O que os principais candidatos ao Governo gaúcho pensam sobre cultura

Bruno Raupp
Política e Economia
6 min readOct 6, 2018

Uma análise das propostas culturais presentes nos planos de governo dos quatro candidatos a Governador com maior intenção de voto no Rio Grande do Sul.

Da esquerda para direita: Jairo Jorge (PDT), Miguel Rossetto (PT), Eduardo Leite (PSDB) e José Ivo Sartori (MDB). (Arte: Nátalie Matiolo)

Por Bruno Raupp e Deise Freitas

É inegável que o tema cultura acabe relegado ao ser disposto lado a lado a assuntos de irrefutável importância para o Estado, principalmente em um momento de enxugamento de contas e de altos picos de violência urbana. Dessa forma, segurança pública, economia e saúde acabam sendo prioridades nas pautas.

Entretanto, a cultura também deve ser levada a sério pelos candidatos que anseiam o cargo máximo no Estado, e não deve ser deixada ao léu, lutando para sobreviver em um ostracismo político.

O Brasil acabou de viver um nefasto exemplo de descaso com o seu passado cultural e científico ao perder o Museu Nacional para a falta de investimento e, consequentemente, para as chamas de um incêndio fatal. É esperado que esta tragédia tenha servido de lição para todos os governantes e candidatos.

Do empreendedorismo ao tradicionalismo, o tema cultura se desmonta em diferentes tipos de propostas nos planos dos candidatos ao governo do Rio Grande do Sul. Ao analisar cada uma delas, é clara a falta de assentimento sobre o assunto.

Para alguns, a cultura pode gerar lucro ao Estado, para outros, é a garantia do fortalecimento do tradicionalismo. Há, também, quem a veja como um auxílio ao combate à violência.

Por isso, com o intuito de entender melhor as propostas culturais dos quatro principais candidatos a Governador no Rio Grande do Sul, aproximamos a lupa em seus planos de governo e separamos os pontos e medidas fundamentais em relação ao tema.*

José Ivo Sartori, candidato ao Governo pelo MDB. (Foto: Fernando Gomes/Agência RBS)

José Ivo Sartori — MDB

Eleito Governador em 2014, Sartori contou com pelo menos uma grande polêmica relacionada à cultura durante o seu mandato. A extinção da Fundação Piratini, responsável pela gestão da TVE e da Rádio Cultura, como forma de corte de gastos do Estado, foi a principal delas. Fato considerado importante por todos os candidatos neste período eleitoral. Em contrapartida, o governo Sartori ajudou a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa) a conseguir uma nova sede. Decisão extremamente positivae para uma instituição importante para a cultura gaúcha.

Em relação às propostas culturais do seu plano de governo para estas eleições, Sartori procurou abordar inúmeras frentes, como a diversidade, a cultura regional, o cinema, a função educativa e técnica, a tecnologia, o turismo e a circulação de informação.

“A impressão que me dá, é que não há um foco, uma perspectiva explícita de escolha”, afirma o Doutor em História da Cultura e professor do Departamento de História da PUCRS, Marçal de Menezes Paredes. Para ele, o plano é extenso e sem objetivos específicos.

Acesse o Programa de Governo completo — José Ivo Sartori.

Eduardo Leite, candidato ao Governo pelo PSDB. (Foto: Eduardo Beleske/Divulgação)

Eduardo Leite — PSDB

Ao analisar os planos do ex-prefeito de Pelotas para a cultura gaúcha, é possível notar um maior empenho em apresentar propostas mais detalhadas das suas intenções. Ele é o único que cita medidas para outras regiões, distanciando-se, de se certa forma, dos planos mais superficiais.

Entretanto, em relação à Fundação Piratini, Leite acredita que os veículos de expressão pública gaúchos devem ser mais independentes, deslocados da tutela do Estado, criando, assim, uma emissora pública autônoma, em moldes da BBC.

Outro ponto relevante em seu plano é a elaboração de propostas que dialoguem com o empreendedorismo no Estado. “Ele vai incentivar um processo de inovação vinculado à iniciativa privada, eventos, clubes, ONGs, Organizações não Governamentais e entidades privadas, para que elas criem as pautas.”, aponta o professor de História da PUCRS.

Além disso, o psdbista dá uma enfoque ao esporte dentro da cultura e ainda fala sobre a justiça social, principalmente sobre a pluralidade cultural e a necessidade de lutar contra a segregação por motivações raciais, de gênero, de classes sociais e faixa etária.

