Polímeros para combustíveis mais seguros

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17 min readNov 25, 2015

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Evitando Explosões em Combustíveis

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O atentado terrorista de 11 de setembro de 2001 serviu de inspiração para um grupo de pesquisadores do Caltech desenvolver aditivos que evitam que combustíveis entrem em ignição após uma colisão, reduzindo mortes e danos. A equipe criou um aditivo polimérico que forma megasupramoléculas espontaneamente e é capaz de evitar a formação de névoa inflamável durante colisões, evitando assim a ignição espontânea ou forçada do combustível.

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Roger Williamson foi um piloto inglês de Fórmula 1 que morreu durante o Grande Prêmio da Holanda de 1973. As circunstâncias do acidente que vitimou Williamson são terríveis: o pneu estourou e, devido à alta velocidade, o carro se arrastou por cerca de 275 metros até parar de ponta cabeça num muro de contenção. Devido ao atrito do tanque de combustível com o asfalto, a névoa de gasolina formada na colisão entrou em ignição e o carro se incendiou. Outro piloto, David Purley, desceu de seu carro e tentou virar o carro do amigo enquanto os organizadores e equipes de emergência apenas assistiam. A corrida continuou normalmente. O acidente é até hoje lembrado como um dos piores da história da Fórmula 1.

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Em 17 de julho de 2007, o Airbus A320 da TAM operando o voo JJ3054, vindo de Porto Alegre, passou da pista do aeroporto de Congonhas durante o pouso em um dia chuvoso e colidiu com um depósito da mesma companhia do outro lado da rua. Todos os passageiros e tripulação morreram, além de 11 funcionários do depósito e um taxista que estava no posto de gasolina ao lado.

Na manhã do dia 11 de setembro de 2001, quatro aviões comerciais foram sequestrados nos Estados Unidos. Os dois Boeing 747 Jumbo que atingiram as Torres Gêmeas, em Nova Iorque, saíam de Boston com destino a Los Angeles. O voo 11 da American Airlines colidiu com a Torre Norte do World Trade Center às 8:46 da manhã enquanto o voo 175 da United Airlines colidiu contra a Torre Sul às 9:03. Ambos os edifícios desmoronaram cerca de duas horas após as colisões. Apenas o colapso das torres fez 2606 vítimas, sendo 2195 funcionários do WTC, 343 bombeiros, 60 policiais e 8 membros de equipes médicas.

O que todos estes incidentes têm em comum é: a maioria das vítimas não sofreu ferimentos sérios devido ao impacto, mas morreu em decorrência do fogo. Williamson morreu asfixiado. Segundo investigações, o impacto da colisão do Airbus da TAM não foi grave, porém a maior parte das vítimas morreu carbonizada. As investigações realizadas pelo National Institute of Standards and Technology sobre a queda das Torres Gêmeas chegaram à conclusão de que os prédios desabaram em consequência de danos estruturais nas vigas de aço, causados pelas altas temperaturas decorrentes da ignição do combustível dos aviões. A energia liberada pela bola de fogo de cada Jumbo foi calculada em aproximadamente 50.000 MJ por andar por prédio — aproximadamente dez vezes a energia cinética dos impactos, que foi estimada entre 4300–6300 MJ. A pressão gerada pela névoa queimando dentro do prédio era tão grande que deslocou blocos de concreto e explodiu janelas, arremessando escombros a altas velocidades que arrancaram o isolamento das colunas de aço da estrutura das torres. Isto resultou em incêndios simultâneos em vários andares incidindo diretamente sobre as vigas de aço, com suprimento virtualmente ilimitado de oxigênio para alimentar a combustão. Centenas de pessoas morreram com o impacto direto das aeronaves contra os edifícios, porém o maior número de vítimas ficou presa e morreu com o colapso ou asfixiada. Em termos gerais, estima-se que o fogo seja responsável por 40% das mortes em acidentes aéreos.

