A vida de um estudante por pedaços de papel

Objetivo do ensino universitário é o diploma e não conhecimento ou autonomia

Pedro Nakamura
Pitaco
3 min readMay 31, 2018

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Para que serve uma universidade? Qual o seu objetivo? Seria formar cidadãos? Formar trabalhadores? Ou seria produzir conhecimento? De qual tipo? O conhecimento só é válido se produzido dentro de uma faculdade? — são perguntas demais e poucas respostas. A universidade, que tem tanto a dizer sobre o mundo, entra em crise existencial quando suas perguntas se voltam contra ela. Quais os seus objetivos gerais e específicos, suas metodologias ou, pasmem, seus resultados?

Para os estudantes, perguntem-lhes, a meta do ensino universitário é o diploma e não o conhecimento. São anos trancafiados em salas de aula na busca por pedaços de papel: primeiro a colação de grau, depois o suposto dinheiro que o certificado promete.

Cena do filme “The Wall”, de 1982, com clipe da música “Another Brick in The Wall”, do Pink Floyd.

Entre a prisão, a fábrica e a escola (ou a universidade) existem mais semelhanças do que gostaríamos, apontou o filósofo Michel Foucault. As três instituições servem para disciplinar e moldar os indivíduos segundo as relações de poder constituídas. Servem para assujeitá-los como corpos dóceis e úteis à lógica dominante.

Nessa estrutura, a escola e a universidade são espaços de produção de sujeitos disciplinados que pela ordem zelem, a fábrica (ou qualquer empresa) é o ambiente do exercício dos aprendizados educacionais, mas sob a vigilância do controle laboral — metas de produtividade, oito horas diárias e respeito à hierarquia organizacional -, e a prisão é lugar de reeducação e punição para os que atentarem contra essa ordem estabelecida.

E m tal lógica, o sistema educacional serve, em sua maioria, para a formação de uma classe trabalhadora. Diferentes graduações como Engenharias, Ciências Sociais Aplicadas, entre outras, são idealizadas para gerar uma mão de obra especializada que atenderá a demandas econômicas. O aprendizado do estudante em uma universidade, portanto, não servirá à sua felicidade ou consciência, mas sim às necessidades que o mercado tem por profissionais que satisfaçam seus critérios.

Escolher uma profissão é um imperativo, e não ato de livre e espontânea vontade. O estudante é alguém que troca o tempo de sua juventude pela promessa de uma futura boa vaga no mercado de trabalho.

Ambiente de produção de sujeitos autônomos e de consciência crítica?

Por essas imposições do sistema, surgem as mais diversas esquizofrenias. A universidade torna-se a instituição cujo papel é chancelar a formação do trabalhador para o mercado, e, nisto, há o diploma. Um pedaço de papel que atesta matérias cursadas, tão somente.

É discutível que o ambiente universitário realmente ensine ou eduque, mas é fato que adquirir os conhecimentos propostos nos currículos não é o objetivo principal de quem vai às aulas. O que se quer é obter a chancela de que se está apto a ser um trabalhador competente. Parte dessa desconexão se dá porque os sistemas de ensino privilegiam saberes que não são necessários para os jovens viverem com qualidade, mas sim para produzirem bens e serviços.

Parte da discussão é buscar entender não apenas o propósito da universidade, mas o da educação como um todo. A quem ela serve? Ao estudante ou a outros interesses? Um processo que faz um jovem abrir mão do tempo de sua juventude para comparecer a aulas, cursos, estágios e estudar inúmeros conteúdos que serão esquecidos não parece servir-lhe. A vida, para ser vivida, exige outros saberes que não se aprendem em salas de aula.

O diploma, mais do que um atestado de conhecimentos, é um certificado de sujeição.

Artigo de opinião produzido para a cadeira de Jornalismo Opinativo da UFRGS, em 2018/1.

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Pedro Nakamura
Pitaco
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