Por trás do Filtro

Osmar Martins
Política e Economia
4 min readNov 20, 2018

Taís Seibt, pesquisadora e fundadora do Filtro, laboratório de checagem de fatos sediado em Porto Alegre, fala sobre a experiência da cobertura das eleições 2018 e o futuro do projeto

Sabe aquele belo discurso dos candidatos em época de eleição, em que saem defendendo dados, estatísticas e resultados de seus feitos na tentativa de ganhar votos e ficamos questionando o que é verdade e o que não é? Então, é isso que o Filtro fez. Checou os discursos públicos dos principais políticos gaúchos envolvidos nesta eleição.

O Filtro é um projeto de checagem de fatos sediado em Porto Alegre, desenvolvido pela ONG Pensamento com o trabalho de três jornalistas, Taís Seibt, Tiago Lobo e Naira Hofmeister. A iniciativa nasceu em 2018 com o objetivo, pelo menos inicial, de verificar os discursos dos candidatos gaúchos pelas mais diversas vias, seguindo o código de princípios da International Fact-checking Network, em busca de trazer a verdade, esclarecer dados nos seus devidos contextos e desbancar boatos.

Realização da entrevista com a pesquisadora Taís Seibt em aula aberta na FABICO. Foto: Roberto Belmonte

Taís Seibt, jornalista com mais de dez anos de experiência trabalhando para veículos como Zero Hora, BBC Brasil, O Estado de S. Paulo e Agência Pública, atualmente estuda o exercício do fact-checking no País em pesquisa de doutorado na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), estudo no qual a levou a fundar o Filtro para que servisse de laboratório prático, como ela explica.

A prática na comunicação, muitas vezes, na pesquisa do ambiente acadêmico, acaba ficando de fora e é uma das críticas, inclusive, do mercado. Então eu como tinha esse tino de jornalista de mercado, de repórter, sempre tive essa preocupação, que tivesse um efeito prático. Enquanto desenvolvia a pesquisa pensei em estender isso para a prática, aí que veio a ideia do laboratório, o que se tu for ver não é tão comum, pois em biologia, física, ciências mais ‘’duras’, eles sempre testam o que estão estudando ou criando, e na nossa área a gente não testa, então eu queria fazer isso, queria fazer um teste, um laboratório, e o Filtro foi exatamente isso.” — Taís Seibt

O teste não só foi executado como deu bons resultados. Principalmente no que diz respeito ao impacto no debate público. As checagens publicadas pelo Filtro resultaram em correções, contextualizações e até mesmo mudança na apresentação de determinados dados no discurso e debate dos candidatos.

Um dos fatores que colaboraram para isso é o fato de que os jornalistas do projeto entravam em contato com a assessoria dos candidatos, como determina sua metodologia de checagem, para informar de que havia alguma inconsistência nos dados apresentados e fazendo assim com que ficassem cientes de que seria publicado um material checado com a verdade sobre o assunto, ficando a critério dos mesmos realizar ou não alguma ação de esclarecimento ou correção.

“A principal lição das eleições é que é possível gerar impacto com jornalismo.” — Taís Seibt

Já para o público comum, Seibt afirma não ter tido tanto impacto, pelo menos nas métricas digitais, já que o material não foi tão compartilhado ou curtido nas redes sociais, apesar de também ter sido distribuído em rádios e veículos impressos de grande público, como o Jornal do Comércio. São diversos os motivos que podem ser analisados como causa disso, dentre eles a pesquisadora citou tendência de que o público que consome notícias falsas provavelmente não seria mesmo que busca agências de checagem ou veículos de jornalismo para verificar a verdade, pois não tem a instrução adequada quanto ao consumo de informações, além da descredibilização da mídia e a possível inibição do público perante a mesma.

O Filtro foi um laboratório. Em laboratórios aplicam-se fórmulas, modelos e estruturas para a execução de determinadas experiências. Com os testes realizados e com a confirmação de resultados positivos, o método é comprovado e pode vir a ser replicado em outros objetos. Essa é a ideia de Seibt quanto ao futuro do projeto, apesar de reforçar que a ONG não tem financiamento público, por isso não pode investir na iniciativa.

“A ideia é manter. Ele foi um laboratório, então o protótipo funcionou e poderia ser replicado em outra estrutura, por exemplo.” — Taís Seibt

Enquanto parte da sociedade não estiver realmente disposta a saber a verdade e passar a compreender a importância do jornalismo e que existem custos para a produção do mesmo, para que possam vir a pagar pelo serviço com mais frequência, iniciativas como essa ainda podem demorar a aparecer e tomar força, como é o caso atual de Porto Alegre, metrópole com mais de 1 milhão e meio de habitantes e nenhuma agência de checagem.

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