Muito prazer, nós somos a …pod…

Mauro Amaral
podcastsdobrasil
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7 min readJun 16, 2020

por Mauro Amaral

Tá, já entendi: você quer criar o seu podcast. E você não está sozinho: só no mês de maio de 2020, 100 mil novos programas foram aprovados pela Apple. E ela nem é mais a líder em acesso a este formato, liderado hoje pela nave-mãe Spotify. E isso tudo em meio a uma pandemia de um vírus que ninguém sabe ao certo quando vai sumir. 100 mil novos olás, boa tarde, meu nome é João ou Maria da Silva e esse é o meu podcast.

O fato é que com tanta força criativa e criadora, acontecem alguns movimentos que, de um lado inibem os estudos da audiência e de outro da própria diversidade em termos criativos.

O primeiro deles é essa mania que já vem impressa em nosso DNA de repetir os erros das gerações passadas. C-T-A-G-Erro das gerações passadas. É o nosso genoma real.

Os mantenedores dos projetos de conteúdos de hoje em sua maioria seguem nos mesmos erros que outros grandes movimentos de conteúdo dos anos '00 e '10: escravos do formato e equipamento, gerando conteúdos mínimos — em quantidade e qualidade — e já em busca de técnicas "infalíveis" de monetização.

Não me entendam mal. Nunca colocamos no ar tanta coisa boa. Mas, no lugar de focar em conteúdo perene e estudar a audiência, escorregamos am alguns atropelos.

Mal uma estética chega à proximidade do mainstream, já começamos a ouvir: "lancei um episódio do meu podcast sobre cultura pop, como buscar anunciantes?"

Mas, ouçam, a oportunidade é outra. É estudar a audiência, suas necessidades. Embora o termo pareça querer dizer que ela quer ouvir. Na verdade, ela quer falar. Mas quer fazer isso através de você. Então, no lugar do microfone de 300 dólares, sua pergunta deve ser outra: a quem preciso dar voz além de mim mesmo?

Uma dica: não deixe ninguém dizer o que é um podcast antes de você ouvir um e tirar as suas próprias conclusões

Em outubro de 2019, Wiliam Bonner deu aquela respirada funda, franziu a testa e anunciou algo como:

"Oi Brasil, isso aqui é podcast. E é muito legal por que você pode ouvir na academia e o assunto é mais profundo do que aquele que você pode ouvir por aqui.".

Aquilo me deu um gatilho tremendo. Porque ele confunde causa com consequência, aparato com dispositivo, discurso com audiência. E faz isso tudo de propósito.

Deixa eu te contar: podcast sequer é um formato ele é meio de distribuição, sabe? É mais ou menos como falar: "Olha isso aqui é uma TV e a única forma que você tem de consumi-la é sentando em sua frente e assistindo novelas. Ou programas de auditório.

Tenho até alguns slides que mostro para os interessados em estudar isso de forma mais aprofundada, que ajuda a clarear algumas ideias:

Ou seja, não faz sentido chamar podcast de formato

Calma, pode ser que faça. É só você querer que isso faça sentido para que o único sentido seja o seu. É o que a gente chama de discurso hegemônico. Daí, tudo faz sentido. Mas um único sentido apontado para uma única direção.

Faz sentido para um determinado tipo de emissor de conteúdo. Aquele que fala por quem tem hegemonia frente a uma série de discursos divergentes. Portanto, crianças, reduzir o entendimento nunca é vacilo. É planejamento.

Mais ou menos quando o Darcy Ribeiro falava algo como:

A crise da edução no Brasil não é falta de projeto. É UM PROJETO

Darcy Ribeiro

Então recapitulando: quando um formato é colocado como única opção ou, enquanto o apresentador de um grande jornal fala "x é y porque a= b+c", ele não ensina matemática.

E, com isso, inibe — além do pensamento crítico e livre — , a diversidade de discursos. Este é um dos primeiros compromissos com a criação da …pod… Queremos pesquisar constantemente e apresentar a diversidade da produção de histórias em áudio no Brasil.

