Francisco Rider da Silva
Pitiú Textual das Artes
29 min readJul 16, 2024

--

RELATO: II ENCONTRO DE PROFISSIONAIS DA DANÇA DO AMAZONAS

A importância de se discutir, dialogar e refletir politicamente sobre a Dança como profissão e produção de conhecimentos.

Árvore e Pássaro, de Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa9894/chico-da-silva>

O II Encontro de Profissionais da Dança do Amazonas (11 a 15 de julho de 2023) teve sua abertura no suntuoso Teatro Amazonas, construído em Manaus, cidade no meio da selva amazônica, mas sem se ter a presença do verde das árvores na paisagem manauara. Teatro edificado no século XIX. Construído por pessoas indígenas e pessoas pretas, no intenso verão dos trópicos (alguém saberia responder?)?

Como diz a historiadora Edinea Dias, autora do livro “A ilusão do fausto: Manaus — 1890/1920”: “Investigar sobre Manaus impõe-se como uma necessidade para os estudiosos da região, mais ainda quando a pesquisa se volta para questões que, até hoje, não foram privilegiadas pela historiografia regional.” (2007).

A programação do evento acorreu no Centro Cultural Palácio Rio Negro, outro símbolo arquitetônico manauara que nos remete ao fausto e à beleza do Ciclo da Borracha (1853/1913).

O Sr. Marcos Apolo (secretário da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Amazonas) esteve presente para o discurso institucional, e como Mestre de Cerimônia, Ly Skant (Leo Scantbelruy), multiartista manauara.

A equipe de realizadores (as), colaboradores (as) e apoiadores (as), escolhida pela plenária do Fórum Permanente de Dança do Amazonas, ficou assim composta: realização: Fórum Permanente de Dança do Amazonas; apoio: Movimento Levante MAO, Corpo de Dança do Amazonas e Governo do Amazonas, por meio da Secretaria de Cultura e Economia Criativa; produção executiva: Adriana Goes, Wallace Heldon, Marcos Telles e Magno Fresil; relatos sobre o II Encontro: Francisco Rider (Site Pitiú Textual da Artes).

Essa segunda edição do evento foi, de certa forma, uma continuidade do I Encontro (2022): Multiplicidades de linguagens, gerações e vozes, com uma ênfase na busca da (h)escuta do Outro numa perspectiva de se estabelecer o conflito que alimenta, e a partir daí vislumbrar o consenso enquanto qualidade que beneficia o todo e que deseja transformar o contraditório em algo necessário, em prol do coletivo. O consenso — que não significa a uniformidade de opiniões e o acordar sem reflexão e sem pensamento crítico — é fundamental, especialmente no mundo atual repleto de lógicas de conflitos-guerras, em que o sentar para conversar se tornou quase impossível perante as mentalidades e cognições imperialistas e colonizadoras do mundo branco ocidental (vide o genocídio em Gaza, em que a negociação e o diálogo não existem), do capitalismo monopolista, do neoliberalismo e do fundamentalismo religioso, que certamente reverberam e atingem as conversas e as inter-relações cotidianas entre as pessoas, seja na vida comum, assim como na vidarte.

O que se busca nesses encontros propostos pelo Fórum, de fato, é o confronto necessário, mas o oposto do enfrentamento/pensamento armamentista e colonialista de mentes e corpos, porém um exercício de se decolonizar — “outras maneiras de ser, estar, pensar, saber, sentir, existir e viver” (Walsh); e se “descolonizar” (Quijano) — A prática de delocar-se, decolar-se, defazer-se, detruturar-se, deviar-se, depadronizar-se. A prática de desarmar-se, deslocar-se, descolar-se, desfazer-se, desviar-se, desestruturar-se, despadronizar-se.

Logo, a partir dessas práticas, pensar as danças feitas em Manaus, e no Amazonas, digo, também nos municípios amazonenses — precisamos inseri-los nas pautas de discussões do Fórum — , com um olhar de que nós artistas-corpos amazônidas desenvolvemos e elaboramos sim poéticas, conceitos, pensamentos e ideias, mesmo que não sejamos reconhecidos pelos territórios e lugares hegemônicos das artes e das culturas brasileiras; mesmo que não façamos parte do mercado das artes e dos saberes hegemônicos e canônicos, nós fazemos danças e artes, isto é, produzimos saberes e conhecimentos através dos nossos corpos e das nossas artes.

Assim, em diálogo com essas práticas e ideias de decolonizar-se e descolonizar-se, trazemos nos rios do corpo desse texto as imagéticas do artista acreano, Francisco Domingos da Silva (Chico da Silva. 1910 /1985 — AC). Chico tinha origem indígena, semianalfabeto e teve sua arte visível na década de 40 depois que o artista plástico suíço Jean Pierre Chabloz (1910–1984) viu seus desenhos em muros e em paredes de casas na Praia Formosa no Ceará. O artista antes de ser reconhecido por sua arte, consertava sapatos, guarda-chuvas e fazia fogareiro de lata para vender, e nas horas vagas coletava na praia cacos de telhas, carvão e folhas de árvores para produzir suas pinturas em casas e muros da praia. Suas obras receberam a Menção Honrosa na 33º Bienal de Veneza, em 1966.

Sem título, 1983. Foto: © Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://dasartes.com.br/materias/chico-da-silva/>

PROGRAMAÇÃO

11 de julho — Teatro Amazonas
20h — Cerimônia de Abertura com com a coreografia Fria Lousa, de Salomão Carvalho e o Corpo de Dança do Amazonas — CDA, com a coreografia Caput Art.5º
, de Jorge Garcia.
Mestre de cerimônia: Ly Skant

Como momentos dançantes dessa noite, o II Encontro teve a apresentação de duas companhias de dança: a independente Cia Expressão & Vida e a estatal Corpo de Dança do Amazonas (CDA), ambas apresentações escolhidas democraticamente pela plenária do Fórum Permanente de Dança do Amazonas, pois se pensou que seria importante que uma companhia independente dividisse a noite com uma companhia oficial.

