Poder, Bolsonaro, privatizações, previdência, economia e armamento por Mônica Leal

Osmar Martins
Política e Economia
13 min readNov 28, 2018

Vereadora e vice-presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre fala sobre temas amplamente debatidos no país e na cidade

Entrevista realizada no gabinete da Vereadora Mônica Leal na Câmara Municipal de Porto Alegre. Foto: Fabio Paranhos/CMPA

Osmar Martins

Mônica Leal, 62 anos, natural da capital gaúcha, formada em jornalismo e pós-graduada em Ciências Políticas, filha orgulhosa do ex-deputado estadual e Coronel do Exécito já falecido Pedro Américo Leal, hoje é vereadora e vice-presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre. Em nosso encontro, realizado no dia 26 de novembro de 2018, conversamos sobre diversos temas de interesse público, como a eleição de Bolsonaro, privatizações, armamento, relações de poder e mais.

Progressista e conservadora declarada, Mônica candidatou-se para deputada estadual do RS na última eleição, mas não foi eleita. A vereadora vive no universo da política desde que nasceu, já que seu pai foi deputado estadual por quatro vezes, entre outros cargos públicos ocupados, mas foi só em 1992 que ela ingressou de fato na política, coordenando a campanha de Pedro Américo Leal para vereador de Porto Alegre, cargo que hoje ela ocupa.

Após doze anos trabalhando no gabinete de seu pai nas mais diversas ocupações, em 2004, depois da passagem de bastão pública de pai para filha, Mônica candidatou-se à vereadora. Apesar das dificuldades da campanha e de inicialmente ter entrado na suplência, ela conseguiu entrar na Câmara Municipal de Porto Alegre e iniciar a sua trajetória.

Hoje, com vasta experiência na gestão pública, Mônica divide conosco sua opinião sobre assuntos amplamente debatidos no País e na cidade.

Logo no início da conversa, antes mesmo das perguntas, Mônica contou um pouco da experiência que levou de uma agenda de eventos realizada em Brasília, que com um encontro entre a vereadora e o futuro vice-presidente da república, General Mourão.

O que me impressiona nessa questão do poder, é que quando é candidato, geralmente é humilde, solicito, e quando se elege, eles se blindam, aquela mesma pessoa que beija, que precisa do povo, que necessita daquele contato, ele toma uma blindagem de tal forma que se afasta, se protege daquelas pessoas que ali atrás, num tempo não tão distante, ele buscava, ele abraçava. Então eu tive em Brasília agora e o que me impressionou muito foi a figura do General Mourão, a humildade dele, aquele homem que hoje é o nosso futuro vice-presidente do Brasil é a mesma pessoa, solicita, educada, é impressionante a humildade dele, dessa formação militar, só posso dizer que é essa noção do cuidado com o outro que eles têm, não fazer ao outro aquilo que gostaria que não fizesse para si. Isso me deu uma esperança muito grande, pois era uma coisa que me incomodava. Isso não é comum. Me tocou profundamente.

P: E aqui na Câmara, você percebe isso?

Aqui não existe muito isso, pois temos uma relação de colegas, mas quando tu vai para órgãos maiores como a assembleia, a câmara dos deputados, o senado e a presidência da república, é muito normal tu ver essa distância.Nós temos que ter uma consciência muito grande com o cidadão. Eu levo isso muito a sério.

P: Engatando a primeira pergunta nisso, nessa relação com o eleitor, a partir dessa reflexão que tu teve, como tu avalia tua campanha nessa eleição, se talvez mudaria em algo para uma próxima candidatura, com uma relação mais próxima do eleitor?

