Fórum Turismo Sustentável no Côa

Paulo Jorge Lourenço
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12 min readOct 2, 2017

Que Futuro? (um breve e resumido olhar)

Realizou-se no Museu do Côa (Vila Nova de Foz Côa), no dia 25 de setembro de 2017 o Encontro Turismo Sustentável, Conhecer e Preservar o Património”, organizado pela Fundação Côa Parque em Parceria com a RIPTUR — Rede dos Institutos Superiores Politécnicos Públicos com cursos de turismo.

Na sessão de abertura, Bruno Navarro, presidente do Conselho Diretivo da Fundação Côa Parque deu as boas vindas aos participantes e fez referência à importância da assinatura do Contrato de Financiamento do projeto “Valorização Turística do Museu e Parque Arqueológico do Vale do Côa, Património da Humanidade” no âmbito do programa Valorizar — linha de apoio à valorização turística do interior, que visa promover a competitividade daquele território enquanto destino turístico, onde o Turismo de Portugal atribui à Fundação Côa Parque o montante de 450 mil euros (fundos comunitários). Segundo Bruno Navarro o turismo poderá ser uma “alavanca desta região deprimida” e termina a sua breve participação exibindo um vídeo do Turismo de Portugal.

Logo de seguida, José Sancho Silva (Coordenadora da Comissão Executiva da RIPTUR) destacou a importância da formação de todos os profissionais de turismo e que estamos numa fase em que é urgente começar a “passar da conceção ao patamar da operacionalização”, e que para obtermos um turismo dito como sustentável será fundamental uma boa gestão, recorrendo sempre que possível a agentes chave, seguindo um plano de ação estratégico. Esta metodologia, “impõe uma mudança epistemológica”, pois obriga à definição prévia dos problemas, identificando posteriormente possíveis soluções e só depois conseguirmos agir em concordância com um plano de ação. Todas as fases deste processo deverão ser encaradas como novos “desafios para a academia”. Os Institutos Superiores Politécnicos Públicos com cursos de turismo poderão e deverão assim ser reconhecidos como parceiros ativos facultando e facilitando a transferência de conhecimento. Referiu ainda que estas instituições de ensino tem três funções fundamentais, o ensino (imposições curriculares, …), a investigação (de carater interdisciplinar e movida por novos desafios) e o serviço prestado à comunidade (a quem o conhecimento deverá ser disponibilizado).

Ainda durante a sessão de abertura, destaca-se a intervenção de Célia Ramos (Secretária de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza), que referenciou um documento que se encontra na fase de auscultação pública até ao final desta semana (Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade) e que serviu de mote para abordar esta temática. Referiu que “a conservação da natureza é um desafio público e social” e que o problema das espécies invasores não deverá ser descurado, devendo até ser olhado segundo um “olhar diferente” e não apenas sob um “olhar divergente”. Deverá ser promovida uma “cultura de partilha e participação em áreas identificadas de alto valor patrimonial, cultural, natural e de elevada biodiversidade” através de “projetos de co-gestão de habitats e espécies” o que permitirá apostar na valorização e no investimento nestas áreas protegidas. Para além disso deverá ser “reforçada a aquisição e divulgação do saber” (existem grandes lacunas neste âmbito, inexistindo mesmo ou o processo simplesmente fica estagnado, sem informação a circular). Segundo ela, encontros como este são muito importantes, em particular este poderá ajudar na definição de um turismo com oferta diversificada, aproveitando sempre que possível os recursos do território e demais recursos existentes, proporcionando aos visitantes uma vivência muito mais completa. Dando a conhecer a realidade social e cultural através da experimentação e contemplação de paisagens, monumentos, costumes, … São estes os trunfos que permitirão diferenciar o nosso turismo em contexto internacional. O caminho será em direção a um “turismo completo, integral que valorize o território de forma sustentada” e para isso será fundamental trabalharmos em conjunto e em prol da conservação ambiental.

Mas afinal o que será isto do “Turismo Sustentável”? E quais os exemplos de Modelos de Gestão Integrada para um Turismo Sustentável que deveremos considerar? Este foi o denominador comum às breves apresentações constantes no Painel 1.

Cláudia Simões da Universidade do Minho, frisou e destacou a importância da replicabilidade-aderência dos bons exemplos. E que um ponto de partida comum, deveria ser mediante a utilização de abordagens participativas envolvendo não só a comunidade interessada mas também os stakeholders chave (estratégicos) e que culminem com um planeamento a longo prazo (10, 20 anos). Tempo ainda para apresentar alguns exemplos de sucesso:

E projetar um pequeno vídeo (International Year 2017 of Sustainable Tourism for Development).