Cia Expressão & Vida

Sem título, 1983. Foto: © Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://dasartes.com.br/materias/chico-da-silva/>

Segundo o coreógrafo e bailarino da companhia, Salomão Carvalho, a Expressão & Vida Organização Artística/Cultural Manaus, visa produzir e fomentar a cultura. Desde 2007 atua realizando produções artísticas nas mais diversas linguagens de dança, eventos e projetos. De acordo com Carvalho, a companhia desenvolve troca de informações no cenário da dança na cidade de Manaus para escoamento e intercâmbio das produções independentes. Incentiva as experimentações artísticas, viabiliza e realiza oficinas, seminários, workshops, eventos culturais e grupo de estudos relacionados a produções artísticas, com intuito de mapear e incentivar não somente produções, mas a pesquisa e a capacitação dos artistas envolvidos.

Fria Lousa

Elenco: Débora Júdice, Fabiane Lopes, Gleice Kelly, Jessica Makatt, Mell Rodrigues, Mael Araújo, Lucas Nogueira, Frank Bruço, Eduardo Cunha, Driz Rolim, Wanderson Silva.

Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://dasartes.com.br/materias/chico-da-silva/>

No release da obra coreográfica diz: Fria Lousa” tem como proposta investigações a respeito das relações humanas subjetivadas em múltiplos aspectos do cotidiano, abordando ações políticas para a diversidade cultural com temática LGBTQUAP+, étnico racial. As inquietações começaram através do coreógrafo percebendo corpos e personalidades diferentes no grupo, sobre processos de construção das relações humanas numa perspectiva de compreensão de si e do outro.

Assisti “Fria Lousa” em 2022 no X Festival Amazonas de Dança (X FAD), retomado após um hiato de dois anos (2020–2021). Segundo a SEC-AM, devido a pandemia do Covid-19. É importante problematizar que o fator pandemia não foi em si o principal motivo desse vácuo de dois anos, pois mesmo nesse período pandêmico o Festival de Teatro da Amazônia (FTAM) foi realizado pela Federação de Teatro do Amazonas (FETAM), como parte da programação da SEC-AM, no modo virtual. Assim, levanto as seguintes questões: A falta de mobilização, articulação e organização política da categoria da dança amazonense de reivindicar da SEC a realização do FAD (mesmo durante a pandemia), não contribuiu também para essa lacuna de dois anos? A pandemia do Covid-19 foi, de fato, a principal causa de dois anos da não realização do FAD? Por que durante os dois anos de pandemia a SEC não se articulou com proposições para que os trabalhadores e trabalhadoras da dança não ficassem sem a realização desse festival, que certamente contribuiria para a economia dos (as) artistas autônomos (as) e de grupos e companhias de dança independentes, que tiveram suas vidas econômicas precarizadas no período pandêmico?

Voltando ao espetáculo “Fria Lousa” apresentado no X FAD, no Centro de Convivência da Família Padre Vignolla.

“ Como a localização geográfica e o ambiente influenciam a criação, a linguagem e a compreensão da dança e da performance?”[1]

Um dado que me chamou atenção foi a escolha da companhia de apresentar a obra nessa edição do FAD no Centro de Convivência da Família Padre Pedro Vignola, na Cidade Nova (zona norte). Um local bem distante do Centro Histórico de Manaus, área da cultura hegemônica manauara, onde está localizado, por exemplo, o Teatro Amazonas, com uma arquitetura baseada na visão eurocêntrica de mundo; em geral, artistas, grupos e companhias de dança e de teatro disputam para apresentar suas obras cênicas nesse teatro icônico e tecnicamente privilegiado, frequentado, a maioria das vezes, por pessoas privilegiadas. Mas a Cia Expressão & Vida e alguns artistas (Wilhan Santos, com “Sobrevivência”; Francisco Rider com “Corpos-Troncos-Etc Jaz”; e Adriele Albuquerque, com “Imigra Breaking”) que participaram do X FAD, decidiram romper com essa lógica desejante de se apresentar nesse local canônico que é o Teatro Amazonas.

Essa escolha de apresentar o espetáculo num local fora do eixo cultural hegemônico já é em si uma atitude decolonial, pois descentralizar (centro / periferia) uma obra artística fora desse eixo sugere outras maneiras de ser, estar, pensar, saber, sentir, existir e viver, e provoca inquietações: Quais diferenças os corpos dos performers sentiram ao dançar, caminhar e se movimentar num chão de concreto? O que muda na corporeidade do performers ao se presentificar num espaço aberto, invés de um espaço fechado? Quais afetos ocorrem nos corpos? O que se “ganha” ou “o que se perde” nessa re/locação da obra e do corpo performativo para geografias urbanas periféricas?

[1] Movement Research Spring Festival Studies Project: Placing Performance 5/12/15. Fonte: Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=4NRa7c-1Ck0&t=884s> Acesso em: 01/08/2023.

Sem título, 1983. Foto: © Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://dasartes.com.br/materias/chico-da-silva/>

Corpo de Dança do Amazonas (CDA)

Adalto Xavier, em seu livro Dançando Conforme a Música (2002): “(…) se aproximavam os dias 23 e 24 de março de 1998, quando o primeiro concurso público estadual seria realizado em forma de audição no Teatro Amazonas (…) Joffre Santos foi escolhido para a tripla função de ensaísta, coreógrafo e diretor artístico, e Ivo Karagueorguiev para maître de ballet. Em poucos meses de sua criação, o Corpo de Dança do Amazonas estrearia sua primeira produção (…).”.

No Brasil a primeira companhia de dança oficial foi o Corpo de Baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, em 1936, sob a direção da bailarina e coreógrafa russa, Maria Olenewa; e há 15 companhias com esse perfil de corpo de dança, nas regiões Norte, Nordeste, Sul e Sudeste. E todas têm o balé clássico como base para o treinamento cotidiano.