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Quem viveu o 11 de setembro sabe o quão chocante foi. O evento, porém, serviu de inspiração para um grupo de pesquisadores do Caltech (Californa Institute of Technology), em Passadena, Califórnia, desenvolver aditivos para combustíveis de aviação que não entrem em ignição após uma colisão. Segundo a professora do Caltech, Julie A. Kornfield, líder do Kornfield Lab, o episódio marcou tanto que fez com que o grupo aceitasse de imediato o pedido da Aeronáutica dos EUA para pesquisar e testar tal material.

O Kornfield Lab trabalha no desenvolvimento de polímeros para soluções em diversas áreas, inclusive tratamento de doenças oftalmológicas. Ao aceitar o desafio, eles precisaram estudar e desenvolver um aditivo que evitasse a ignição sem, no entanto, prejudicar os motores dos veículos ou a performance dos combustíveis. Tentativas semelhantes já haviam sido realizadas na década de 70, mas os polímeros desenvolvidos na época, apesar diminuírem os efeitos da ignição em névoa de combustíveis, não se mostraram viáveis comercialmente. As pesquisas foram então abandonadas na década de 80, mas serviram de inspiração para Kornfield e sua equipe: e se outros tipos de polímeros pudessem cumprir este papel?

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Atomização em combustíveis líquidos

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Combustíveis fósseis líquidos como a gasolina, diesel e querosene são a maior força motriz de veículos no mundo, representando 34% do consumo mundial de energia. Porém, esta dependência representa um risco maior de explosão quando ocorrem acidentes. Uma poça de combustível não explode facilmente devido às altas energias necessárias para manter o calor até atingir o ponto de autoignição. No entanto, um efeito que ao mesmo tempo é fundamental para o funcionamento dos motores de combustão pode se tornar o principal vilão de uma colisão: a atomização.

A atomização é um processo de transformação de um jato de líquido em pequenas gotículas em suspensão — como um spray. A maioria dos sistemas de criação de “sprays” consiste na formação de gotículas diretamente vindas de um jato em regime turbulento (como quando você aperta o dedo na saída da mangueira). Dentro destas condições, as gotículas podem se formar de quatro maneiras diferentes, dependendo de fatores como a velocidade do jato e seu diâmetro. No caso da atomização, o líquido se “desintegra” longe da saída da fonte em pequenas gotículas com diâmetro muito menor do que o da saída, transformando-se em uma espécie de névoa.

No caso de motores de combustão interna, este processo é fundamental para a mistura entre o combustível e o ar. Apesar da importância da atomização, os mecanismos de quebra ainda não são bem compreendidos, mas alguns detalhes já são conhecidos. Quando se trata de atomizadores comerciais, a maneira como o jato se desintegra pode ser controlada por pressão, forças centrífugas, entre outros. Mas o que acontece quando centenas de litros de combustível de aviação são transformadas em pequenas partículas dispersas no ar?

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A atomização acontece constantemente nos motores de combustão interna, incluindo a maioria dos motores de propulsão a jato — no caso de aviões. Carros de passeio e motocicletas utilizam o ciclo Otto e veículos pesados como caminhões, trens e navios utilizam o ciclo ideal do Diesel (que não se refere necessariamente ao combustível utilizado, mas sim ao ciclo termodinâmico em que o motor opera). Para que um combustível seja queimado, em geral, é necessário que três coisas ocorram: a atomização, emulsificação (mistura das gotículas de combustível com o ar comprimido) e a vaporização (transformado as gotículas em uma forma rarefeita). No caso de motores, a atomização é função do bico injetor. Ao contrário do que acontece em acidentes, não ocorrem “explosões” dentro dos motores, mas sim a combustão controlada.
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Durante um impacto, pode-se imaginar que os mecanismos dominantes no caso de uma colisão são as forças mecânicas externas. Porém, a assimetria do sistema (uma forma técnica de dizer “coisas voando para todos os lados”) faz com que uma série de outros fatores também possa contribuir para a formação de névoa de combustível: a tensão superficial entre o jato em movimento e o ar em repouso (que desestabiliza o jato causando sua desintegração), forças centrífugas em jatos “com redemoinhos”, forças eletrostáticas externas, entre outras. Os fatores dominantes para a análise do processo de formação das gotículas são o número de Reynolds e o número de Ohnesorge.

