Usina injeta CO2 no subsolo para conter o aquecimento global

A redução dos níveis de dióxido de carbono na atmosfera foi apontado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma das soluções necessárias para evitar desastres consequentes do aquecimento global. Uma das alternativas pouco conhecidas para diminuir a concentração deste gás na atmosfera é o seu armazenamento em rochas no subsolo. Acelerando a formação de minerais carbonatos, é possível atingir um balanço no ciclo do carbono e fornecer uma solução duradoura para o aquecimento global.

Polyteck
Polyteck
6 min readJun 24, 2014

--

A Revolução Industrial não tem esse nome por acaso: é chamada “revolução” pois imprimiu mudanças significativas em quase todos os aspectos do cotidiano dos séculos XVIII e XIX. Produção industrial, novos processos químicos, uso de máquinas a vapor, domínio de processos de extração de ferro e, principalmente, o uso do carvão mineral como combustível são características marcantes deste período. Isso influenciou diretamente o modo de vida das pessoas da época. Segundo Robert E. Lucas Jr, ganhador do Prêmio Nobel de Ciências Econômicas em 1995: “Pela primeira vez na história os padrões de vida das massas de pessoas comuns começaram a se submeter a um crescimento sustentado… Nada remotamente parecido com este comportamento econômico é mencionado por economistas clássicos, até mesmo como uma possibilidade teórica.”

Junto com o advento da indústria vieram algumas mudanças no entendimento sobre a atmosfera do nosso planeta. Em 1820, Fourier calculou que a Terra seria muito mais fria se não tivesse uma atmosfera. Em 1859, John Tyndall descobriu que alguns gases bloqueiam radiação infravermelha. Na época, ele sugeriu também que mudanças nas concentrações desses gases poderiam causar mudanças climáticas no planeta. E em 1896, Arrhenius publicou um primeiro cálculo sobre como as emissões humanas de CO2 poderiam causar aquecimento global.

A absorção de radiação infravermelha por determinados gases presentes na atmosfera (chamados de gases estufa) é essencial para a vida na Terra. Porém, na segunda metade do século XX ficou evidente que este efeito é potencializado pela ação humana, devido ao aumento da emissão de gases estufa.

Desde então governos e organizações vêm procurando soluções para frear o aquecimento global. Juntamente com incentivos para o desenvolvimento de fontes renováveis de energia, já foram assinados vários tratados para a redução de emissões de gases estufa. O mais famoso deles é o Protocolo de Kyoto, assinado em 1997 por vários países, mas rejeitado pelo senado americano.

[caption id=”attachment_3435" align=”aligncenter” width=”618"]

poluicao-atmosferica-3

A radiação infravermelho atinge uma molécula como o dióxido de carbono e faz com que as suas ligações atômicas comecem a vibrar. Por conta dessa absorção de radiação a molécula ganha energia cinética, que pode então ser transmitidas a outras moléculas, tais como o oxigênio e nitrogênio, levando a um aquecimento geral da atmosfera.[/caption]

Na metade século XVIII, as concentrações atmosféricas de CO2 eram de aproximadamente 280 partes por milhão (ppm). Hoje, estas concentrações excedem 390 ppm e continuam a subir rapidamente — cerca de 2 ppm ao ano. Adotar formas de geração de energia “livres” de carbono, como solar, eólica e nuclear, reduz os níveis de emissão de CO2. Contudo, os resultados da redução nas emissões obtidas por estes meios vêm no longo prazo, já que o processo de absorção do gás pela vegetação e oceanos é muito lento. Alguns cientistas sugerem que as concentrações poderiam ser diminuídas mais rapidamente se o CO2 fosse retirado da atmosfera e armazenado de alguma forma. Esta solução seria rápida e eficaz, mas enfrenta dificuldades com relação aos custos e à possibilidade de vazamentos, que recolocariam o gás na atmosfera.

CO2 no subsolo

Até hoje, a maioria dos projetos de armazenamento de carbono no subsolo têm injetado dióxido de carbono em grandes bacias sedimentares. No entanto, o aprisionamento do CO2 na forma de minerais carbonatos demora dezenas de milhares de anos para ocorrer nesses sistemas. Isso porque os minerais silicatos das rochas sedimentares — devido à falta de cálcio, magnésio e ferro — acabam não reagindo com o gás.