Caput Art.5º, de Jorge Garcia

Sem título, 1983. Foto: © Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://dasartes.com.br/materias/chico-da-silva/>

Em entrevista via e-mail dada ao Pitiú Textual das Artes, Jorge Garcia fala sobre o espetáculo:

Jorge Garcia ─ Vou falar inicialmente sobre o processo de criação da coreografia Caput Art.5º para o Corpo de Dança do Amazonas, a convite do diretor Mário Nascimento. A coreografia se deu em duas idas para Manaus, a primeira foi bem rápida, mas o elenco estava muito envolvido com as propostas e conseguimos levantar 70% da coreografia, onde foi dividida em 4 partes: Cabeça, coração, quadril e pés. As 3 primeiras partes foram criadas inicialmente e a última parte mais finalização da música, pelo Dj Marcos Tubarão, figurino pelo Ian e Luz por mim e assessoria do Wallace (Heldon). A palavra Caput é originária do latim e significa “cabeça” ou “parte superior”. O Caput se refere ao texto que acompanha o artigo em sua linha principal, logo após a numeração do mesmo. Por isso, podemos pensar nele realmente como a “cabeça” do artigo, ou seja, como o material-fonte para seus parágrafos, incisos e alíneas. o Artigo 5º da constituição diz “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade […]”. Neste trabalho trazemos luz a este artigo tão importante em nossa Constituição e tão difícil de ser aplicado na prática. Dançamos ritualizando esta sociedade utópica, mas que se constrói e reconstrói diariamente a passos lentos. Já tinha coreografado algumas óperas para o Corpo de Dança do Amazonas, mas a experiência de coreografar para este grupo foi muito especial. O elenco está muito afinado e com muita potência no movimento contemporâneo, além de uma entrega muito importante para que um trabalho tenha êxito.

Pintura de Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://www.opovo.com.br/vidaearte/2023/03/03/pinacoteca-de-sp-recebe-exposicao-do-cearense-chico-da-silva.html>

Reflexões a partir das duas apresentações

Todo corpo que se move no tempo/espaço, dança (andar, correr, deitar, saltar, isto é, toda ação cotidiana é dança. Isso nos remete ao movimento Judson Dance Theater — 1962/64, em Nova Iorque)! Todo corpo que vivencia e experiencia determinado contexto, certamente será impactado e impactará esse ambiente-contexto.

Ouvi de um profissional da comunidade de dança de Manaus que ao assistir as duas companhias dividindo o mesmo palco do Teatro Amazonas no II Encontro de Dança, que ele pôde perceber uma grande diferença entre as duas companhias, em todos os aspectos (técnica dos (as) bailarinos (as) e dos elementos como luz, figurino etc). Para ele, a diferença ocorria pelo fato dos bailarinos do CDA fazerem aulas de balé clássico e ter ensaios todos os dias, assim, afetando na performance dos (as) bailarinos (as).

Eu, ao contrário, vejo essa diferença como algo positivo que nos faz refletir sobre vários aspectos acerca do corpo que dança, da economia de quem dança como profissional, da continuidade do ofício, da necessidade de se pesquisar a dança enquanto linguagem, das questões reflexivas sobre dança/periferia/centro, entre outros. Além disso, poderia ser suscitado até mesmo como uma quebra de paradigma, em se tratando de colocar num contexto “suntuoso”, que é o palco do teatro Amazonas, um grupo periférico da cidade de Manaus, dividindo a cena com uma companhia oficial que, de certa forma, representa um modelo canônico do que seja dança e do que seja um corpo que dança.

Penso que a proposta do Expressão & Vida não se prende a um padrão de movimento em que o corpo deve executar gestos, passos e células coreográficas altamente ensaiados, mas que o foco, pela minha experiência de ter visto no Centro de Convivência, era nos corpos diversos no que tange às experiências de cada performer. Assim, criando-se uma experiência poética política potente de ser explorada coreograficamente e potente para ser vivenciada pelos performers e pelo público. Então, eu diria que os bailarinos da Cia Expressão & Vida são mais bailarinos-performers com uma atitude-performativa de corpos dançantes urbanos periféricos, do que bailarinos no sentido estrito, atrelados a regras e a padrões de ser dançante e de se dançar.

Sou de um período e contexto artístico cultural, e de uma geração, em que as companhias oficiais de dança ditavam qual era a tendência estética dançante e que tipo de corpo poderia dançar essa tendência. Quais eram os corpos que podiam dançar? Quais eram os movimentos, os passos e as células coreográficas considerados como parte da gramática da dança (clássica, moderna e contemporânea)?

Hoje, o corpo cênico latinoamericano, acredito, com uma proposta contracolonial — Nêgo Bispo, Mestre quilombola sempre dizia “adestrar e colonizar são a mesma coisa” — no mover-se, não é mais o mesmo das décadas de 70, 80 e 90, em que as grandes companhias de dança ditavam o que era dança, o que era movimento, o que era passo de dança e qual era o corpo “ideal/izado” para dançar. Em geral, tendo como referencial o padrão corporal eurocêntrico: cor da pele, cabelo, rosto, braços, pernas, bunda (não podiam ser preponderante no balé clássico) e pés (não podiam ser “achatados” e sem “curvas e colos”) .

Hoje os corpos cênicos e performativos são conquistas-plurais. Assim, de certa forma, pouco a pouco há um processo de contracolonização dos corpos performers que transitam nas danças cênicas da América Latina.

Pintura de Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://raiz.art.br/2023/03/06/o-iconico-pintor-espontaneo-chico-da-silva-com-centenas-de-suas-obras-na-pinacoteca-em-sp/>

12 de julho — Centro Cultural Palácio Rio Negro
Palestra Música para a dança: entendimentos sobre recursos técnicos e processos de criação com DJ Marcos Tubarão.
Performance Vivências em Movimento, com Grupo DDTankers
Mesa: Produção em Dança, necessidades e desafios — Um olhar sobre o panorama local, com Edgar Damasco, Everton Almeida e Ana Carolina Souza e mediação de Rosana Baré.