O número de Reynolds (Re) é uma grandeza adimensional utilizada para prever padrões de fluxo similares em diferentes situações em mecânica dos fluidos; também é útil para caracterizar o tipo escoamento para diferentes sistemas. Ele é definido pela razão entre as forças inerciais e as forças de viscosidade, quantificando a importância de cada uma em determinado sistema para a caracterização do regime de fluxo, dependendo das condições iniciais. Sistemas com baixos Re são dominados principalmente pelas forças de viscosidade e são caracterizados por movimento constante do fluido (fluxo laminar). Já sistemas com altos Re são dominados pelas forças inerciais e tendem a produzir vórtices, pontos caóticos e outras instabilidades (fluxo turbulento). No caso de uma colisão com formação de névoa de combustível, pode-se esperar Res altíssimos, com sistemas altamente caóticos.

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Já o número de Ohnesorge (Oh), também uma grandeza adimensional, relaciona as forças de viscosidade com as forças inerciais e a tensão superficial. Ele é normalmente é utilizado para entender a distribuição das gotículas na névoa.

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Relacionando-se Re com Oh, é possível entender que os mecanismos responsáveis pela formação das gotículas num spray ou névoa dependem fortemente da viscosidade do líquido. E foi neste fator que a equipe do Caltech se concentrou na hora de desenvolver um polímero que pudesse evitar a autoignição de combustíveis líquidos.

Onde:
ρ: massa específica do fluido
ϑ: velocidade média do fluido
µ: viscosidade dinâmica do fluido
σ: tensão superficial
D: longitude característica do fluxo (ex: diâmetro para fluxo no cano)
L: comprimento característico (no caso de gotas, o diâmetro)

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O problema: ignição a baixas energias

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A criação destes sprays ou névoas resulta em gotículas de diferentes tamanhos, e normalmente métodos estatísticos são utilizados para descrever a distribuição de tamanhos. O problema encontrado pelos pesquisadores nos anos 70, e que também inspirou o time de Kornfield, é simples:

Tomando a razão Área de Superfície / Volume (A/V) de uma esfera — gotículas menores que 2 mm são aproximadamente esféricas — temos que A/V = 3/r. Isso quer dizer que quanto menor for o raio das esferas, maior será a superfície de combustível em contato com o ar para um mesmo volume inicial de combustível. Como a superfície de contato de um reagente é diretamente proporcional à velocidade de reação, quanto menor for o tamanho das gotículas de combustível, mais rapidamente ele oxidará e liberará energia. Em poucas palavras: quanto mais fina a névoa de combustível, mais violenta a explosão.

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Além disso, a taxa de transferência de calor convectiva para uma gotícula suspensa em ar, descrita pela lei do resfriamento de Newton, é proporcional à diferença de temperatura (∆T) entre o ar e a gotícula, o coeficiente de transferência de calor e o quadrado do raio da gotícula, ou seja: uma partícula com um diâmetro de 0,4 mm precisa de quatro vezes mais energia do que uma partícula de 0,2 mm para atingir a mesma temperatura. Desta maneira, é muito mais difícil atingir o ponto de ignição em uma gotícula de 0,4 mm do que em uma partícula de diâmetro 0,2 mm.

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Finalmente, o aumento no diâmetro médio das gotículas também faz com que a névoa disperse mais rápido. Isso ocorre por que partículas muito pequenas ficam mais tempo em suspensão devido a colisões com os átomos em movimento presentes no fluído (Movimento Browniano). Um aumento de 10 vezes no diâmetro das gotículas acarreta num aumento de 1000 vezes na sua massa, fazendo com que as partículas deixem de exibir Movimento Browniano e a névoa decante mais rapidamente.

Assim, o grande desafio da equipe foi desenvolver um polímero capaz de aumentar a viscosidade do combustível, dificultando a formação de gotículas pequenas, porém sem prejudicar seu desempenho em motores ou turbinas.