Entretanto um novo estudo, sugere que o CO2 pode ser retirado da atmosfera e armazenado de forma segura em rochas basálticas. O trabalho, realizado por pesquisadores da University College London e da University of Iceland, sugere que o gás reage rapidamente com o basalto, podendo ficar imobilizado por milhares de anos abaixo da superfície terrestre.

[gallery type=”square” columns=”2" ids=”3437,3439"]

Para isso, os cientistas alteraram parte das operações de rotina da usina geotérmica de Hellisheidi, na Islândia, e adicionaram dióxido de carbono a um fluxo de água que é bombeado ao subsolo. A reação de imobilização do CO2 ocorre rapidamente no subsolo porque as rochas basálticas são muito mais reativas em água, quando comparadas às rochas sedimentares. O basalto contém cerca de 25%, em peso, de cálcio, magnésio, e óxidos de ferro, metais que estão prontamente disponíveis para combinar com o CO2 injetado para formar minerais carbonatos.

Todo o carbono presente na atmosfera, nos seres vivos e dissolvido nos oceanos é proveniente de rochas. Eventualmente, ele irá voltar para estas rochas, que são o maior reservatório do elemento na Terra. O carbono move-se de um reservatório para outro, no que é chamado de ciclo do carbono. O que os seres humanos fizeram foi simplesmente acelerar este ciclo através da mineração e da queima de combustíveis fósseis, fazendo com que as concentrações de CO2 na atmosfera aumentassem.

Segundo Sigurdur Gislason, professor da Universidade da Islândia, apesar de processos parecidos já terem sido propostos anteriormente, o que impressiona neste caso é a velocidade das reações. Os pesquisadores mostraram que, dentro de um ano, 80% do CO2 havia reagido com magnésio, cálcio e ferro presentes no solo para formar minerais carbonatos como pedra-pomes. Outra vantagem é que as rochas basálticas são abundantes na superfície da Terra: cerca de 10% dos continentes e a maior parte do fundo do oceano é composta de basalto. Logo, a carbonatação dessa rocha poderia tornar-se uma importante solução para armazenamento de carbono.

Uma das maiores dificuldades desta técnica é o fato de que é necessário utilizar, de 10 a 20 vezes, mais água do que a massa de dióxido carbono que será armazenada. Com isso, os pesquisadores estimam que custará, pelo menos por enquanto, o dobro das técnicas convencionais de armazenamento de CO2 — o que já é caro, tanto do ponto de vista financeiro quanto energético.

krafla_geothermal_power_station_2

Estudos anteriores indicam que capturar CO2 da atmosfera poderia custar cerca de $300 por tonelada de CO2, totalizando um investimento de mais de $ 10 trilhões para reverter totalmente o aquecimento global. É um custo altíssimo, mas ainda economicamente viável. Porém Kurt House, geocientista na C12 Energy em Berkeley, Califórnia, e colegas apontaram, num estudo publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences, que apenas para capturar o CO2 da atmosfera seriam necessários $ 33 trilhões. Além disso, a energia consumida deve vir de fontes renováveis de energia, pois a quantidade necessária para realizar o processo, caso fosse proveniente da queima de combustíveis fósseis, emitiria quatro vezes mais carbono do que o capturado.

Já o físico Robert Socolow, da Universidade de Princeton, mostra-se otimista: “Eu concordo que este processo seria caro agora e de que precisaríamos de fontes renováveis de energia para fazer isso. Hoje nós não sabemos como fazer isso com baixo custo, mas há trabalho a ser feito que pode diminuir os custos significativamente.”
Tudo indica que é melhor continuar investindo em fontes renováveis de energia, evitando o excesso de CO2 na atmosfera, do que ter que retirá-lo do ar. No entanto, relatórios publicados recentemente pela ONU indicam uma possível irreversibilidade das mudanças climáticas devido ao aquecimento global. Caso esse cenário se confirme, a captura de CO2 em rochas é uma alternativa promissora — desde que alguém esteja disposto a pagar por isso. ■

Fontes:

S. R. Gislason et al., Science 344, 6182, 373–374 (2014)
Lucas, Robert E., Jr., “Lectures on Economic Growth” 109–10 (2002)
Kevin Bullis, “Storing Greenhouse Gases by Petrifying Them”, MIT Technology Review (2014)
Sid Perkings, “Capturing CO2 Too Costly to Combat Climate Change?”, Science (2011)

--

--

Polyteck
Polyteck

Vai Além da Sala de Aula. Tecnologia e ciência para universitários e professores.