Palestra

DJ Marcos Tubarão

Música para Dança: entendimentos sobre recursos técnicos e processos de criação

Tubarão iniciou a palestra “A dança é mais potente que a música!”.

Em 2007, eu convidei Tubarão para adentrar a cena junto com os performers do espetáculo “A Morta: performance estar morta (P.E.M)”, no Teatro da Instalação como parte da programação da Mostra de Teatro da Federação de Teatro do Amazonas (FETAM)). A música era composta ao vivo durante a performance. Em seguida a parceria artística entre o músico com essa obra performativa continuou: no Teatro Amazonas; na temporada no Teatro Américo Alvares (Manaus 2007). Além disso, Tubarão fez a paisagem sonora para dois espetáculos de minha autoria : Projeto Uma, premiado com o Prêmio Funarte Klauss Vianna de Criação 2007; e Alter Chãu (2009), apresentado no I Festival Amazonas de Dança (I FAD), em 2012. Ademais, convidei Tubarão para fazer a paisagem sonora para a performance Verde Banguelo/Alteração, apresentada para trabalhadores da Petrobras/Manaus, e no meio da floresta em estações de extração de gás da Petrobras.

Para o músico, “A trilha tem que trazer o público para a cena, envolver. A trilha não é somente mecânica, mas dos sons tirados dos objetos, como o radinho que se usava no espetáculo Uma, de Rider, em que os performers usavam um rádio de pilha ao vivo.”; e que “Os sons do ambiente são importantes, são potências.”.

O DJ faz uma pergunta aos presentes: “Como utilizar um som como vibração, que chegue ao público e o traga para cena e que impacte no corpo do performer?”.

Em 2020 Tubarão fez a trilha sonora do espetáculo TA, Sobre Ser Grande, de Mário Nascimento.

Tubarão “A música se movimenta no espaço/palco. Eu gosto de fazer um Mapeamento dos sons utilizados na trilha criada. Amplificar sons, como um prego caindo, sons de água, mas com cuidado para não agredir o ouvido do público.”.

O DJ continua “E gosto de música orgânica: Naná Vasconcelos, Hermeto Pascoal, Tom Zé. A qualidade de som se não for boa prejudica. O som dança com a coreografia. Foi difícil fazer trilha pra espetáculo de dança, pois eu venho da discotecagem.”.

Logo após a palestra, foi apresentada uma dança do Grupo DD Tankers, criado em 2013: cultura Hip-hop, Breaking e Danças Urbanas.

Mesa: Produção em dança, necessidades e desafios — um olhar sobre o panorama local. Com Edgar damasco (proprietário e produtor da ED Produções e Eventos), Ewerton Almeida (Produtor Cultural), Ana Carolina Souza (Artista e Produtora Independente Manauara)

Mediadora Rosana Baré (Produtora Cultural e Fotógrafa)

Rosana lançou uma pergunta aos participantes da mesa e aos presentes: “O que é ser produtor?”

Segundo Edgar Damasco, ele veio das danças urbanas, é produtor enquanto criador de possibilidades. Para ele, o produtor autônomo se depara com dificuldades como, por exemplo, a pandemia.

Ana Carolina menciona que produz perante a precariedade e que a ideia é dada e o produtor irá realizar de qualquer maneira.

Everton Almeida “Eu tinha informações sobre arte através do jornais impressos como Acrítica e Jornal do Comércio. Tive experiência também como bilheteiro na Casa da Luz do Nonato Tavares. Acho que o produtor executivo é uma das pessoas que faz o projeto acontecer.”

A Grande Serpente Atacada Pelo Dragão, de Chico da Silva. Fomte: Disponível em: <https://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra11619/a-grande-serpente-atacada-pelo-dragao>

13 de julho

Palestra Leis de incentivo à cultura, com Ewerton Almeida (Produtor Cultural)

Performance Amarelo Manga, com Lucas Almeida e Vanessa Vianna

Palestra

Almeida “Mecenato é um apelido da Lei Rouanet de incentivo fiscal.”

A Lei 8.313/1991, conhecida como Lei Rouanet, é uma iniciativa federal de incentivo à cultura, por meio da criação do Programa Nacional de Apoio à Cultura — Pronac, de responsabilidade do Ministério da Cultura — MinC.

Almeida realizou o projeto Batukada através da Lei Rouanet, captando R$ 55.000,00 para realização de aulas de instrumentos musicais e um outro de capoeira.

Segundo Almeida, “O proponente do projeto tem que sair atrás dos patrocinadores e apoiadores, após conseguir a devida a provação do seu projeto. A lei é para todos.”.

Fábio moura (artista cênico) lançou a questão: “As empresas não têm muito poder sobre as decisões?”.

Almeida: “É uma lei de mercado, portanto ela tem esse caráter de mercado, e poder de decisão e de escolha. Mas nós temos que adaptar nossos projetos para o perfil desse empresário ou empresa. Ou a pessoa acredita no projeto ou não acredita, para a empresa fazer o investimento.]’.

Lena wild (atriz, cantora e performer): “O que está em jogo é o mercado e o marketing.”.

Almeida: “Quem pode patrocinar os projetos culturais na Lei Rouanet? Pessoa física ou jurídica que pague IR. Pessoa jurídica, tributa no lucro real; pessoa físicas — declaração completa. O Salic web é a plataforma para fazer o cadastro na Rouanet”.

Em novembro de 2023 o Ministério da Cultura (MINC) publicou o edital do Programa Rouanet Norte, com o objetivo de, segundo esse ministério “Incentivar a realização de projetos culturais, com vistas a fomentar atividades que desenvolvam o setor cultural nos sete estados que compõem a Região Norte brasileira: Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.”