Onde:
Q: energia térmica em joules
h: coeficiente de transferência de calor
∆T(t) = T(t) — T: gradiente térmico dependente do tempo entre a gotícula e o ar.
A: área de superfície
V: volume
r: raio da esfera

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Quanto maior o raio médio das gotículas de combustível formadas em um impacto, menor é o risco de explosão. Isso por que (1) a área superfície de combustível em contato com o ar é inversamente proporcional ao raio; (2) a energia necessária para aquecer a gotícula aumenta com o quadrado do raio; e (3) partículas maiores em suspensão decantam mais rápido que as menores.
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Construindo soluções

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Na década de 70, pesquisadores se empenharam em descobrir um aditivo que pudesse solucionar este problema, principalmente após o terrível acidente aéreo de Tenerife — dois aviões Jumbo Boeing 747 se chocaram na pista do aeroporto e explodiram, deixando 583 mortos e 61 feridos. Na época, testes com polímeros de cadeia ultralongas como o FM-09 (peso molecular > 3000 kg/mol de copolímero, 5 mol% de unidades de carboxila) indicaram um aumento no diâmetro das gotículas na névoa de combustível após o impacto, resultando num fogo a temperaturas relativamente baixas e de curta duração.

A característica especial que permite que os polímeros ajudem a controlar a formação da névoa e diminuir o arrasto nos combustíveis é a sua capacidade de armazenar energia à medida que suas cadeias “esticam” — assim, o fluido como um todo resiste ao alongamento, tornando sua separação em porções menores mais difícil. Os polímeros ultralongos são potenciais candidatos para esta tarefa graças a como as suas cadeias se comportam tanto ao começar a ser alongadas quanto ao máximo de extensão que suportam. O artigo da equipe do Caltech, publicado na revista Science, dá um exemplo: aumentando o peso molecular de 50 kg/mol para 5000 kg/mol, a taxa crítica de alongamento diminui em mais de três ordens de grandeza e o alongamento máximo molecular aumenta em duas ordens de grandeza.

No entanto os polímeros desenvolvidos para este fim da década de 70, como o FM-09, deveriam ser adicionados ao combustível momentos antes do abastecimento das aeronaves, dificultando a logística nos pátios dos aeroportos. Tudo isso porque as cadeias ultralongas se degradam durante os processos de transporte, bombeamento e filtragem do combustível. Ao passar pelas tubulações, tensão hidrodinâmica se acumula ao longo da cadeia principal até quebrar as ligações covalentes, como se o polímero fosse “raspado”. Essa “raspagem” continua até que as cadeias encurtem e tenham peso molecular menor do que 1000 kg/mol. Caso o aditivo fosse adotado, seria necessário também realizar alterações nos motores das aeronaves, pois o polímero interferia no seu funcionamento. É claro que os fabricantes do setor de aviação não concordaram, tornando a comercialização do aditivo inviável.

Conhecendo as vantagens e desvantagens dos polímeros de cadeia ultralonga, a equipe decidiu utilizar cadeias não tão longas, mas que possuíssem terminações “grudentas” ou “adesivas”, semelhante a um Velcro. Estes polímeros menores se associariam entre si para criar o que os pesquisadores chamam de megasupramoléculas: polímeros gigantescos que teriam o mesmo comportamento dos polímeros ultralongos, exibindo as mesmas características como alta conformidade em repouso e alta capacidade de alongamento durante o fluxo. Para isso, a associação deve ocorrer nas extremidades das cadeias e em pares. Além disso, a existência das duas extremidades adesivas permitiria que a megasupramolécula se quebrasse em partes menores durante o manejo do combustível, voltando posteriormente à sua configuração original e recuperando as suas propriedades mecânicas. A este tipo de polímero dá-se o nome de “telequélico” (telechelic).

