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Informação hipercalórica

Quantas calorias tem o seu celular?

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A epidemia mundial de obesidade como uma metáfora para os nossos hábitos de consumo midiático.

Supermercado

Dê uma volta no supermercado mais próximo da sua casa. Se você morar em uma área mais urbanizada e afluente do país, é muito provável que prateleiras e ilhas inteiras serão dedicadas a alimentos e bebidas¹ muito menos do que essenciais para a nossa sobrevivência.

Definir o mínimo necessário para continuar vivo já é uma tarefa difícil o suficiente. Com aproximadamente 3,7 litros de água² e 1500³ calorias por dia já espera-se que a maioria das pessoas consiga se manter viva com tranquilidade, mas isso é bem menos do que a maioria das pessoas no países desenvolvidos consome.

Por causa da facilidade com que temos acesso a comidas altamente calóricas, ricas em sal e açúcar, repletas de pesticidas, muitos precisam restringir suas dietas habituais de modo a reestabelecer um equilíbrio perdido. Seja colesterol alto, sobrepeso ou pressão elevada, milhões de pessoas morrem anualmente por consequências diretas e indiretas de uma alimentação precária.

É um paradoxo por si próprio que, no mesmo planeta, existam algumas pessoas morrendo de fome e outras sofrendo com obesidade, mas esse é um assunto para outra hora. O interessante é notar que nosso corpo foi treinado para desejar gorduras e açúcares porque estes são justamente os nutrientes mais energéticos. No tempo dos caçadores-coletores, eram extremamente escassos os alimentos ricos em energia, então nosso paladar “nos recompensava” quando os ingerimos.

Hoje em dia, por incontáveis motivos, comidas hipercalóricas são amplamente disponíveis, mas o nosso cérebro continua programado da mesma forma que centenas de milhares de anos atrás. A prateleira do supermercado com os chocolates gera uma reação ancestral em nós, como se tivéssemos acabado de abater um mamute enorme, garantindo nossa sobrevivência pelas próximas muitas semanas.

Corrida Armamentista

Dada a ampla disponibilidade de gorduras e açúcares na dieta contemporânea ocidental, acaba ocorrendo uma corrida armamentista em busca de produtos cada vez mais atraentes para os nossos homens-das-cavernas interiores.

As guloseimas de um ano são suplantadas por outras mais saborosas, mais açucaradas, mais gordurosas. A cada nova reformulação de um produto, um pequeno aumento no teor calórico.

Até comidas feitas em casa são afetadas por esse tipo de mudança no comportamento: bolos, que antigamente eram reservados apenas para ocasiões extremamente especiais, foram banalizados pela facilidade de adquirir os produtos necessários para a sua confecção.

Isso tudo somado a embalagens atraentes, famílias com menos tempo livre, níveis de estresse e ansiedade elevados, barateamento de produtos industrializados e muitos outros fatores têm contribuído para a maior epidemia de obesidade da história.

Dietas, substituição de alimentos, técnicas de mastigação são apenas alguns dos métodos utilizados para tentar balancear a alimentação moderna. Algumas pessoas, mesmo sem problemas metabólicos, acabam precisando de intervenções cirúrgicas para tratar das consequências de uma dieta hipercalórica.

Este problema é perfeitamente aparente ao paciente, mas tem suas origens em mecanismos neurológicos que não estão completamente sob o nosso controle.

Informação

Agora olhe para o seu celular. Ou para o seu computador. Ou para o seu tablet. Ou para a sua TV. Quais são as semelhanças entre uma dieta alimentar hipercalórica e uma dieta de informação hipercalórica.

Nestes casos, as “calorias” se referem a duas coisas diferentes: a quantidade de energia contida em uma porção de alimento e a quantidade de informação contida dentro de uma peça de mídia. Uma dieta de informação hipercalórica seria, portanto, o hábito de interagir em excesso com notícias, posts, fotos, mensagens.

Assim como comer uma barra de chocolate nos fornece uma porção concentrada de gorduras e açúcares, uma discussão política no Facebook nos fornece uma porção concentrada de informação: em um minúsculo espaço são pontos e contrapontos, ideologias e referências, opiniões e ideias, além de alguns eventuais xingamentos.

Cada foto de Instagram tem um valor “calórico” quase desprezível, mas, a cada deslize do dedo, somos bombardeado por uma série de posts que aos poucos vão se tornando um banquete digital. Nossos cérebros acabam ficando mais letárgicos e doentes, acostumados com doses casa vez maiores desse fast-food de conteúdo.

Nossos neandertais interiores, assim como com comida, anseiam por esse tipo de interação. Se sentir parte de uma tribo, um membro participante de um discurso maior que si mesmo, também faz com que bombas de dopamina sejam liberadas por nossos neurônios.

Mas, tal qual a dieta alimentar, uma dieta de informação hipercalórica tem consequências sérias. Depressão, ansiedade e síndrome do pânico são só algumas das doenças recentemente ligadas ao consumo em excesso de mídias sociais¹⁰. Com o adulto mediano usando o celular mais de 2 horas por dia¹¹, fica fácil ver que a epidemia de obesidade também tem se aplicado às nossas cabeças.

A grande diferença entre as duas obesidades é que para a segunda ainda não a enxergamos como um problema. Em sua maioria, as pessoas foram aceitando a exposição constante à Informação como parte da realidade e pouco se fez para entender quais os possíveis impactos disso.

Como não existe ainda uma cirurgia bariátrica para quem ingeriu memes demais, resta apenas o regime. Mas, assim como as pessoas que param de comer doces e passam a estranhar alimentos com açúcar demais, reduzir o consumo de mídia tem o mesmo efeito.

Você não vai conseguir acompanhar cada notícia do mundo e isso é normal. Você não tem obrigação de saber o que seus amigos estão fazendo a cada dia de suas férias. Você não perde muito por ficar sem ler aquele último post da sua timeline (até porque ela não tem um fim).

No prato e no celular, opte pelo light. A maioria das prateleiras não têm muitas verduras.

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