Mais detalhes sobre o programa consultar: https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/noticias/minc-divulga-lista-de-propostas-habilitadas-para-programa-rouanet-norte

Performance Apoene-se, com Francis Baiardi

Mesa: Espaços Culturais

Com Paulo Mendes (Casa Hip Hop), Iran Lamego (Casa Teatro Taua — Caá) e Muriel Gonçalves (Balett da Barra)

Mediadora Talita Meneses (Panorando)

O Espaço Cultural Casa Hip Hop AM fica localizado na Rua Deus é Maior, no Distrito Industrial II, em Manaus, que se dedica à projetos sociais, comunitários e artísticos culturais, que envolvem Breaking, Rap, Grafite e DJ, especialmente na formação de crianças e jovens.

Casa Teatro Taua — Caá fica na Rua Santa Eliana, no Bairro de Santa Etelvina, dedicada ao teatro e ao teatro-educação.

Muriel Gonçalves: “O Ballet da Barra nasceu 1995, no teatro dos artistas, pela Marta Marti, Flávio Soares e Eliezer Rabelo.”.

Conforme a página da companhia no Facebook, a proposta do Ballet da Barra é educar por meio da dança os jovens da cidade de Manaus, contribuindo para a formação artística e educacional de vários bailarinos que hoje integram o Corpo de Dança do Amazonas (CDA), o Balé Folclórico e grupos independentes da cidade. O Ballet da Barra oferece ao aluno um leque de opções, colaborando assim para o seu desenvolvimento e auxiliando na formação de seres humanos autocríticos, criativos, preparados para integrar a sociedade em que vivem, atuando como multiplicadores de atividades culturais e posteriormente aptos a suprir o mercado profissional da dança, que se encontra em expansão na cidade de Manaus. Além disso, oferece cursos de dança clássica, coreografia, alongamento e dança moderna.

Segudo Muriel, ela retornou para o da Barra para oferecer de volta o que recebeu de graça por seis anos; e Talita, acrescentou a importância de continuidade das atividades do ballet da barra desde 1995.

Talita: “Quais estratégias que fazemos para continuidade dos espaços culturais?”

Iran, diz que “Começou a pensar em fazer teatro quando viu no Teatro Amazonas o Titio Barbosa.

“(…) falecimento, ocorrido no dia 27 de agosto de 2003, (…) JOÃO BARBOSA, o Titio Barbosa, que, em vida encantou gerações, especialmente o público infantil. Para ele, o teatro infantil sempre foi sua paixão, militando nessa área por 35 anos, encenando em Manaus e em outras cidades mais de 50 peças por ele escritas. A ele se deve o recorde de público no Teatro Amazonas. (…) o Amazonas inteiro conheceu e aplaude, foi um verdadeiro ícone do teatro infantil. Ele, além das peças que escrevia e encenava, também fez telenovelas infantis na década de 70. Além disso, foi radialista e conduzia um programa dedicado à terceira idade, a Discoteca do Vovô, na Rádio Rio Mar, também na década de 70.”. Fonte: Disponível em: <https://legis.senado.leg.br>

Iran “Por que que nas escolas, nos anos 70, não havia teatro e um espaço onde a comunidade não podia estar? Eu sinto a falta da presença do Estado para permanecer os espaços culturais. Taua — Caá significa “Moradia na Floresta”.”.

Talita: “Temos que descentralizar.”.

Paulo Mendes, da Casa Hip Hop, diz para os presentes que construiu esse espaço cultural no meio da violência, no bairro Nossa Vitória; e que, “Casa Hip Hop , espaço cultural, não é somente a dança urbana, mas a sociedade. A crítica era que a Casa era “casa do demônio” pelos religiosos pastores. Nós fizemos a Casa de compensado.”.

Rodrigo Vieira (bailarino do CDA): “Muito emocionado, pois não tive acesso, quando criança, ao que as pessoas dos espaços falaram. Ótimo que os espaços estejam além dos do centro, em outros lugares da cidade.”.

Muriel: “Marta (Marti, uma das criadoras do Balett da Barra) mostra a realidade para os componentes do Ballet da Barra. Minha referência são as mulheres: Marta, Ana Mendes, Francis Baiardi.”.

Lena Wild: “Não fazemos mais teatro como fazíamos antes, de quarta a domingo. Fórum é feito para quê?”.

Paulo: “O II Encontro é muito importante.”.

Talita: “Paulo apontou palavras como acolhimento, apoio da comunidade.”. O espaço Flow foi feito no quintal da minha família.”

O Espaço Flow é conduzido por Fábio Moura e Talita Meneses, da Panorando.

Fabio (Panorando): “Parabéns pelos três *Paulo, Muriel e Iran)por traçar relações e teias com os que estão com vocês. Pois eles fazem parte do contexto do lugar. Pertencem ao lugar.”.

Francis Baiardi (Artista da Dança): “Emocionada com a fala da Muriel sobre o Ballet da Barra. A importância da Marta Marti, que atravessa, atravessou corpos durante todo esse tempo. O da Barra é muito importante.”.

Lucas Rocha (Bailarino de danças urbanas): “Gostaria de destacar os ancestrais das danças urbanas.”.

Amazônia Feérica, 1964, de Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra11622/amazonia-feerica>

14/07/2023

Oficina “O Uso das Ferramentas de Acessibilidade nas Produções em Dança”, com Andrei Dreli e Joyce Belleza.

É importante deixar registrado que nessa palestra poucas pessoas apareceram para prestigiar. Um diagnóstico de como as pessoas em Manaus, seja da comunidade artística ou em geral, não se mobilizam para estar presentes, no modo presencial, nesse tipo de importante acontecimento cultural?

Essa oficina me causou muita curiosidade, pois as questões e as reflexões sobre a acessibilidade e a inclusão de Pessoas com Deficiência (PCDs) na dança e na arte é bem recente não só em Manaus assim como no Brasil. Ademais, raramente conhecemos pessoas artistas com alguma deficiência física atuando e tampouco a vemos em espetáculos, cursos, oficinas, workshops, vivências, residências ou outras formas de encontros cênicos de formação e/ou de fruição; há uma escassez de políticas públicas de inclusão e acessibilidades em prol dessas pessoas. Claro que, com exceção, nos deparamos no cotidiano artístico com alguns artistas com deficiência ou, como denomina Estela Lapponi (performer e videoartista), “corpos intrusos”.

