FOME

Sara Matos
plastic i arte
Published in
Apr 26, 2022

Ecoou um grito oculto nos becos escuros sem saída
era uma boca miúda sem voz, sem história, sem ambições, sem alforria
olhos arregalados, amarelados, fundos
se desmancham em carnificina
carnes moídas de ausência de moradia, do pão,
da falsa salvação da lírica
o reflexo no espelho de cara-a-cara com a besta de si mesmo
nos olhos do desespero, do pânico, do anseio
enterrada nos terreiros do globo inteiro
ressuscita e perambula como uma viúva de véu transparente
sem regressar
louca, erguida, varrida, rendida pelos cabelos encaracolados
partidos inteiros da garganta do meio
a rouquidão se funde ao relento
ditando a perfuração da noite, se esvai, negai
as cordas não se dissipam, se dissepam
deserdam os ouros dos seus paternais
SANGUE
FOME
GANGUE
S
o triunfo dos mortais ameaçados
a maciez da voz não é endereçada.

Arquivo pessoal

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