A novidade do gol

Luísa Nunes
Pitaco
Published in
3 min readJun 23, 2018

As pessoas gritam ao meu redor, naquele pequeno bar, todas com os olhos fixos na televisão. Eu também grito, sem nem entender direito o porquê, com as mãos ainda engorduradas das batatas fritas que acabamos de comer. Sempre ouvi falar no quanto a faculdade nos trazia experiências novas, só que eu nunca imaginei que elas seriam tão aleatórias. Mas aqui eu me encontro matando minha aula preferida em um bar com quatro gremistas, um colorado e uma carioca que se recusa a escolher um time gaúcho para torcer.

Pouco tempo atrás, vi meus amigos comemorando com todas as forças a vitória do Grêmio na Libertadores. Eu os vi nas redes sociais e a alegria deles me contagiou, mesmo eu nunca tendo sido uma grande entusiasta do futebol. Meus pais nunca gostaram e me passaram esse sentimento de indiferença quanto ao esporte. Mesmo sendo gremista, nem vi o jogo que nos deu o troféu, muito menos fui às ruas fazer festa e gritar até ficar sem voz. Hoje, na semifinal do Mundial, minha amiga fanática está desesperada para ver o jogo, e me chama para ir junto.

Não foi a vontade de ver o jogo que me fez aceitar o convite. Foi a curiosidade, a busca por essa nova experiência antes tão distante de mim. Saímos, então, à procura de um bar para vermos a partida. Caminhamos por um bom tempo e eu sugiro desistir, mas eles não podem perder a semifinal por nada. Quando finalmente achamos um pequeno bar escuro (mesmo tendo muito sol lá fora), com cheiro de fritura e com uma TV na parede, nos acomodamos nas mesas bambas e pedimos uma porção de fritas.

Então, toda a minha curiosidade se faz sentido: isso aqui é realmente surreal. O bar enche no breve tempo em que a gente come as batatas. Tem muitas pessoas — a maioria homens com uns 40 anos — já sentadas aqui. Alguns tinham reservado lugares especialmente para o jogo. O barulho aqui dentro é ensurdecedor, a agitação e ansiedade pelo jogo que logo vai começar aumenta a cada segundo. Até que o jogo começa e o barulho termina, todos os olhos voltados para a não tão grande tela. Só o meu olhar não está fixo na partida, pois, para mim, o mais interessante é observar as pessoas ao meu redor. A cada “aaahhhh”, ou “uuuhhh” que escuto, tenho vontade de rir e eu rio até começarem a olhar torto para mim por estar atrapalhando o jogo.

O colorado comemora com discrição cada erro do Grêmio, para não ser julgado pelo bar cheio de tricolores. A carioca, quando perguntada por quem ela estava torcendo, só sorri e não responde. As gremistas eu nem preciso dizer: olham tensas, com as mandíbulas apertadas, acompanhando cada passe dos jogadores. Que bom que tem outra perdida no futebol me acompanhando. Ela grita “falta!” pra qualquer movimento, o que logo vira piada entre o nosso grupo.

Alguém que estava de fone grita, antecedendo o gol que está por vir na TV. Me distraio olhando para menina que gritou até que o bar parece explodir. Quase todos levantam de seus lugares, batem nas mesas, riem de felicidade e gritam com toda a força. A amiga que me convidou para o jogo, sempre tão calma, grita “chupa, colorado filho da puta” na cara do nosso amigo que não demonstrou nenhuma reação com o gol (ou demonstrou? Não consigo observar tudo nessa confusão). Eu vejo todos os meus amigos completamente agitados de um jeito que eu nunca vi e por um momento fico até sem entender, mas sou influenciada pela agitação e em segundos também grito, bato na mesa, abraço as gremistas.

Depois do jogo ir para os pênaltis, o Grêmio vence, mas quem mais ganha sou eu. Voltamos para a faculdade ainda rindo e comemorando, e me sinto diferente depois dessa experiência louca e nova para mim. Fico pensando na Copa do Mundo, quero participar dessa excitação de novo. Mas agora vou pra palestra da Semana da Diversidade porque, mesmo matando aula, ainda sou uma universitária.

--

--

Luísa Nunes
Pitaco
Writer for

Estudante de Jornalismo e admiradora de pores do sol.