4 variáveis que fazem um país ser violento. Analisando taxas de homicídio em escala global.

Claudiomar Filho
Política com Dados
5 min readFeb 21, 2021

No Brasil a violência é um problema estrutural que afeta toda nossa sociedade gerando pânico, perdas econômicas e reduzindo a qualidade de vida da população. Alguns propõem que o problema da violência no Brasil deve-se a pobreza, falência das instituições públicas, falta de valores, educação, distribuição de renda etc.

Saindo dos achismos, o que será que nos dizem os dados? Em escala global, quais são as características em comum dos países mais violentos? E dos menos? Vamos aos dados.

Para análise dos dados utilizamos gráficos boxplot, regressão simples e, no final, regressão múltipla todos pela linguagem de programação R.

Como se distribue a violência entre as regiões do mundo?

Primeiramente vamos observar como a violência está distribuída entre as regiões do planeta.

Fonte: Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime
 Disponível em: https://dataunodc.un.org/content/data/homicide/homicide-rate
Fonte: Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Disponível aqui

Percebe-se pelo gráfico boxplot que a América Central, Caribe, América do Sul e parte dos países da África possuem taxas muito mais altas em relação ao resto do mundo.

(Ao público mais leigo, a barra preta mais grossa é a mediana, o topo do quadrado o terceiro quartil e o piso do quadrado o primeiro quartil. Para o público ainda mais leigo, entenda que a barra preta seria algo próximo da média, o topo do quadrado os países em melhor situação e o piso do quadrado os países em situação mais crítica frente aqueles da mesma região).

Dado a heterogeneidade dos continentes e regiões e até mesmo a heterogeneidade entre países de mesma região, é importante tentar entender, analisando dados de desigualdade, nível da democracia entre os países, idade média da população, analfabetismo e riqueza quais os índices que são mais determinantes para mensurar como essas variáveis afetam as taxas de homicídios a cada 100.000 habitantes entre os países.

Desigualdade

Para mensuração da desigualdade o índice mais utilizado é o índice de Gini (para mais informações sobre o índice, consulte aqui). Como é possível perceber pelo gráfico (onde cada país é representado por um ponto preto), quanto maior o índice de Gini do país, ou seja, quanto mais desigual, maiores são as taxas de homicídios.

Fonte: Banco Mundial e Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Disponível aqui

Índice de democracia

Anualmente, a revista The Economist realiza uma mensuração de um índice para examinar o estado da democracia em 167 países (caso tenha mais curiosidade sobre o índice, clique aqui )

Inicialmente imaginava-se que países com democracias mais frágeis e governos mais ditatoriais e fascistas, por terem maior controle sobre as fracas instituições dos países e menos preocupações com processos legais, garantias de direitos fundamentais e direitos humanos, pudessem ser menos violentos. Porém, analisando-se o gráfico, percebe-se o contrário. Quanto mais democrático um país, menores suas taxas de homicídios.

Fonte: The Economist e Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Disponível aqui

Idade média da população

Outro dado importante para poder entender a tendência para um país ser mais ou menos violento é a idade média da população. Espera-se que quanto mais jovem a população, mais tendente seja a cometer atos violentos. Analisando os dados percebe-se exatamente isso. Países mais jovens são mais violentos que países menos jovens.

Fonte: CIA The World Factbook e Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Disponível aqui

Riqueza

Um dos mais repetidos clichês é o de que as pessoas entram no mundo do crime devido a pobreza e à falta de oportunidades. Analisando-se os dados do gráfico abaixo, percebe-se que, efetivamente, os países mais ricos são bem seguros, porém grande parte dos países mais pobres são seguros e vários países de renda média-alta são extremamente violentos. O pib per capita encontra-se apresentado em milhares de dólares.

Fonte: FMI e Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Disponível aqui

Taxa de alfabetismo

Por último, taxa de alfabetismo. Esperava-se que quanto menos educado fosse o país, maior fosse a propensão de suas taxas de homicídio. Analisando o gráfico abaixo, percebe-se que não existe uma forte relação entre os dados. Basicamente há países baixas taxas de alfabetismo e com baixas taxas de homicídio e países com altas taxas de alfabetização e bem violentos, de forma que esse dado não foi levado em consideração.

Fonte: Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura e Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Disponível aqui

Correlação entre as variáveis

Analisando-se o quadro de correlações abaixo, percebe-se que existem correlações razoáveis entre as taxas de homicídios dos países e o índice de Gini, a idade média da população e o Pib per Capita e uma correlação não tão forte no índice de democracia.

Produzido no R por meio do pacote corplot

Regressão Final

A regressão final para estimação da taxa de homicídios (em mortes por centenas de milhares da população) de um país seria representada pela equação:

Taxa de Homicídio = 3,48 + 0,10*(Índice de Gini) + 0,3*(Índice de democracia)* -0,14*(Idade média da população) -0,04*(PIB per capita em milhares de dólares)

Analisando os p-valores (para o público mais leigo, qualquer p-valor abaixo de 0,05 é bom e acima de 0,10 é descartável), percebe-se que apenas o intercepto possui um p-valor não relevante:

Retirando o intercepto a equação passaria a ter a seguinte forma:

Taxa de Homicídio = 0,10*(Índice de Gini) + 0,3*(Índice de democracia)* -0,14*(Idade média da população) -0,04*(PIB per capita em milhares de dólares)

Percebe-se que o p-valor da equação total em si é irrisório o que nos leva a crer que o modelo é relevante. Além disso, o R quadrado ajustado de 0,34 nos leva a crer que existem vários outros fatores para explicar um tema tão complexo como a violência, mas, ainda assim, tais variáveis são importantes para isso.

Conclusão

Por óbvio o objetivo deste estudo não é esgotar ou enumerar todas as variáveis que influenciam as taxas de homicídio em nível global, mas sim expor algumas das que influenciam a violência para assim sair do achismo e se basear nos dados

--

--

Claudiomar Filho
Política com Dados

Claudiomar Filho é maranhense, pai, Mestre em Economia pela Universidade de Brasília e atualmente desempenha a função de pesquisador no IPEA