Francisco Silva da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril começou logo por avisar que se considera um pessimista no que concerne ao Turismo Sustentável. Na sua opinião, o paradigma mudou e ainda estamos na contextualização inicial. O “turismo sustentável é uma utopia”. Relativamente ao turismo, inicialmente pensava-se numa “lógica de crescimento”, mais tarde começou a abordar-se numa “lógica de desenvolvimento” e só recentemente se começou a pensar numa “lógica sustentável”. Um erro comum no nosso país está no pensamento a curto prazo, normalmente acompanhado de um investimento descontrolado.

O turismo mais do que sustentável deverá ser considerado responsável. Um turismo responsável é mais credível e quantificável e consegue aportar do mesmo modo o crescimento, o desenvolvimento e a sustentabilidade. Nos últimos anos o turismo de curta duração (short breaks | Turismo Doméstico referido por Santos Silva) tem vindo a proliferar e esse é sem dúvida um exemplo em que raras vezes consegue ser sustentável. No panorama do Turismo Sustentável há imensos fatores que não são ponderados e analisados. Por exemplo, a política de sustentabilidade não quantifica as condições dos profissionais/trabalhadores que efetivamente o operacionam e tornam possível. É urgente e fundamental apostar na formação de base (desde o 1º ciclo ao ensino superior), no sentido de que estas novas gerações estejam mais atentas a toda a dinâmica envolvente. “O turismo deve ser para toda a gente e não apenas para quem tem riqueza” e “deveria ser mais responsável do que sustentável”. O turismo é cada vez mais encarado como um motor para as inovações, mas aliado a isso deverá também ser pensado como forma de criar vantagens para os locais.

A encerrar o primeiro painel esteve Nuno Almeida da Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar (IP Leiria) que começou por destacar a frase “Mas o Mundo muda” remetendo para a necessidade de planeamento e estratégia a longo prazo. Deu mesmo alguns contraexemplos de situações é que isso não foi tido em conta (exemplos: NOKIA e Prova “Paris-Dakar”). O turismo é extremamente importante na economia do nosso país, sendo que o PIB surge diretamente relacionado com o crescimento do turismo e das suas receitas. Indiretamente o turismo faz impulsionar o emprego, não só com os profissionais diretamente relacionados, mas também através das necessidades indiretas que promovem o aparecimento de novos postos de trabalho. Segundo ele, o turismo sustentável, para além de tudo o que tem vindo a ser referido e estamos habituados a relacionar com ele, deverá atenuar a pobreza e promover a paz (mais complicado). Destacou a máxima “Think Global, Act Local” e aproveitou para enumerar vários casos de estudo com grande sucesso (Moçambique, Cabo Verde, Príncipe — Biosfera, …) remetendo para os painéis da parte da tarde. Mesmo assim revelou um pouco sobre um projeto espanhol “Caverna Altamira”, que atualmente só permite o acesso de apenas 5 visitantes por dia à caverna original, visitantes esses que são diariamente sorteados do grupo de visitantes que visita uma réplica.

Aproveitou para destacar e apresentar um projeto em que está envolvido desde a sua génese, trata-se de Peniche Capital da Onda (http://www.cm-peniche.pt/peniche-capital-da-onda) que para além de catapultar a economia local em todas as suas vertentes também se revelou numa importante receita fiscal. Mas, isto do turismo sustentável, será mesmo possível? Sim, mas “temos que ser criativos”. Um ótimo exemplo disso é o Bukubaki Eco Surf Resort (http://www.bukubaki.com/pt-pt/), que promove o campismo de Glamour (Glamping) e que se inspirou numa ideia de um grupo de canadianos, que tem vindo a ser replicada um pouco por todo o mundo e em particular também em Portugal. Vila Nova de Foz Côa está no coração de dois patrimónios mundiais e é urgente responder a duas questões: “O que se faz?” e “O que se poderia fazer?”.

Terminando a sua apresentação com esta frase de John F. Kennedy “… ask not what your country can do for you, ask what you can do for your country.”

