Cristianismo Cool e a Decadência do Evangelicalismo Brasileiro

Paulo Vitor Siqueira
Ponderationes Teofilosóficas
5 min readSep 7, 2019

Há tempo, eu venho percebendo algo que muito tem me incomodado nas igrejas evangélicas do Brasil. Creio não ser segredo para ninguém que o evangelicalismo brasileiro está bem decadente. Basta vermos a maioria dos programas evangélicos de televisão e vídeos virais na internet, nos quais reinam a teologia da prosperidade, “cultos” de realização de milagres sem exposição do evangelho, antropomorfismo e, em resumo, aquilo que Lutero chamou de teologia da glória (teologia gloriae). Entretanto, não obstante tais fatidicidades e corrupções do genuníno evangelho, tem surgido um novo movimento no meio evangélico/protestante que eu apelido de “cristianismo cool” (legal).

Pois bem, do que se trata tal movimentado denominado por mim de “cristianismo cool”? Com tal expressão, quero referir-me àquele cristianismo que é banalizado para atrair jovens e “pessoas do mundo” para dentro da igreja. Para conceituar melhor, com “banalizado”, refiro-me à corrupção do evangelho para agradar as pessoas, principalmente jovens, e, assim, poder trazê-los para dentro da igreja. Ora, a teologia da prosperidade e todas as más teologias supracitadas também não fazem o mesmo? Qual a diferença do cristianismo cool em relação a tais? Em certo sentido, sim, tais teologias fazem o mesmo e não necessariamente são contraditórias, é totalmente possível um híbrido entre todas elas. Entretanto, parece-me que a ênfase, propósito e o público principal são distintos. Enquanto as teologias supramencionadas parecem querer atrair as pessoas com ênfase nas promessas de bens materiais ou de uma boa vida, e têm o propósito de enriquecer seus proponentes tomando como alvo todas as pessoas que podem contribuir para isso; o cristianismo cool parece querer atrair as pessoas imitando práticas pecaminosas do mundo revestidas de cristianismo, dando ênfase no amor de Deus e no suposto grande valor do ser humano, visa a lotação de igrejas e tem como alvo sobretudo os jovens.

A priori, parece que o cristianismo cool possui um bom propósito, um bom motivo. Entretanto, e esse é o ponto nevrálgico, o perturbador não é tanto o propósito, mas os meios para se alcançar tal fim. Nós precisamos estar conscientes de que, quando se trata de culto a Deus, os fins não justificam os meios. Há a maneira correta de adorarmos a Deus, e isso é muito bem exposto nas escrituas - o segundo mandamento traz isso como preceito principal. Entretanto, o que tem ocorrido, hoje, no evangelicalismo brasilero, é a mitigação ou ocultamento total de certas verdades do evangelho e a hiperbolização de outras para que o evangelho seja mais “palatável” ao público. Ou seja, neste contexto, a corrupção do evangelho para agradar sobretudo os impulsos dos “jovens modernos”.

E é daí que parecem surgir inúmeras baboseiras no evangelicalismo brasileiro, em relação aos jovens. Termos bíblicos são substuídos por termos mais “cools”, as pregações recebem títulos “moderninhos”, as passagens pregadas são, no mais das vezes, passagens que massageiam o ego (o que é totalmente contrário à exposição do Apóstolo Paulo em Romanos 1.18–3.20, em Efésios 2). As músicas são as mesmas de sempre, induzindo a um mecanicismo na adoração, e quase sempre antropocêntricas (contrapondo Is 64.6, por exemplo), nas quais o amor de Deus é, no mais das vezes, enfatizado e outros atributos são esquecidos, frases de efeito são ditas a todo momento, e a profundidade teológica é jogada no lixo. Não há ou quase não há menção sobre a submissão da esposa ao marido(Ef 5.22), sobre a maldita condição humana (Gn 6.12, Rm 3.12), sobre os atributo da justiça de Deus, de sua ira e o seu ódio pelo pecado, todos manifestados na cruz de Cristo. A pregação é quase sempre feita para que, ao final do culto, o público se sinta bem e quase nunca para que o público trema por seus pecados e reconheça sua total falta de merecimento em relação às bençãos de Deus.

Nesse sentido, as igrejas acabam entregando um evangelho parcial e, portanto, banalizado. Ora, a verdade do evangelho, exposta de maneira parcial, é uma mentira. Além disso, há o modo que os jovens, enlaçados por esse cristianismo cool, agem. São jovens que adotam ideologias secularistas claramente antibíblicas, que não suportam certas verdades bíblicas como a supracitada submissão da esposa ao marido, a justiça de Deus em condenar pessoas ao inferno eterno, a ira de Deus pelo pecado, a necessidade de um afastamento daquilo que os ímpios fazem, nunca estudam teologia com acurácia. São jovens que se importam mais com quantidade do que com qualidade, que querem espalhar o “evangelho” a qualquer custo, com os fins justificando os meios, que acabam dando mais valor para certas “revelações” e certos sentimentos do que para a própria Bíblia. São jovens cuja autoridade última é o sentimento e não a Escritura. E o próprio ambiente nos quais “cultuam” reflete isso; geralmente as luzes são apagadas e há um background musical para atiçar as emoções.

Dito isto, qual a solução para acabar com o cristianismo cool, que parece estar enlaçando muitas pessoas e tomando conta das igrejas? Creio que podem haver inúmeras soluções e abordagens. Entretanto, o que não pode faltar em nenhuma delas é a avaliação meticulosa das Escrituras. Quando conseguirmos fazer os nossos jovens se apegarem mais à Bíblia do que aos seus sentimentos, certamente começaremos a ver bons resultados. Se a Bíblia diz A e B, então devemos dizer A e B. Não devemos, a fim de agradar o ego dos ouvintes e lotar nossas igrejas com pessoas que se preocupam em imitar mais os pecadores do que a Cristo, dizer apenas A.

Àqueles que dizem que pelo menos tal tipo de cristianismo “funciona”, eu respondo, dizendo: se é certo, funciona; mas, se funciona, não necessariamente é certo. E isso é suficiente para lidar com tal objeção sob o pressuposto de que nós, cristãos, devemos fazer o certo, o correto, sobretudo quando temos o segundo mandamento e as Escrituras como um todo de background.

Para terminar, deixo claro que não estou dizendo que os jovens que foram enlaçados por esse movimento são não-cristãos ou que eles não tenham uma boa motivação ou algo do tipo. Nem mesmo chego a negar que tal movimento tenha trazido ou traz algum benefício para a igreja. Eu só estou propondo que eles estão teologicamente errados e que deveriam mudar, pois isso pode causar grandes males no meio cristão e, a longo prazo, até mesmo redundar no efeito contrário daquele que tal movimento pretende. Ora, se uma pessoa está satisfeita com algo, ela provavelmente não o substituirá por outra coisa; e, se não está, ela buscará substituí-lo por algo diferente, algo que lhe satisfaça. Da mesma forma, se a igreja busca imitar o mundo para atrair os jovens, não há razão para os jovens se sentirem atraídos pela igreja. Pois as pessoas, no mais das vezes, buscam a igreja não para encontrar mais do mesmo, mas para encontrar, justamente, aquilo que não encontraram no mundo, o preenchimento de seu vazio existencial e alegria genuína, coisas que só podem ser alcançadas através do conhecimento de Deus e da obra de Jesus Cristo, o que implica em uma sólida teologia.

--

--