Passar na universidade é difícil; mais ainda é sobreviver dentro dela

Políticas de inclusão social e racial democratizam o acesso às universidades federais, porém não garantem a permanência do cotista no ensino superior

Pedro Nakamura
Pitaco
3 min readJun 26, 2018

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A Lei de Cotas, sancionada em agosto de 2012, introduziu um desafio para as universidades federais brasileiras: a tarefa de incluir 50% dos estudantes da rede pública no ensino superior. Uma política de inclusão efetiva, contudo, não se encerra na reserva de vagas. Muitos cotistas vêm de realidades diferentes das comuns ao ensino superior público, tradicionalmente ocupado por estudantes e professores que pertencem à elite social e econômica do país, o que impõe dificuldades.

O modelo original da academia é para os abastados e não para as classes populares. Inclusão nenhuma é apenas instaurar cotas de ingresso — ela exige políticas que valorizem os estudantes e garantam sua permanência nos cursos de graduação e pós-graduação.

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Foto: Carla Zannela Souza/Arquivo Pessoal

Pela lei, metade das vagas de ações afirmativas devem ser preenchidas por alunos com renda familiar igual ou menor a um salário mínimo e meio, e a outra metade adota critérios de etnia a partir da população de negros, pardos e indígenas em cada estado. Desde a implementação do sistema, em 2005, até 2015, o percentual de negros no ensino superior mais do que dobrou: de 5,5% dos jovens pretos ou pardos cursando universidades, o número aumentou para 12,8%, segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O mesmo estudo, entretanto, também apontou a expressiva desigualdade racial do sistema educacional do Brasil. Na idade em que deveriam estudar em uma graduação, 53,2% dos negros cursam o ensino fundamental ou médio, enquanto a proporção para brancos é de apenas 29,1%.

Pretos e pardos correspondem à metade dos brasileiros, contudo, apenas cerca de 13% dessa população concluiu o ensino superior. Entre brancos, o número é de 31%. A democratização da educação por meio da política de cotas é essencial no contexto do país, mas é ineficaz sem um processo que vise a permanência dentro da própria universidade.

Reprodução: SAE/UFRGS.

Em estudo realizado nas Universidades Federais de Lavras (UFLA) e de Juiz de Fora (UFJF), por exemplo, constatou-se que a reprovação por falta de frequência era muito maior entre os ingressantes por cotas raciais. A pesquisa também apontou que mais de 70% desses alunos reprovavam por nota pelo menos uma vez ao longo do curso, enquanto o mesmo índice para não cotistas era de 54%.

Ações devem auxiliar o cotista em sua permanência no ensino superior. As recentes transformações na comunidade acadêmica exigem novas pedagogias e mais atenção à assistência estudantil. Reprovações e evasão, além de ruins para o estudante, são desperdício de dinheiro público.

Existem iniciativas governamentais que visam minimizar essas desigualdades, como o Programa de Bolsa Permanência (PBP), um auxílio financeiro destinado a estudantes de instituições federais em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Entretanto, programas como este têm sofrido cortes em suas verbas.

É preciso reinventar a universidade federal, e não apenas o vestibular. Entrar na faculdade é uma conquista, porém não é o final do caminho — pelo contrário, é o início de uma longa e tortuosa caminhada.

Artigo escrito por Camila Souza e Pedro Nakamura
Contribuíram Anderson Dorneles e Gabrielle de Luna

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Pedro Nakamura
Pitaco

Journalism student at UFRGS and Google Translate user.