Para Lapponi, corpo intruso é aquele que não é ou que não está convidado a estar ali; é o corpo que desarticula o cotidiano e que pode causar atração e temor; é o corpo “feio” e “frágil”, porém é o corpo que pode ser engraçado, gracioso e ter um certo humor.

Como nós artistas cênicos, as produções artísticas, o mercado das artes, a indústria cultural e as instituições artísticas culturais lidam com a questão desses corpos intrusos, que necessitam de acessibilidade na vidarte?

Andrei Dreli (Intérprete e Produtor de Língua Brasileira de Sinais — LIBRAS): “A tradução da expressão corporal e gestual tem que tá conectada com o sentimento e humor da pessoa que fala. Por exemplo, se a pessoa fala “Bom dia!”, o intérprete tem que expressar fisicamente esse bom dia.”.

Joyce Belleza (Produtora Audiovisual e Assessora de Comunicação): “A audiodescrição tem que ter uma narração fiel ao que está sendo apresentado no vídeo/tela. A inteligência artificial tá comprometendo a profissão de dubladores. O poder de síntese é importante para os deficientes visuais e auditivos

Dreli: “Os espetáculos deveriam ter um intérprete de LIBRAS ; há uma grande exclusão e invisibilidade dessa população que precisa de legenda, LIBRAS, audiodescrição.”.

Palestra Vivenciando as danças urbanas e suas realidades

Palestrante: Miguel Maia (Artista das Danças Urbanas e integrante do Grupo D.D. Tankers)

Maia: “Eu ia passando numa esquina em 1988. E um rapaz perguntou se eu queria aprender a dançar. Achei que ele estava me gozando. Comecei a fazer dança, Hip Hop. Então, meu corpo se modificou. Me inspiro em movimentos da natureza e de animais como a cobra. Aos dois anos de idade tive poliomielite, também conhecida como paralisia infantil. Iniciei a dança em 1988. Trabalho movimentos “Wave” (segundo Maia, são movimentos que reverberam nas mãos, nos cotovelos e no tronco). Tenho 50% de locomoção motora, antes eu tinha 30%. Em 1986 a dança urbana chegou em Manaus. Em 1929, a grande depressão nos EUA, as pessoas foram para a rua dançar para ganhar dinheiro. Daí surgiram as danças urbanas. Em 1973 veio o Hip Hop.”.

De acordo com Richardson de Souza, “Segundo os relatos coletados, não se conhecia em Manaus nos anos 80, a expressão Hip Hop,mas somente um dos seus elementos (Breakdance) que basicamente é formado por quatro expressões artísticas: o BREAK , MC , GRAFITI e o DJ.”.

Já Sidney Barata diz que “O hip hop nasceu no início da década de 1970 nas ruas de cidades norteamericanas, principalmente Nova Iorque e Los Angeles e foi batizado por um dos seus pioneiros, o dj Afrika Bambaataa. Hip hop significa em uma tradução livre, mexer os quadris.”.

Eu particularmente só vi e vivi esse fenômeno das danças urbanas em Nova Iorque, quando cheguei por lá em 1996. Via em todo lugar jovens novaiorquinos pretos e hispânicos dançando: nos trens e nas estações do metrô de NYC; nas ruas e nas praças dessa cidade. Me causou total surpresa de ver esses jovens com suas roupas e seus cabelos visualmente coloridos e inovadores, fora dos padrões que eu via nas ruas do Brasil e de ver suas danças totalmente exuberantes, que eu naquele momento não via com tanta frequência no espaço urbano brasileiro e tampouco essas danças urbanas eram inseridas no contexto das danças cênicas hegemônicas e muito menos no vocabulário das companhias oficiais brasileiras.

Lucas Rocha (dançarino de danças urbanas) problematizou sobre os novos dançarinos de danças urbanas que esquecem os ancestrais, e disse que “As Danças Urbanas é uma cultura, depois entra o hip hop. Tá faltado na cultura hip hop é a união. Essa cultura veio dos pretos e latinos dos EUA. Chegou em Manaus foi em 1983.”.

Segundo Miguel Maia, seu irmão Roberto Maia , “Foi um dos que iniciou as danças urbanas em Manaus.”.

Mesa: Curadoria Para Dança: a mediação cultural como parâmetro de escolhas

Com Fábio Moura (Panorando), Francis Madson (Soufflé de Bodó), Marcos Veniciu (Bailarino e Professor de Dança. Foi bailarino e assistente de direção do Ballet Stagium de São Paulo, por mais de 10 anos)

Mediação Rodrigo Vieira (Bailarino do CDA e Vice-Coordenador do Fórum Permanente de Dança do Amazonas)

Fábio Moura “Eu sinto a falta da presença da comunidade da dança da cidade nesse encontro. Essa falta das pessoas atrapalham a continuidade de políticas públicas para as artes. Então, pensar curadoria é também pensar em desmantelar padrões estéticos. Curadoria é também avaliação, pois passa a ser um produto no olhar de quem estar para ser avaliado. Eu aceito minha obra como produto quando envio para um edital que vai ser avaliado pela curadoria. Como trazer para o vídeo a sensorialidade de uma obra? O curador tem que perceber se a sinopse está sendo vista na cena. Essa é a importância da dramaturgia.”.

Rodrigo Vieira: “A presença da classe… A escuta é necessária. Até aonde o capitalismo influência nas escolhas dos artistas e obras?”

