Como comecei uma empresa horizontal

Ou como montar um supertime sem ter um real

Gustavo Tanaka
Baobba Blog
Published in
6 min readOct 16, 2015

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Era a cobertura de um prédio comercial num dos bairros mais luxuosos de São Paulo. Da sala era possível ver quase que a cidade toda. A vista era magnífica.

Mas sentado à mesa, o que estava à minha vista eram 6 investidores. Eles estavam lá para avaliar se queriam investir na minha startup.

Eu precisava do dinheiro. Muito. Estava há um ano e meio trabalhando sem ganhar um real. Meu dinheiro já havia acabado, o caixa da empresa já estava quase zerado. E eu ainda não havia conseguido investimento.

Aquela reunião era crucial.

E do lado de lá da mesa, estavam esses 6 caras avaliando a mim e meu sócio. Avaliando nossa ideia. Avaliando nossa capacidade de criar uma startup.

A reunião acabou e eu saí com um sentimento estranho dentro de mim.

Uma sensação de que aquele movimento não fazia muito sentido.

Quem eram aqueles caras? De onde vinha o dinheiro deles? Será que eu precisava mesmo daquele dinheiro? Não havia outra saída? O que eles queriam comigo? E o que aconteceria se eu fechasse com eles?

Algumas semanas se passaram e felizmente eles não estavam interessados.

Por que felizmente?

Eu comecei a repensar minha vida. Comecei a rever o que estava seguindo. Comecei a rever minhas crenças. Deixei minha intuição passar a me guiar. encarei meus medos e fui me libertando deles. Fui acessando uma informação nova enquanto escrevia meu livro.

E então comecei a desconstruir o modelo.

Por que um empreendedor precisa de um investidor?

Ele precisa de investimento para poder ter caixa para montar um time bom para construir a empresa. Ele precisa dessa grana para contratar bons funcionários e ter pessoas diferentes fazendo o que sabem.

Se você empreende sozinho, sem dinheiro de investidor, é capaz que você acabe fazendo de tudo na sua empresa. Cobrando escanteio e cabeceando.

Então basicamente eu precisava de dinheiro para contratar pessoas.

Os investidores não queriam me dar o dinheiro enquanto eu não tivesse um time e eu não tinha um time porque ainda não tinha dinheiro. Estava preso.

Comecei a pensar diferente e desconstruir o modelo então:

E se ao invés de precisar de gente para trabalhar para mim por um salário, todos eles pudessem ser meus sócios?

Mas qual seria a participação deles e qual seria a minha?

Eu já tinha investido muito dinheiro. Eles entrariam sem investir nada. Era justo que eu tivesse um percentual maior, certo?

Mas 50% de zero é zero. 100% de zero é zero. 80% de zero é zero.

Quem empreende sabe que valuation (avaliar quanto vale a empresa) é uma das coisas mais ridículas que existe. Não existe nenhum parâmetro que faça sentido de verdade. É tudo chute. E sempre tem alguém que sai prejudicado e alguém que sai levando vantagem.

Se eu ficasse nessa de calcular percentual, não sairia do lugar.

Então cheguei à conclusão que todo mundo teria a mesma participação. A empresa seria horizontal e todo mundo ganharia a mesma coisa. A hora de ninguém valeria mais que a hora de ninguém. Ninguém teria mais participação que ninguém.

Comecei a chamar os profissionais que queria no meu time. Pessoas que eu conhecia pessoalmente ou profissionalmente, e que sonhava um dia trabalhar junto.

No começo achei que todos diriam que eu estava louco e que era utópico um modelo como esse.

Chamei um designer, um programador, um film maker, uma nutricionista e um administrador.

Para minha surpresa, todos aceitaram o modelo e confiaram na justiça de se criar uma empresa horizontal. Todos eles acreditaram na ideia de que era possível criar um modelo mais livre, cada um trabalharia a hora que quisesse, pelo período que quisesse, de onde quisesse.

Juntos, começamos a definir os contornos desse modelo.

Criaríamos um único acordo para deixar um pouco mais justo. Quem trabalha mais horas ganhar mais que quem trabalha menos horas.