Eu sofro do mal da lealdade. Eu tive uma rija criação com a disciplina, no cumprimento da palavra lealdade. O que aconteceu, o meu eleitor é Bolsonaro, eu desde o início estava fechando para esse apoio, só que ainda não se sabia quem seria o candidato a vice. Inclusive, fui ao RJ e almocei com o General Mourão antes dele ser indicado para vice e brinquei com ele, “você seria o vice dos meus sonhos, seria muito bom fazer essa campanha para Bolsonaro com o senhor dentro”. Aí eu vim para Porto Alegre, sem nada decidido, e no outro dia a Ana Amélia anunciou que seria vice do Alckmin, que fechou com o PSDB, logo mais a noite foi anunciado o Mourão como vice do Bolsonaro, pra mim foi terrível isso, pois o meu vínculo era muito forte com o General Mourão, pelo exército, pelas forças armadas, eu sou filha orgulhosa de um Coronel da infantaria, entao eu fiquei numa situação muito delicada, pois ao mesmo tempo a fidelidade partidária exige que tu não frequente palanque daquele que teu partido não está coligado. Então nós tinhamos uma progressista como candidata a vice do Alckmin, foi um terror pra mim. Eu votei no Bolsonaro e no Mourão, mas não pude fazer campanha. Só no segundo turno, né. Então isso me prejudicou muito na minha campanha para deputada estadual, pois houve esse feito na campanha, quem era Bolsonaro, se elegeu. Foi um arrasa quarteirão. E isso faz parte, a política é uma caixinha de surpresa, é feita de vitórias e derrotas e a gente tem que aprender com isso. E uma outra questão que eu fiz uma análise é que eu sou uma pessoa movida por convicções. Eu não sigo a manada. Eu tenho minhas convicções, brigo e debato com elas, mas eu participo de debates na tribuna, eu não agrido os outros. E esta campanha teve um norte que foi o ódio. Tu tem um partido eu tenho que respeitar isso, eu posso debater contigo e defender arduosamente as minhas convicções, mas a sigla, a ideologia partidária tem que ser respeitada. As pessoas tem que se entender, elas tem que dialogar, é aí a democracia. A democracia é isso. Eu penso que houve o efeito Bolsonaro, que me prejudicou muito, que embora eu e toda minha família tenhamos votado nele, eu não fui para o palanque dele, eu fiquei amarrada na situação no primeiro turno, porque a senadora Ana Mélia era candidata a vice. E o outro efeito foi esse ódio, o meu perfil não é o da agressão e eu jamais faria diferente. Posso até me exaltar na tribuna em um debate, respeitosamente, mas ofender uma pessoa de forma que a sua imagem seja destruída, de forma alguma. As pessoas tem seus motivos para acreditarem. Então eu não mudaria nada nesse sentido. Tentei algumas vezes que meu partido entendesse a importância da gente ir com o Bolsonaro no primeiro turno, mas não consegui, fui vencida. Fui até pega de surpresa com essa questão da senadora ser candidata a vice.

P: Como tu enxerga as consequências da eleição de Bolsonaro no ponto de vista social e econômico, e qual a tua expectativa?

Olha, eu penso que o Bolsonaro é uma pessoa muito expontânea. Ele tem esse perfil, que é meio da caserna de militar, falam espontâneos, sem o politicamente correto. As pessoas falam tanto no politicamente correto que chega a ser um diálogo desinteressante as vezes. Eu admiro essa forma espontânea e objetiva dele. Agora, eu não tenho medo, vou te dizer assim, as pessoas estavam apavoradas com o Trump nos EUA, né?! Vou te dizer, eu estive nos EUA e a economia está andando. O povo americano tá feliz com o que está acontecendo em termos de emprego e cuidado com a econômia. Eu acredito que no Brasil, aquilo que ele não sabe ele vai se assesorar muito bem, como está fazendo. Todos os ministros que ele indicou até agora são pessoas que tem uma carreira, um conhecimento, uma mente brilhante e respeitada. Então eu me sinto segura. E do lado dele tem outra mente brilhante que é o General Mourão, te confesso com toda tranquilidade, eu não tenho receio nenhum. Eu estaria se o outro candidato tivesse ganho.

P: Como lidar com a polarização política atual do país e como funciona essa questão de representar lados?

Bom, a minha vida se divide em vários trechos, né. Eu já fui filha de político por muito tempo. Meu pai teve diversos cargos e eu vivi na pele o que é ser filha de político, isso não é uma coisa fácil. Sei bem o que a família passa. Por outro lado, eu sou vereadora mas sou vice-presidente da Câmara e serei presidente, entao eu tenho duas maneiras atuar, de forma institucional, presidindo a Câmara, e respondendo por 36 vereadores. Mas eu também tenho a minha vida, aquilo que eu acredito, que eu trabalho, entao tenho que administrar isso muito bem, com muito equilíbrio. Agora sobre a questão da polarização, eu aceito qualquer critica, desde que ela seja respeitosa. Crítica com agressão, não contem comigo. Tanto que quando fui representar a ex-governadora Yeda em uma aula na UFRGS, onde a maioria se identifica com a esquerda, eu nunca me esqueço, quando me apresentaram começou uma vaia muito grande. Então expliquei para as pessoas, que embora nós pensássemos politicamente diferente, havia algo que tinha que ser comum que era a educação, e que eu não iria falar enquanto não cessasse. Houve o silêncio, eu falei. Então esses princípios tem que estar muito claros para qualquer um. Então eu sou progressista, de direita, conservadora, mas eu sou uma pessoa que respeito as opiniões divergentes, e com bom argumento tu até me convence, eu posso não estar correta da minha ideia e se me vier um bom argumento eu mudo de ideia, só não muda de ideia quem não pensa. Então agora essa questão da agressão não faz parte da minha vida. Sem segurança nada prospera, sem disciplina não existe progresso. Quando as pessoas tiverem essa consciência não vai haver tanto confronto. As pessoas brigam para que tu aceite as diferenças, mas elas não aceitam que tu pense diferente. Temos que buscar os valores sólidos que vão nos levar a formar as crianças responsáveis.