Marco Veniciu: “Me preocupa a falta da presença das pessoas. Um evento tão importante. Não é pertinente essa ausência das pessoas. Ninguém gosta de ser analisado, excluído. Mas a curadoria tem que dar um resultado. E a atitude é importante para o artista. A curadoria de obras ao vivo é diferente de curadoria de obras gravadas. A questão da duração, ao se enviar um trabalho, tem que ser observado o tempo e a questão de edição. Se é 15 minutos, tem que ter 15 minutos. Se não é para se ter edição, não se pode enviar com edição, por exemplo. Um olhar do curador tem que ser apurado. A pessoa envia um trabalho na categoria balé clássico, mas envia um trabalho que não tem nada a ver com esse estilo.”.

Francis Madson: O que é ser um curador? Como se escolhe curadores? Deve ser reflexiva, e representar o que a comunidade quer. Se a pessoa não participa das reuniões, por que ela vai querer ser curador? Essa curadoria representa o Fórum (Fórum Permanente dos Profissionais de Dança do Amazonas), portanto tem que ter o desejo do Fórum, dos artistas e da cidade, uma espécie de dramaturgia. Um ato decisório. A curadoria toma uma decisão e fará escolha. Isso é uma violência, mas faz parte das relações de escolhas. O participante tem que obedecer as regras de um edital, por exemplo. Será que essas escolhas refletem as danças de Manaus e do Estado do Amazonas? Curadores têm amigos, tem gostos pessoais… é complexo, pois irá refletir o que é o Fórum. Pensar curadoria é pensar a cidade. Um processo curatorial tem que pensar no espectador. Pensar público é importante. Escolher curadoria é cobrar a presença das pessoas. Quão danoso é o voto “like” para entrar num festival, no mercado… O marketing virtual não pode tomar conta de uma curadoria e nem a lógica dos algoritmos.”.

A Luta dos Dragões, 1967, de Chico da Silva. Fonte: Disponível em: <https://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra11611/a-luta-dos-dragoes>

15 de julho

Palestra Memória Cultural

Com Adalto Xavier (Jornalista e Autor do livro Dançando Conforme a Música)

É importante deixar registrado que nessa palestra poucas pessoas apareceram para prestigiar. Um diagnóstico de como as pessoas em Manaus, seja da comunidade artística ou em geral, não se mobilizam para estar presentes, no modo presencial, nesse tipo de importante acontecimento cultural?

Xavier (sobre seu livro): “As pessoas dizem que não é um livro com uma escrita acadêmica. Até hoje não se escreveu um livro sobre dança. A intenção era uma escrita histórica e não analítica. Com a memória a gente precisa frisar que em outros estados você encontra mais escritas sobre a cidade.A memória é uma coisa frágil. Hoje é muito mais fácil escolher ser bailarino, pois a família aceita mais.”.

Xavier (sobre as referências): “Quais são as fontes? Tudo é fonte: livros, roupas, edificações, objetos etc, assim como, imateriais: dança, música…Manaus não escreve sobre seus próprios artistas. A memória em Manaus é soterrada. Manaus premia os artistas com o esquecimento, a falta de respeito.”

Xavier (sobre o artista): “Artista como intelectual. Todo artista é um intelectual.”.

Palestra Corpos em Trânsito

Com Lena Wild (Atriz, bailarina, cantora e performer)

Lena Wild: “Palestra significa o lugar de fazer exercício de luta ou ginástica, na Grécia Antiga. (Pergunta ao público) Quem se interessa em anatomia? Quem trabalha com dança tem que entender de anatomia. O corpo humano tem mais de 2000 possibilidade de movimentos. Corpo não é entidade, é realidade. Por que corpo em trânsito? Porque todos nós somos trans. A velocidade dos sistemas como o sanguíneo é muito em trânsito, todo o tempo em transformação, trocando pele, por exemplo. Estamos em transitoriedade. O trânsito é uma realidade. Não podemos ter preconceito contra as pessoas trans, pois todos estamos em trânsito, como em trânsito é expressão interno/externo. Eu sou todo corpo. Deus estar na matéria. Deus está em mim, e não na religião. Nós não nos ocupamos do nosso corpo. Como fazer o que em trânsito? Exercitando o livro. Ler é algo que se decifra signos: ler uma porta, ler uma roupa. Coca cola, é um símbolo do capitalismo, imperialismo. Tudo é corpo. Tudo se ler.”.

Performance com Panorando, As Cores da América Latina (obra cênica premiada com o Prêmio Shell de Teatro)

Performance De um sonho divino ao mundo dos pesadelos — Mahamaya — a deusa da ilusão, com Grupo Caxemira.

Das 14:00 às 20:30h foi dedicado aos: Diálogos sobre a programação do Festival Amazonas de Dança — FAD 2023, proposto pelo Fórum Permanente de Dança do Amazonas

Mediação de Wallace Heldon (Produtor)

Criou-se na comunidade da dança de Manaus uma grande expectativa em torno da realização do FAD. Um dos fatores é por ser o único evento anual voltado para a dança cênica no Estado do Amazonas, que faz parte da programação oficial da SEC-AM — Esta secretaria tem que propor políticas públicas para a dança amazonense de forma a contemplar anualmente a continuidade das ações, das atividades, do fomento e da produção dos grupos, das companhias e dos artistas da dança do Amazonas (da capital e do interior), pois o FAD é somente um mecanismo que seleciona espetáculos através de edital, portanto, não pode ser considerado como política pública para essa linguagem.

Além disso, o FAD serve como uma vitrine, especialmente aos jovens em início de carreira, e aos mais experientes é um modo de apresentar ao público e à comunidade artística local a continuidade de sua trajetória artística e de sua pesquisa cênica; e em se pensando dança/economia, o valor do cachê aos contemplados é significante. Dito isso, cria-se toda uma movimentação em torno do festival, especialmente quem serão os (as) escolhidos (as) pela plenária do Fórum para fazer parte da curadoria e da produção executiva do evento.

Penso que o Fórum Permanente de Dança do Amazonas poderia criar abordagens e metodologias criativas que atraíssem as pessoas da dança, especialmente as em início de carreira, para ações, discussões e reflexões acerca não só desse festival, mas de assuntos que de fato possam afetar a vida e carreira das pessoas-artistas pertencentes ao Fórum.