Os pesquisadores optaram por utilizar hidrocarbonetos insaturados devido à sua solubilidade e resistência. Além disso, eles não têm efeitos reológicos significativos (o que é interessante para manter o fluxo de combustível semelhante ao fluxo sem adição de polímeros) e se mantém em solução mesmo abaixo do ponto de congelamento do combustível. A equipe também buscou grupos terminais que tendem a fazer ligações de hidrogênio, ligações resultantes de fortes atrações eletrostáticas entre o hidrogênio e outro átomo devido a cargas localizadas em cada átomo (não confundir com ponte de hidrogênio). Estudos recentes que indicam que este tipo de ligação é forte o suficiente para conseguir uma associação consistente entre pares de cadeias curtas (peso molecular ≤ 50 kg/mol).

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No entanto, estudos anteriores indicavam que estes polímeros telequélicos não seriam capazes de se associar para a formarem megasupramoléculas. Logo, a equipe desenvolveu estudos utilizando mecânica estatística para estimar se isso poderia ocorrer sob condições específicas. Eles investigaram polímeros a concentrações abaixo de 1% para guiar a seleção das melhores estruturas moleculares para o trabalho. O modelo usa o peso molecular para mapear possíveis locais de rede, onde cada local tem o mesmo volume de um segmento de Kuhn: basicamente, segundo o tratamento teórico proposto por Werner Kuhn, cada cadeia polimérica real é considerada como uma coleção de N segmentos. Cada segmento pode ser interpretado como se estivesse livremente associado ao outro, podendo estar orientado de forma randômica ou em qualquer direção, sem sofrer a influência de forças, independente das direções tomadas por outros segmentos. Ou seja, ao invés de considerar uma cadeia real com n ligações e com ângulos de ligação, torção e comprimento fixos, Kuhn considerou uma cadeia equivalente ideal com N segmentos conectados que podem se orientar em qualquer direção. A estes segmentos dá-se o nome de segmento de Kuhn, que possibilitam a investigação das mais diversas formas com que polímeros podem se estruturar.

Assim, a equipe de Kornfield chegou à conclusão de que estas associações entre polímeros telequélicos funcionam satisfatoriamente sob duas condições: se o peso molecular estiver entre 400–1000 kg/mol e seus grupos funcionais das extremidades se associarem com energia de 16–18 kT. Se a energia de ligação é muito baixa, a formação de supramoléculas é inadequada. Se a energia de ligação é muito alta, extremidades “penduradas” são muito penalizadas e poucas espécies lineares se formam.

Já com as informações necessárias em mãos, os pesquisadores projetaram e sintetizaram polímeros com cadeia principal de cerca de 50.000 átomos de carbono. As moléculas tinham ou aminas di-terciárias ou ácidos isoftálicos como grupos terminais, que formam ligações de hidrogênio intermoleculares. Elas são três vezes mais fortes do que pontes de hidrogênio. “Nós escolhemos moléculas e grupos terminais muito simples”, disse Kornfield em sua palestra na Conferência de Inovação e Tecnologia da Braskem, “você não espera que uma molécula tão simples seja milagrosa. Grupos terminais simples podem fazer coisas muito poderosas”.

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A extinção do fogo

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O polímero desenvolvido pela equipe de Kornfield foi então adicionado a combustível de aviação utilizando concentrações muito baixas — em torno de 0,3%. Nestas condições, o polímero não afetou nenhuma propriedade fundamental do combustível como densidade, energia e tensão superficial. A formação de megasupramoléculas se mostrou evidente pela viscosidade da solução e pelas medidas de espalhamento de luz laser multiângulo (MALLS, na sigla em inglês). O esforço cortante observado também indica que os polímeros telequélicos se associaram em megasupermoléculas.

Agora vem a parte divertida: os testes com fogo. Para testar a eficiência do aditivo no controle de ignição do combustível, um projétil foi atirado (para simular o efeito de um impacto) em contêineres com combustível de aviação comum ou com combustível de aviação tratado com o aditivo. Além disso, eles colocaram três maçaricos de propano ao longo do caminho da propagação da névoa. No caso do combustível comum, as condições de impacto geram uma névoa extremamente fina pela qual o fogo se propaga rapidamente. Dentro de 60 milisegundos, a névoa se transforma numa grande bola de fogo.