Mais que 30 horas por semana: ganha o teto

Entre 15 e 30 horas por semana: ganha 50% do teto

Menos de 15 horas: 25% do teto.

E desde então, passamos a trabalhar na criação de um portal de conteúdo sobre vida simples em equilíbrio, combinando nutrição, fitness, gastronomia e natureza. Vamos lançar em algumas semanas.

Começamos a aumentar o nosso time. Em 3 meses montamos um time de 18 pessoas. Programadores back end, programador front end, designer UX/UI, designer de identidade visual, administradores, empreendedora social, curador de conteúdo, nutricionistas, chef de cozinha, educador físico, social media, horticultor / permacultor, produtora, filmmaker, diretor e editor de video.

Quando se cria um modelo horizontal, as negociações podem ter menos de 5 minutos. Você apresenta o conceito, apresenta a ideia de negócio e fala: “Você vai ganhar o mesmo que todo mundo aqui. Pode trabalhar pelo tempo que tem para se dedicar a isso e você escolhe como quer se envolver.”

Pronto. Suficiente.

Não precisamos ficar pensando demais, avaliando demais, pesando prós e contras, conversando com os pais, marido, esposa.

A escolha é simples. É justo. E todo mundo ganha.

Com 18 pessoas, nosso campo de possibilidade se abre absurdamente. Então vimos que conseguiriamos criar mais de um negócio.

E com esse time estamos criando 4 startups ao mesmo tempo.

A agilidade que temos é incrível. Não temos burocracia. Temos expertise e conseguimos montar qualquer negócio.

Quanto me custariam essas pessoas? Quanto dinheiro teria que levantar com investidores?

Não investimos um real para montar esse time. Todos estão entrando doando seu tempo para a criação do novo.

Temos muitos desafios, obviamente. Vamos aprender muito com os erros. Tem coisa que a gente nem consegue prever que vai acontecer. E vai acontecer. Mas a gente vai se ajustar e vai superar. Vamos evoluindo todos os dias. Nunca pára. Assim como é a vida. Precisamos nos ajustar e adaptar todos os dias. Não existe o fim nem o meio. Tudo é o começo. Todo dia é dia de começar.

Mas o que vai acontecer quando tiver briga? E quando uma pessoa quiser ganhar mais que a outra? E quando uma pessoa trabalhar menos? E quando uma pessoa estiver trabalhando mal?

Se você ficar pensando em tudo que pode dar errado, você não faz nada. Talvez nada disso aconteça. Ou talvez aconteça. E aí quando acontecer a gente vai achar um jeito de resolver. Como tudo na vida.

O princípio básico da nossa organização é a confiança. Se eu não puder confiar em quem está comigo, se eu desconfiar, nada disso faz sentido.

Se eu não puder confiar na humanidade, na bondade, no bom senso e na justiça das pessoas, eu prefiro deixar de viver. É nisso que eu acredito e é para isso que eu vivo.

Por que eu estou compartilhando isso? É um case de sucesso?

O que é sucesso? Se sucesso é dinheiro, então não é um case de sucesso. Ainda não lançamos as startups e não estamos ganhando dinheiro.

Eu estou compartilhando isso porque quero mostrar que é possível qualquer coisa quando existe união, colaboração e não existe separação. Todos somos iguais. Criamos um modelo de sociedade insana, de cada um por si, de um ser melhor que o outro.

Então, Gustavo, esse é o melhor modelo que existe? Devo fazer igual?

Não. Existem milhares de outros empreendedores no Brasil e no mundo criando modelos de participação diferentes. E essa que é a beleza de se criar. Não existe fórmula. Não existe A VERDADE. Existe apenas o que você acredita.

Se você se unir aos seus amigos, às pessoas em quem você confia e vocês criarem um modelo justo, onde todos são iguais, você consegue fazer a sua ideia deixar de ser apenas um sonho e virar realidade.

O seu sonho, provavelmente também é o sonho de outra pessoa. Vocês só precisam se conectar.

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Eu serei grato por poder seguir compartilhando textos livremente…

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