Como os trabalhos da manha se atrasaram um pouco, este painel já não teve direito a discussão/debate final, mas sim apenas a algumas breves palavras da professora Maria Fernanda Rollo (Secretária de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior”, que de forma resumida destacou a importância da formação com ligação ao território, que poderá inspirar-se nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) (sobre os quais se comemora neste dia o segundo aniversário — 25/09/2015 e que a Dra. Helena Freitas terá oportunidade de fazer referencia durante a tarde). Vila Nova de Foz Côa nos últimos tempos surge rodeada e apoiada com diversas instituições de ensino superior, apoiada ela Comissão Nacional da Unesco e que está a ser vista (neste encontro em particular) como epicentro para o dialogo global em nome do turismo, do país e da inovação. Divulgou o plano de Riscos e Sustentabilidade que está a ser trabalhado, referindo todos os participantes/intervenientes que estão a desenvolver esforços com os mesmos objetivos, destacando em particular, que esta nova missão da Fundação Côa Parque conseguiu reunir na mesma mesa quatro municípios focados em proteger e dinamizar este Território do Vale do Côa. O conhecimento deverá ser “para a sociedade e com a sociedade”, através de uma “aposta diferenciadora e de partilha de conhecimento de forma aberta (sendo os atores principais a atuar na região a Plataforma de Ciência Aberta e a Universidade do Minho. Terminou a sua intervenção referindo que “é com as pessoas e para as pessoas que o turismo deve ser direcionado”.

Na parte da tarde decorreram ainda dois painéis e foi assinado do contrato de Financiamento do projeto “Valorização Turística do Museu e Parque Arqueológico do Vale do Côa, Património da Humanidade”. A assinatura deste contrato acabou por acontecer no meio dos dois painéis motivado pela agenda do Sr. Ministro da Cultura (Luís Filipe de Castro Mendes).

De seguida serão destacadas apenas algumas das informações/referencias dignas de realce e oriundas das várias intervenções, de curta duração, dos dois painéis da parte da tarde que cada um dos convidados dinamizou.

Em representação da Comissão Nacional da Unesco esteve presente Rita Brasil de Brito, que se posicionou (Unesco) como elo central de ligação e dialogo entre os diversos intervenientes e interessados (stakeholders), através da rede de Património Mundial em Portugal e da rede das reservas da Biosfera, com o objetivo comum de desenvolver um turismo que promove ambiente de forma mais responsável do que propriamente sustentável. E que baseado nas palavras da diretora-geral da UNESCO, “o turismo é uma oportunidade para promover cultura, romper com fronteiras de forma sustentável”.

Olga Matos do Instituto Politécnico de Viana do Castelo, referiu que a sua intervenção, seria mais para colocar à discussão algumas das suas reflexões e opiniões. Efetuou uma contextualização e enumerou alguns dos pontos fulcrais (que são destacados de seguida):

  • Necessidade de desenvolver projetos em torno da valorização dos patrimónios cultural e arqueológico;
  • Patrimonialização por parte dos empresários e decisores tendo sempre em contas as comunidades envolventes;
  • Turismos. Quais os riscos?

— Oferta descontrolada;

— Danos irreversíveis;

— Turismo evasivo;

— Ameaças/contrastes — p.e. “manifestações contra turistas”;

  • Os turistas procuram “ser «locais» nos locais que visitam” — Pelo que deverá ser muito bem planeada a relação com as comunidades (de extrema importância para todos os intervenientes);
  • As experiências adquiridas nos locais são diferenciadoras (absorção do conhecimento), mas cada caso deverá ser estudado de acordo com o seu contexto;
  • Valorizar a vocação artística, que “traduz, enaltece e evidência valores inatos”;
  • Necessidade de promover a consciência da identidade cultural;
  • As equipas deverão ter formação específica, atualizada e transdisciplinar;
  • Deverão ser promovidos estudos públicos e a avaliação da satisfação dos visitantes e dos locais.

Em conclusão o turismo deverá proteger, conservar e valorizar (maior sustentabilidade, exige maior responsabilidade).

Da região autónoma do Príncipe veio José Menezes que iniciou a apresentação com a projeção do vídeo (Eu sou príncipe — HDB) e apresentou o caminho que já foi percorrido e o que ainda falta percorrer para a sustentabilidade.

Referiu que a responsabilidade ambiental tem vindo a dar alguns passos positivos, mas que ainda estão muito longe de se aproximar da responsabilidade social desejada. Deixou-nos dois exemplos que surgiram no âmbito de um “código de conduta ambiental”:

- 50 garrafas de plástico entregues — trocadas por uma garrafa reutilizável;

- Indústria do cacau biológico (diferenciador e muito importante para a economia local).