Precisamos entender que as timelines movidas por algoritmos precisam ser revistas como o única forma para obter informação

Por suas características específicas, como a base na oralidade, o estabelecimento de um campo de escuta íntimo e a existência de um “contrato” entre produtores e ouvintes, o podcast parece ter o poder de incrementar o contato direto entre produtores de conteúdo e suas audiências, que demonstrou sinais de afastamento recente com a comprovada influência dos algoritmos na circulação de conteúdo digital.

E é aqui que o podcast ganha vantagem e um ambiente de discussões mais aprofundadas sobre ele faz tanto sentido. Por exemplo, por estimular o contato direto (eu assino o seu feed e recebo sem filtros o seu conteúdo) esse formato explodido recentemente a partir da diminuição da credibilidade do próprio conceito de redes social em si.

Encontramos os ecos iniciais dessa alteração nas primeiras ocorrências envolvendo caso da seção de trend topics do Facebook, na qual jornalistas afirmaram que diminuíam intencionalmente a incidência de notícias de cunho conservador e, claro, no acontecimento fartamente escrutinado pela mídia especializada no qual a consultoria Cambridge Analytica foi um dos vetores principais.

Pois é nessa época que o formato podcast começa a expandir sua audiência nos EUA. E, aqui no Brasil, no qual estava em platô desde 2009 em nichos específicos de audiência, dispara para outros segmentos, com aumento de até 30% segundo dados recentes do Spotify.

Enquanto o mundo das redes sociais e suas timelines discutia as bolhas de opinião, as fakenews e os memes políticos, os produtores de podcast pelo mundo construíam audiências com base na relação direta, em maior independência dos filtros e bolhas e oferecendo conteúdos em diversos formatos e com variados objetivos artísticos e comerciais.

Quais serão os temas que você vai poder acompanhar por aqui? Eles terão alguma relação entre si?

Como o desafio não é pequenos, demos uma fatiada nos temas que pretendemos tratar por aqui.

Juntos, eles vão nos ajudar a seguir não só entendendo o que se produz no Brasil, mas apontando possíveis caminhos e oportunidades para quem está chegando agora e quer seu lugar ao sol. Em um grande resumo e sempre lembrando que é um planejamento inicial, para tirarmos o projeto do chão, serão três os grandes temas:

  • Antialgoritmia: na qual apresento estudos recentes sobre a crise dos algoritmos e possíveis campos de resistência e reconquista de novas formas de compartilhamento de conteúdo científico para o público em geral.
  • Plataformização: como novas e hegemônicas formas de contato com os públicos podem afetar a forma como os podcasts são produzidos e consumidos.
  • Sintonia: mais importante de tudo, como todos esses fluxos de conhecimento chegam ao grande público e de como a realidade de 2020 no Brasil (tão refratária ao pensamento científico), pauta o conteúdo em áudio que se produz? Aqui também vamos comentar alguns podcasts que chamarem a nossa atenção

O espaço está aberto à participação? Como posso ajudar de alguma forma?

A …pod… é toda baseada na participação de co-editores que com a gente vão ajudar a escrever esse interessante capítulo da história da produção de histórias em áudio no Brasil.

A ideia é que a gente receba uma contribuição mensal de cada um dos interessados. Assim, dá tempo de todo mundo pensar, submeter, a gente avaliar se está tudo ok e, também, para abrir espaço para quem quiser colaborar, sem ter que deixar muita gente na fila.

Por enquanto, não imaginei nada muito elaborado para essa seleção. Vamos dizer que você pode fazer isso de duas formas básicas:

  1. Submetendo um artigo já pronto para nossa revisão.
  2. Enviando um e-mail para podcastsdobrasil@gmail.com com algum outro tipo de sugestão.

É isso. Tá inaugurada.

Dê vários aplausos, encontre a gente no Twitter e no Instagram e vamos conversando!

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Mauro Amaral
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