Mandatos digitais: faz sentido ainda não ter um?

Rodrigo Borges
Plenarium Digital
4 min readJun 14, 2020

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O último estudo lançado pelo guru norte-americano do marketing John Maeda, o CX Report 2020 (março/2020), chama atenção para o que ele nomeia de Customer Experience x Computational Experience (Experiência do Cliente x Experiência Computacional). CX é a Experiência do Cliente transformada em Computacional, em razão de seu impacto no Comércio, na Cultura e na Comunidade. Ele defende que o pensamento computacional é o novo pensamento sistêmico para o mundo dos negócios e que a quarta revolução industrial é formada por uma nuvem, não apenas de computadores, mas das pessoas que os utilizam. E isso a diferencia das 3 revoluções anteriores (industrial, elétrica, computacional), que não tinham a experiência humana como elemento chave.

O autor busca aliar os conceitos de big data com experiências humanas e destaca que, como potenciais consumidores, estamos sempre recebendo mensagens de venda. Iterações de marketing são velozes, diversificadas e ocorrem em grande quantidade. Entretanto, enquanto clientes, após comprar o produto, temos um contato mais lento com a marca: experimentando o produto, aprendendo a usá-lo, reclamando de sua eventual ineficiência… Até o produto é lento para se renovar. Desta forma, a marca sai de um loop acelerado de ganho financeiro no momento da venda para entrar em um loop lento de manutenção do cliente.

Ambos loops de marketing e vendas são utilizados para coletar dados que entregam customizações aos clientes. Há empresas que têm facilidade e dificuldade de lidar com esses dados. Tudo depende de suas capacidades computacionais. Uma alternativa para quem tem dificuldade é o chamado Customer Data Plataform (CDP), uma plataforma que interconecta dados e sistemas. Importante destacar que é mais fácil ter uma CDP quando você começa um negócio com ela em mente. Quando já está no ramo há muito tempo, desenvolvê-la dá uma grande dor de cabeça, pois, provavelmente, diversos sistemas de coleta de dados foram acumulados ao longo do tempo e integrá-los é bastante complicado. Ter uma CDP é uma grande vantagem para uma empresa que deseja atender melhor seus clientes, pois essa plataforma permite uma customização maior.

Mas onde a política entra nisso? Grosso modo, uma candidatura pode ser comparada a uma venda. Deixando claro aqui que não se está sugerindo que um cidadão seja equivalente a um cliente. Apenas que podemos encontrar semelhanças que auxiliem no trato do processo político. Seguimos: o político oferece seus serviços formatados em promessas de mudança e melhoria da sociedade. Faz isso em um período relativamente curto, por uma questão de lei, e precisa ser intenso e focado no compartilhamento de suas mensagens. As mídias digitais potencializam seu alcance de forma cada vez maior e uma boa estratégia de marketing é decisiva para a efetivação da venda: a sua eleição. Até ali, ele dialogou com o público, obteve informações e construiu sua plataforma. Após sua posse, podemos considerar que o loop de satisfação do cidadão (chamemos assim) também desacelera. Um período de 4 a 8 anos se anuncia e aqui a comparação se diferencia de forma essencial: não existe a necessidade de fidelização do cidadão, mas sim o compromisso de contribuição para a sociedade. O atendimento ao cidadão ocorre como forma não apenas de prestação de contas, mas de interação constante, que permite ao político e sua equipe realmente se manterem em sintonia com o seu público ao longo do tempo de mandato.

Iniciativas como essa no mundo da política estão sendo implementadas com intensidade nos Estados Unidos desde o início do século. É impressionante a quantidade de plataformas de gerenciamento de campanha/mandato e base de contatos: NationBuilder, Ecanvasser, Raklet, Wild Apricot, membernova, Tithe.ly, NeonCRM, Hivebrite, PerfectMind, Campaign Deputy, Crowdskout, ActBlue, CampaignSidekick, CiviCRM, PhoneBurner, Trail Blazer, Anedot, Muster, Organizer, OutreachCircle, Aristotle, Democratik… a lista não tem fim. E no Brasil? Lá vamos nós de novo: Votemetrics, NeritPolítica, Elegis, Gestor Político, PróPolítico, Participa+, Saikoo, Gerencia Meu Mandato, AppCívico, Liane, Smartmatic, etc.

A maioria das soluções de software para campanhas políticas inclui funcionalidades como:

  • Processando instantaneamente doações, pagamentos e taxas on-line.
  • Criação de sites com um calendário de eventos e recursos online.
  • Permissão para doadores da campanha se inscreverem em eventos on-line.
  • Melhoria da comunicação com os eleitores por meio de faturas, e-mails e boletins automatizados.
  • Manutenção um banco de dados completo de contatos, fácil de pesquisar, filtrar e atualizar.
  • Relatórios financeiros, análises e resumos de suporte.

Critérios de escolha? Outros tantos:

  • Existem taxas de instalação? Taxas de suporte? Taxas de transação adicionais?
  • O sistema é fácil de aprender?
  • Com que rapidez você precisa do software configurado?
  • De quais recursos especializados você precisará?
  • O sistema é seguro?

Parodiando Maeda, é estratégico a todo político hoje desenvolver seu próprio Citizen Data Platform. Projetos de mandato digital vêm sendo desenvolvidos no país, pelo menos desde 2016. Entre iniciativas governamentais e particulares, plataformas são formatadas para intermediar relacionamentos. E essa pode ser uma das grande viradas para uma política nova: conexão constante e significativa. Entretanto, o engajamento será sempre um desafio. Afinal, política não costuma ser um assunto tão interessante em meio a tanto entretenimento e a elaboração de leis não é a mais ágil das atividades. Técnicas de gestão de mídias sociais, experiência do usuário e storytelling devem aumentar o nível de engajamento. Um time de assessoria bem atualizado e ciente de estratégias de digitais certamente também faz a diferença. É o lado da experiência do cidadão e não apenas a experiência da computação. O lado humano da conexão é o que pode fazer a diferença em meio a tantos números e automações; que podem até ganhar eleições, mas não sustentam sozinhas um mandato que realmente faça diferença para seus cidadãos.

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