola foi acusada de fazer blackwashing, ou seja, excluir da nova versão personagens de outras etnias. Isso aconteceu porque na versão de Don Siegel, uma das oito personagens do filme era uma escrava negra que acabava também sendo seduzida pelo soldado. Quanto à questão, a diretora se justificou em entrevista ao site americano Indiewire. “Sinto que não dá para mostrar a perspectiva de todos numa história. Estava focada só neste grupo de mulheres”, disse Coppola.

É inegável, no entanto, que ao fazer uma breve retrospectiva da filmografia da diretora, muito pouco ou quase nada se enxerga de um elenco mais miscigenado — tirando, é claro, a exceção óbvia de Lost in Translation (2003). A crítica, no entanto, faz sentido quando se pensa que o universo retratado por Sofia no remake deveria se resumir às meninas brancas. Longe da questão racial em torno do filme, Coppola conseguiu deixar a nova versão do longa mais aprazível do que a versão de 1971. Num dos primeiros minutos do filme dirigido por Don Siegel, por exemplo, o soldado supõe que beijar uma menina de 13 anos seria algo natural — o que o público certamente não aceitaria com tanta facilidade em um filme de 2017. Se Siegel fez um filme conforme o padrão do século em questão, Coppola conseguiu deixá-lo bem mais degustável.

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