No meio da entrevista, o câmera man interviu com uma pergunta, fazendo com que se iniciasse um breve diálogo entre todos, fugindo das perguntas, mas que resultou em uma das melhores aspas da vereadora, falando sobre as funções fundamentais de um Estado.

“Saúde, educação e segurança, na minha opinião, são áreas que não tem que ter politicagem, tem que haver um projeto nacional de futuro, independente de siglas e ideologias partidárias.”

P: Qual a sua opinião sobre privatizações e específico a da Petrobras?

Foi um horror o que aconteceu na Petrobras. Um partido que simplesmente se adonou e fatiou com outros partidos, pois não dá pra dizer que são vários. É com muita tristeza que a gente vê isso. Mas nós chegamos num ponto, na minha opinião, na questão do Estado, que o governo tem que te oferecer o básico e o necessário, e o oferecer bem. Saúde, segurança, educação e infraestrutura. Não tem mais dinheiro pro resto. Eu sou contra privatizar o Banrisul, isso eu sou contra, pois pelo que entendi, não é minha área, não sou economista, sou jornalista como vocês, pós-graduada em ciência política e o Banrisul ele não tá deficitário, então não vejo porquê. Mas nós chegamos num ponto que imagina, pagar um salário de um agente da segurança pública parcelado. E esse agente fazer a segurança do cidadão, e ter a sua família morando perto da bandidagem onde tem o toque de recolher. Então um brigadiano ele não pode usar a farda, se não ele morre. Eu venho de uma época onde tu tem orgulho da farda. Onde tu olhava um soldado da brigada militar e ficava em êxstase. Hoje te pedem para não usar a farda pois se não tu vira um alvo fácil. E isso é muito triste. Em um primeiro momento precisamos fazer uma economia de guerra, em uma casa isso significa tirar todo o supérfulo, ficar só o necessário. E tocar né, arrumar as contas, tornar o Estado saudável para que as pessoas tenham saúde, educação e segurança.

P: De modo geral, então acha que deve-se enxugar estatais?

Sim, o governo ele não tem essa condição de manter estatais hoje. Infelizmente nós chegamos num ponto que sangrou tanto, o descaso com o dinheiro públlico foi tão enorme que as coisas agora estão no fundo do poço. Estamos vendo agora situações de funcionários públicos, professores também, nada remunerados, além de sofrer na sala de aula, isso é o fim do mundo, um professor apanhar de um aluno ou da mãe de um, isso não pode acontecer. As coisas chegaram em um ponto que sem disciplina nada prospera.

P: Na sua opinião, o que seria o ideal em relação a previdência no Brasil?

Essa não é a minha área, né, mas te confesso do jeito que tá a coisa ta muito complicada, pois se não fizer um movimento, daqui a pouco lá na frente não terá mais nada. Não tem como segurar. Então tudo aquilo que se faz na prevenção é saudável, pelo que eu acompanho na imprensa, eu acho que é fundamental ter um projeto de previdência em que as pessoas saibam exatamente o seu tempo de trabalho, o que vão poder contar. Pois uma coisa que me preocupa muito é a questão da idade, se tu trabalhou a vida inteira e é descontado, tu tem que saber com o que tu vai poder contar la na frente. O mesmo em relação aos planos de saúde, tu paga, paga, só que vai ligar para um médico, na Unimed, como é meu caso, e a secretária diz que é daqui três meses ou quatro meses. Só que só um pouquinho, então para que estou pagando?! Temos que repensar no Brasil sobre a velhice, em tudo, sobre a questão da previdência, da saúde, da segurança, da infraestrutura. Precisamos ter um incentivo de trabalho para pessoas de idade, nao pelo que vao ganhar, mas por ocupar a cabeça.

P: Como lidar de forma mais equilibrada com a crise sem parcelar salários de servidores?

Eu acho um crime parcelar salários. Tu não pode pagar nada, tu não pode fazer nada, mas tem que pagar o salário. Como é que esse cara vai viver? Como é que ele vai comer? Pagar suas contas? Como ele vai subsistir? Ele precisa comer, comprar remédio. Como vai pagar a conta de luz? Vai pagar o arroz e feijão parcelado? Isso é um crime, isso não existe. Não sei de onde tiraram da cartola que isso é normal. E eu me impressiono com a imprensa, com a normalidade “ah, vão parcelar mais uma vez” não pode! Não pode! Vende prédio público, fica sem carro e anda de bicicleta, eu não sei o que vão fazer mas não pode parcelar salário de servidor, isso, na minha opinião é um crime.