Este ponto é importante, pois a cultura é uma parte essencial na luta contra o preconceito enraizado e cada vez mais evidentes na população brasileira.

Por mais que o plano contenha mais detalhes, ele ainda beira a superficialidade dos demais, não apresentando ações enfáticas e aplicáveis ao tema.

Acesse o Programa de Governo completo — Eduardo Leite.

Jairo Jorge, candidato ao Governo pelo PDT (Foto: Diogo Sallaberry/Agência RBS)

Jairo Jorge — PDT

Jairo Jorge apresenta um projeto simples e acanhado, resumindo suas propostas em um único parágrafo. Em comparação com o plano de seus adversários, o candidato não estrutura projetos e objetivos, contando com um apanhado de propostas em uma cultura elitista e tradicionalista.

Jorge fala em incentivar as onze expressões da arte: música, dança, pintura, escultura, teatro, literatura, cinema, fotografia, história em quadrinhos, jogos multimídia e arte digital, além de mencionar a valorização da tradição gaúcha.

Questionado sobre a extinção da Fundação Piratini, executada no atual governo como medida para corte de gastos, o candidato se posicionou contrário. Ele configura a ação como “um corte profundo na Inteligência do Estado”, prometendo revogar a extinção de todas as Fundações.

Sobre o papel do Estado no incentivo à produção artística, o pedetista segue o discurso do seu plano de governo, reafirmando o seu comprometimento em promover a alta cultura, com a presença gaúcha em produções nacionais e internacionais. Ele também propõe melhorias na manutenção de espaços culturais, como museus e bibliotecas.

Na fala, o candidato se mostra mais aberto e amplo na questão de diversidade cultural no território gaúcho — deixadas de fora em seu plano de governo.

Jairo Jorge promete, como Governador, uma política avançada de igualdade racial, liberdade religiosa e enfrentamento à LGBTfobia, reconhecendo a diversidade cultural do Estado, onde existem diferentes expressões culturais de povos tradicionais, como os quilombolas, indígenas e povos de terreiro.

Acesse o Programa de Governo completo — Jairo Jorge.

Miguel Rossetto, candidato ao Governo pelo PT (Foto: Marcelo Casagrande/Agência RBS)

Miguel Rossetto — PT

No plano de governo de Miguel Rossetto a cultura também é um tema acanhado e pouco explorado, resumido em valorização das culturas populares e da cultura negra. Mesmo sendo positivo em relação ao reconhecimento de questões sociais e raciais, o petista acaba por resumir o movimento em capoeira, hip-hop e carnaval de rua.

Paredes avalia o projeto como “uma leitura bastante empobrecedora das manifestações criativas da humanidade”, sendo uma forma estereotipada das expressões culturais negras e ainda se mostra surpreendido, avaliando a posição de um partido de esquerda, porque no mesmo parágrafo da proposta, o candidato engloba a questão da violência.

“Implicitamente parece que está dizendo que se deve valorizar a cultura negra porque se não fizermos isso, existe a violência”, conclui o professor.

Sobre a extinção da Fundação Piratini, Rossetto, assim como Jairo Jorge, defende a recuperação da Fundação, bem como o resgate das suas atividades e funções.

Sobre o papel do Estado na cultura, o candidato pretende ampliar a construção democrática de uma agenda que valorize as atividades da cultura do Estado.

Para isso, o petista propõe uma construção coletiva mais ampla de todas as vozes do Rio Grande do Sul, utilizando mecanismos como o Sistema Pró-Cultura, Lei de Incentivo à Cultura e o Fundo de Apoio à Cultura.

Acesse o Programa de Governo completo — Miguel Rossetto.

Após esquadrinhar o tema cultura nos planos de governo dos principais candidatos, é notória a falta de empenho e dedicação a apresentar medidas que deixem da superficialidade.

Planos inconsistentes, rasos e empobrecidos compactuam com a displicência já conhecida dos governantes brasileiros em relação a temas culturais.

Independente do resultado destas eleições, as chances de um incentivo maior à área são pouco prováveis, o que, infelizmente, já vem acontecendo há bastante tempo.

* As entrevistas dos candidatos ao coletivo de jornalismo cultural, Nonada — Jornalismo Travessia, serviram de base para a construção da matéria.

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