Já o combustível com o aditivo polimérico foi testado de duas formas. Na primeira, foi utilizado combustível recém misturado com o aditivo. Na segunda, o combustível passou por tubulações por aproximadamente 60 segundos antes de ser injetado no contêiner. Os resultados são impressionantes: a névoa formada em ambos os casos é visivelmente mais controlada e espessa, mesmo após passar repetidamente por uma bomba de combustível. Segundo Kornfield, quando as supermoléculas estão em equilíbrio elas se mantém em uma forma enrolada. Quando as gotículas de combustível se alongam após o impacto, as megasupermoléculas se esticam, mas apenas até certa extensão e, ao invés de quebrarem, apenas desgrudam umas das outras, se recombinando rapidamente — o que evita que as gotículas se dividam e se transformem na névoa altamente inflamável. Quando os maçaricos são acionados, apesar de pequenos focos de ignição aparecerem, o fogo não se propaga pela névoa e se extingue rapidamente. Veja a entrevista com a professora Julie Kornfield no YouTube da Polyteck.

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“Nós mesmos não acreditávamos no que estávamos vendo. A primeira coisa que fomos verificar é se os maçaricos estavam funcionando, pois se não houvesse fogo, o experimento não valeria”, comenta Kornfield. “Mas ao assistir o vídeo com cuidado notamos que o fogo realmente estava lá, mas se autoextinguia numa velocidade impressionante”.

Além disso, testes simultâneos com diesel foram realizados utilizando o Protocolo Federal para Teste em Motores a Diesel dos EUA. Os resultados iniciais mostram que não há mudanças significativas nos níveis de consumo de combustível, além de pouca diferença nos níveis de emissão de gases. O resultado mais significativo encontrado foi a redução da formação de fuligem em 11,7%, o que indica que os combustíveis tratados com o polímero são tão eficientes como o diesel comum, porém mais limpos.

A equipe agora está construindo um sintetizador em escala piloto que poderia produzir 1 kg do aditivo por hora e já recebeu atenção de empresas do ramo de combustíveis de aviação e transporte de líquidos inflamáveis. Este é um exemplo claro de trabalho interdisciplinar focado diretamente em soluções para pessoas — a aplicação de teoria de polímeros para resolver problemas práticos maiores. E esta é a maneira mais eficiente de desenvolver novos materiais. Em entrevista à Polyteck, Kornfield finaliza: “Tudo o que eu quero é poder ajudar a salvar vidas. Quem sabe, se os bombeiros tivessem mais 40 minutos para evacuar os prédios no 11 de setembro, muitas mortes poderiam ser evitadas”.

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Entrevista exclusiva com a Prof. Julie Kornfield

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Para saber mais

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  • Ming-Hsin Wei et al., “Megasupramolecules for safer, cleaner fuel by end association of long telechelic polymers”, Science 350, 72 (2015)
  • Bjarne P. Husted, Gören Holmstedt e Tommy Herzberg, “The Physics behind water mist systems”, IWMA Conference (2004)
  • William A. Sirignano, “Recent theoretical advances for liquid-fuel atomization and burning”, Seventh International Symposium on Special Topics in Chemical Propulsion
  • Prachi Patel, “Telechelic polymers suppress jet fuel explosions”, Materials Research Society (2015)
  • Rolf D. Reitz, “Reciprocating Internal Combustion Engines”, Engine Research Center, University of Wisconsin-Madison (2012)
  • Edson J. J. de Souza, “Concepção e desenvolvimento de correlações experimentais para a simulação, controle e otimização de sprays gerados em atomizadores mecânicos-centrífugos”, Tese de Doutorado pelo Curso de Pós-Graduação em Engenharia na ênfase Energia e Ciências Térmicas da Universidade Federal do Paraná
  • Ray T. Bohacz, “Understanding Gasoline Atomization — Breaking Up Is Hard To Do”, Hot Rods (2014)
  • Caltech Kornfield Lab, https://kornfield.caltech.edu/
  • “Atomization Of Liquid Fuels”, Curso Combustion and Fuels, Departamento de Engenharia Mecânica e de Energia da Universidade Politécnica de Wrocław

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