P: O que acha que poderia ser feito para alavancar a economia da cidade, atrair mais investimento privado, sanando o problema de tantas lojas físicas fechadas, em contraponto com a Orla que está funcionando tão bem?

Como vai ter economia girando com o funcionário recebendo salário parcelado? Porto Alegre é a cidade, eu acho, com maior número de funcionários públicos. Essas pessoas não ganham, nem o décimo terceiro delas. Se o trabalhador ganha, ele gasta, a loja vende, a roda da economia funciona, começa por aí. Segurança, como é que tu vai manter lojas funcionando se tu não tem segurança? O cara entra com uma arma e te assalta. As leis trabalhistas até então é um caos. O empreendedor aqui é um herói. Pra ele montar um negócio é assim. Eu vi, eu estudei uma vez, uma pessoa dizendo pra outra “não, agora já tenho três meses, logo ali na frente já vou ver como que faço, pois entrei pra atender no balcão e já estão me pedindo para pagar conta no banco” o que é isso?! A fiscalização, a lei ambiental, a morosidade, a burocracia, então não tem como. Eu já fui empreendedora, eu tive, por 15 anos, antes de me formar em jornalismo, a maior pronta-entrega do Rio Grande do Sul, eu tinha sacoleiras que vendiam pra lojas do interior, como não existia moda aqui, fazia também Rio e São Paulo. Sou casada com um judeu russo, então ele tem meio esse sangue de comércio e eu gostava disso. Eu ganhei muito dinheiro no comércio, mas teve uma hora que vi que era um risco, o país atravanca, atrapalha a vida do empresário. Eu empregava e tenho pena do empresário. Pra mim ele tinha que ter um troféu de herói. Agora tu imagina lá no litoral, os caras investem pra vender por três meses, nem três, dois meses, aí chove e já tem o problema do clima, que aqui temos esse problema, né? Aí tem uma burocracia pra ti abrir algo, uma fiscalização que parece que vão com toda sede em cima do coitado do cara. Agora aqui no centro da cidade, na rua da praia tá cheio de vendedor ambulante. Então assim tá errado. Isso tudo devia ser revisto de uma forma que tu investisse, envolvesse o empreendedor a ganhar dinheiro. Parece que é feio ganhar dinheiro nesse País. Tu anda em um bairro e é aluga-se, vende-se, daqui a pouco da-se o ponto. Quem é que vai colocar? Tu coloca e te roubam tudo que tu tem e na tua frente tem um vendedor ambulante. O preço, o tributo, impostos nesse país não tem como, é o pior país para investir. E agora o prefeito quer aumentar o IPTU…

P: Alguma proposta quanto a segurança local de Porto Alegre?

Efetivo nas ruas! Segurança se faz com efetivo nas ruas, com investimento nessa área, com tecnologia, com aparelhamento, com equipamento, em valorização do policial, que passa por salários, passa pela conscientização da sociedade de ver esse policial civil e militar como um ícone. E nós temos que fazer um mutirão e trabalhar em cima disso. Foi necessário que a iniciativa privada, o Instituto Floresta, entrasse, para que se renovasse as frotas, imagina que tinha viaturas ali que estavam em situação precária, perto da bandidagem, super desatualizadas. Demora um ano para preparar um brigadiano, isso tudo tem que ter trabalho, demora pra fazer, então tem que pensar la na frente e tem que haver toda uma reestruturação dessa questão da segurança.

P: E tu acha que o armamento da população é uma possibilidade de solução para isso?

Sou completamente a favor. Temos que devolver pro bandido o elemento surpresa. O cara quando vai assaltar alguém ele tem que pensar “será que ele tá armado?”. Hoje o cara assalta e sabe que tu não tá armado. Então o cara tá lá numa fazenda, no interior, nos confins e entra uma quadrilha e tu não tem arma. Tem que ter. O cidadão, claro, com todas as exigências que se faz, curso, exame, enfim, tem que ter o direito a defender a tua vida e o da tua família. Ninguém vai sair espalhando arma, não é isso, ma tu não pode tirar arma do cidadão cumpridor de leis, o cidadão de bem, pra defender o seu bem maior que é sua família. O bandido não compra arma, ele rouba arma. Então eu acho o desarmamento uma palhaçada. Aqui, inclusive, teve um plebiscito e ganhou o armamento e no fim tivemos o desarmamento. Então acho que é necessário sim rever o desarmamento para que aquele cidadão, que passe por todo o processo necessário, possa portar uma arma. Só pra te dizer que uma faca é uma arma viu, mas não proibiram faca.

Após a entrevista, Mônica agradeceu a nossa presença, minha e do Jean Costa, que ajudou com as gravações, além de debatermos outros pontos que não entraram para o material da entrevista. O encontro, independente das opiniões divergentes, foi enriquecedor para nós alunos de jornalismo quanto a postura cívica e política necessária para atuação em tais áreas.

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