A criação do Encontro, que aconteceu em 2022, sempre foi pensada em contemplar toda as discussões da programação do evento (mesas, debates e palestras) e não somente as que ficassem ao redor do FAD. Aliás, os diálogos sobre o festival deveriam ser, de certa forma, menos importantes, pois o que é urgente e necessário é se discutir questões que de fato a comunidade da dança amazonense precisa para uma transformação radical no modo de se pensar e olhar sobre a linguagem da dança, não só como hobby e entretenimento, mas como um ofício em que é necessário se refletir acerca da implementação e do desenvolvimento das políticas públicas de cultura para a dança, com propostas sobre: formação e o aperfeiçoamento dos artistas da dança; dança/economia/mercado; aposentadoria para o corpo que dança como profissão; saúde mental dos profissionais da dança; direitos trabalhistas; acidente de trabalho; criação de espaços para artistas da dança desenvolverem suas criações, atividades e ações; corpo/crise ecológica/destruição do meio ambiente e o impacto que isso causa na vida dos artistas; atravessamento violento do capitalismo e do neoliberalismo no cotidiano dos profissionais que dançam; criação de uma Casa do Artista, tendo como modelo o Retiro dos Artista do Rio de Janeiro, entre outras proposições.

Mas, é muito sintomático, e de certa forma um desinteresse ou então as pessoas estão desacostumadas em usar o seus tempos para debater e discutir (afinal, vivemos num mundo do tempo supersônico, ninguém tem tempo para nada), e de se fazer presente para discutir politicamente sobre as propostas de reflexão elencadas acima, que a comunidade da dança local somente apareça quando a pauta é FAD; e o último dia do II Encontro em 2023 não foi diferente: plenária lotada (dançarinos de danças urbanas, folclóricas, populares e cênicas, por exemplo), a maioria composta por pessoas que não participaram das discussões dos dias anteriores do II Encontro ou nunca se fizeram presentes nas raras reuniões programadas pelo Fórum Permanente de Dança do Amazonas, desde 2022 — Com a nova composição de coordenadores do Fórum (eleita no mês de maio de 2024: Bianca Alencar e Rodrigo Vieira), a ideia é modificar completamente a dinâmica de administração e organização do mesmo, com reuniões quinzenais ou mensais com todos os seus membros, assim, criando-se um ambiente coletivo de rodas de conversas e reflexões, em que se pense sobre ações e propostas que causem um impacto positivo na comunidade da dança amazonense.

Porém, mesmo com essa não participação efetiva dos (as) fazedores (as) de dança durante os 4 dias do evento, as discussões no último dia, com foco no FAD, foram acaloradas, especialmente de colegas da categoria que nunca estiveram presentes nas discussões anteriores; as mesmas levantaram questões que em outros momentos de discussões já tinham sido pautas contempladas. Isso é exaustivo para quem se dispõe a participar ativamente dos debates e se faz presente quando há uma convocação do Fórum.

Afinal, (h)escutar também não é uma ação partícipe?

A sugestão é que se crie uma espécie de regimento em que se estabeleça regras, direitos e deveres dos participantes do Fórum Permanente de Dança do Amazonas, dessa forma, acredito que se estabelecerá uma dinâmica mais fluída, pois os presentes terão uma noção ampla sobre as questões e pautas discutidas a priori.

Outra dado importante, que vai de encontro ao dito acima, é que deveria ter direito a voto e a ser candidato (a) a curador (a) ou a produtor (a) executivo (a) do FAD somente as pessoas que participassem das discussões no Fórum de pelo menos 70% — sabemos que imprevistos e compromissos que temos na vida real são fatores que nos impedem de participar ativamente das reuniões do Fórum, mas, 100% de não participação tem que ser questionado nas horas decisivas, como, por exemplo, votar por algo tão vital que é ser curador (a) ou produtor (a) executivo (a) do FAD).

É estranho pessoas que nunca estiveram presentes nas discussões, apareçam no dia de votação para votar ou para se candidatar à curadoria ou à equipe de produção do FAD. Essas figuras, que denomino “Pessoas-Ausências”, têm interesse em colaborar com a dança local ou seu interesse maior é somente o cachê? Como uma pessoa que não tem a menor ideia do que se discutiu e do que se refletiu no Encontro e/ou no Fórum quer ser parte da equipe de curadoria e de produção executiva, se são duas funções fundamentais para a realização de um festival que requer uma dedicação exclusiva?

Por fim, mas num desejo-devir, penso que todas as pessoas envolvidas ou que se envolverão com o Fórum, têm que alimentar essas discussões primordiais para o amadurecimento político, a repolitização do Fórum Permanente de Dança do Amazonas e o estimular de uma consciência crítica, política e de classe das pessoas artistas que frequentam ou frequentarão o Fórum.

Referências

A ilusão do fausto: Manaus — 1890/1920, de Edinea Mascarenhas Dias. Manaus: Valer, 2007.

Dançando conforme a música, de Adalto Xavier. Manaus: Valer, 2002.

Democracy’s Body: Judson Dance Theatre — 1962/1964. Sally Bannes. Duke University Press, 1993.

HIP HOP MANAUS ANOS 80: Uma Cultura de Rua e Popular, de Richardson Adriano de Souza. Fonte: Disponível em: <http://www.snh2015.anpuh.org › anais>

Hip Hop de leste a oeste de Manaus: quatro cabeças de uma Hidra Urbana e um bumerangue africano, de Sidney Barata de Aguiar. Fonte: Disponível em: <http://www.norte2017.historiaoral.org.br/resources/anais/8/1511971896_ARQUIVO_HISTORIAORAL.pdf>

Poéticas do Acesso à cena: a acessibilidade poética, de Lucas de Almeida Pinheiro. Fonte: Disponível em: <https://www.publionline.iar.unicamp.br/index.php/abrace/article/view/4980>

--

--