Depois foi a vez de Manuel Mutimucuio, director de Desenvolvimento Humano do Parque Nacional da Gorongosa (Moçambique) que aproveitou a deixa do convidado anterior, e começou por projetar um vídeo sobre a região da Gorongosa.

De seguida fez uma abordagem e contextualização histórica do Parque da Gorongosa intitulada “Glória — Destruição — Restauração”, referindo o percurso atribulado por que passou, envolvido com ação colonial e guerras civis. E no que diz respeito ao turismo fez algumas críticas e apresentou exemplos:

  • “Não houve equilíbrio entre a procura e o custo que os turistas pagavam” — Exemplo: Mergulho em recifes de coral, que foi massivamente visitado e que acabou por sofrer danos irreversíveis;
  • Neste momento “tudo” é importado e o lixo (causado pela presença dos turistas) fica pelo local;
  • O parque não é vedado, a população vive no seu interior e tem vindo sempre a aumentar (7000 residentes na “zona tampão”).

Apresentou também alguns exemplos de projetos bem sucedidos:

  • Laboratório de Biodiversidade (motivou a descoberta de 100 novas espécies em apenas 4 anos);
  • Investimento no desenvolvimento humano (formação) — proporcionando 4000 postos de trabalho;
  • Educação ambiental;
  • Turismo Social — visitas gratuitas para os habitantes da região (4000 visitas/ano);
  • Bolsas de estudo secundário (analfabetismo feminino);
  • Construção de escolas dentro da região do parque;
  • Clinicas móveis de saúde — promovendo o acesso aos cuidados de saúde;
  • Promoção de técnicas de agricultura de conservação (o parque compra/consome quase a totalidade das dos produtos ai produzidos);

Sofia Castel-Branco da Silveira do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas referiu a importância da rede nacional de áreas protegidas que representa 22% do território nacional. Explicou o regime jurídico e tudo o que levou ao aparecimento do 1º parque. E a partir dai levou a assistência através de uma viagem pelos parques e reservas que o ICNF “tutela”, mostrando dados e representações estatísticas com datas de criação, números de visitantes e suas precedências. Lançou uma questão para a plateia “Como comunicar Biodiversidade?” e respondeu que é uma tarefa realmente difícil, mas que estamos no bom caminho, destacando a plataforma integrada “Natural.pt”, criada em 2014 e com o objetivo de divulgar/promover produtos/serviços (atualmente com 538 produtos/serviços registados). Referiu ainda que “a capacidade de mobilidade não está a ser aproveitada, falta potenciar/utilizar os recursos existentes” (referindo-se, em particular, à rede viária e de transportes públicos de boa qualidade que temos no país).

Por fim destaca-se ainda a intervenção de Carlos Neto de Carvalho, coordenador científico do Geopark Naturtejo, que explicou e contextualizou este parque no panorama nacional e fez algumas sugestões para o Parque Arqueológico do Vale do Côa, nomeadamente o desenvolvimento rotas educativas/culturais que possam passar a integrar o projeto internacional Megalithic Routes (http://www.megalithicroutes.eu/), assim como facilitar e auxiliar a possibilidade da presença dos produtos regionais (projeto “Geoproduto”) em feiras internacionais e de importância comprovada (ITB (http://www.itb-berlin.de/en/) e BIOFACH (https://www.biofach.de/en) na Alemanha; FITUR (http://www.ifema.es/fitur_01/) e FIO em Espanha). Terminou a sua apresentação referindo o flagelo dos incêndios que este ano assolou o Geopark Naturtejo, que afetou 60% da área do parque destruindo 11 anos de trabalho.

Foi um encontro muito rico, que conseguiu, num mesmo dia, reunir pessoas com perspetivas e interesses relativamente ao turismo e em particular ao turismo sustentável e que, poderia ter sido ainda mais estimulante, se tivesse sido possível ativar as sessões de debate. Que acabaram por não ocorrer devido à falta de tempo, motivado pelo elevado número de intervenções (todas elas com muita informação importante para transmitir) e que na sua maioria não conseguiram cingir-se apenas aos 10 minutos definidos.

No global foi uma ótima iniciativa que motivou grande interesse aos promotores turísticos da região e associações regionais, que no final do dia saiam satisfeitos e com diversificadas perspetivas sobre a temática.

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