INSTITUIÇÃO CATÓLICA NA LAMA: DINHEIRO JOGADO FORA PELA FALTA DE PLANEJAMENTO (FOTO: Luiz Roberto Lima/Extra)

A (única) voz de Francisco e a falta de vozes na imprensa

Não é uma pauta antirreligiosa. É a-religiosa.

Bruno Viterbo
4 min readJul 30, 2013

--

Fechando a trilogia de artigos sobre a vinda do humilde, irretocável, amável, alegre, espirituoso, formidável papa Francisco, finalizo com algumas perguntas e uma também humilde opinião a respeito do circo armado pelos meios de comunicação (e por este que escreve, claro).

Primeira pergunta: quando a instituição católica voltará a reunir esse contingente de pessoas em solo brasileiro? Resposta: provavelmente daqui a muito tempo. Mas aí o radical rebaterá: “não precisamos de uma multidão para provar a nossa fé, somos a igreja de Cristo!”. O católico mais radical toma para si a instituição como única e defensora dos valores pregados na bíblia. Tão asqueroso quanto o crente que define que ele é o verdadeiro defensor da palavra de Deus.

Porém é essa mesma instituição evangélica que reúne multidões Brasil adentro e afora, com concentrações pregadas pelos mais variados líderes de igrejas. A Marcha para Jesus é um exemplo de como a instituição evangélica tem força — ainda que insistam que essa denominação tenha apenas 20% dos fieis em solo brasileiro. Aliás, quando eventos crentes desse tamanho são realizados, as críticas brotam de todos os lugares. Mas o que falar dos gastos com essa JMJ, que teve um palco jogado, literalmente, na lama (como mostra a imagem acima)?

Multidão em Copacabana: quando veremos isso novamente?
(foto: EFE)

Multidões impressionam. As fotos de Copacabana tomada são lindas. É uma demonstração de força e fé. Mas os católicos precisam de um evento dessa magnitude para mostrar isso. Depois, os “fieis e peregrinos” voltarão às suas casas, crentes de que “cumpriram a missão”. Concentração assim? Talvez na missa do Padre Marcelo Rossi e o imponente Santuário Mãe de Deus e olhe lá.

Mas é inegável: foi uma grata celebração da fé professada por um público jovem, desiludidos com as atuais formas de organização da sociedade. Apenas lamento e critico a hipocrisia de alguns que veem nesse evento um marco máximo, como se outras denominações religiosas não fizessem eventos com tamanha quantidade de pessoas. Evento este que gerou reclamações de quem participou. Mesmo com o sistema de metrôs e ônibus funcionando 24 horas, a organização enfrentou problemas de mobilidade, além do já falado palco enlamaçado.

Segunda pergunta: Francisco é realmente humilde ou é uma grande jogada de marketing da instituição católica? Os dois. De formação franciscana e jesuíta, o papa exala humildade e simpatia. O que é incrível em comparação a outros austeros papas e totalmente coerente com a filosofia que o argentino prega. Porém, não diz a bíblia que devemos seguir os passos e ensinamentos de Jesus? O que todos os papas deveriam ser, este o é. Mas a Santa Sé precisa de “renovação” para abafar os escândalos financeiros, políticos e sexuais que permeiam o Vaticano desde sempre e, numa tentativa forçada de renovação da imagem, tem em Francisco a chave para essa mudança.

A pirâmide da humildade (ilustração de Laerte)

Terceira pergunta: as emissoras e jornais se renderam à vinda do Sumo Pontífice. E o resto dos problemas (ou soluções)? Bem, deixa estar, devem pensar os chefões editoriais. Afinal é muito mais fácil falar do quanto Francisco é humilde e abençoado e adotar uma postura única do que mostrar os protestos que aconteceram aos olhos de todos e os problemas da instituição católica, além dos gastos com a Jornada Mundial da Juventude.

A semana foi transformada em altar pela maioria das emissoras. Discursos inteiros foram transmitidos, em quaisquer jornais e programas, numa total demonstração de pro-catolicismo exagerado. Matérias exploraram à exaustão os passos e ditos de Francisco, numa irritante e cansativa cobertura. Aliás, nunca couberam tantos adjetivos a um líder religioso.

Manifestações contra o governador do Rio, Sergio Cabral e a Marcha das Vadias pouco foram lembradas. Afinal, o público é conservador e louva Francisco como um rei supremo que não permite esse tipo de “heresia”. Foram poucos os momentos (ou minutos) dedicados às polêmicas que envolvem a Santa Sé, uma frase aqui, outra acolá, pouco diante da extensiva cobertura nada humilde (no sentido de quantidade) feita pelos veículos de comunicação. Por outro lado, é bem verdade que a Marcha das Vadias teve momentos em que a liberdade foi confundida com libertinagem. É só pesquisar as fotos e ver o ridículo feito a céu aberto. Nojento, infantil, podre.

Veja bem: não é por uma imprensa imparcial. Isso jamais existiu. É por uma imprensa plural, que dá voz a todos. Um artigo no Observatório da Imprensa (Papa pop vai esquentar debate sobre estado laico) definiu de maneira simples o que quero dizer aqui:

“Esta não é uma pauta antirreligiosa, ao contrário, é uma garantia do pluralismo. Mas no Brasil, imprensa e pluralismo não se atraem”.

P.S.: Enquanto isso, ficaremos com este tipo de reportagem: uma imagem de uma santa foi “encontrada” no interior de uma tora de madeira.

--

--

Bruno Viterbo

Redator, às vezes fotógrafo (como na foto ao lado) e às vezes jornalista. Mas sempre encontrando tempo para assistir alguma coisa (boa) na TV.