19 meses de lama

Os rastros do maior desastre ambiental do país

Catianne Lemos
Portal Vertentes
4 min readJun 15, 2017

--

Catianne Lemos e Karolline Goulart

Desastre em Mariana devasta ecossistema (Foto: Fred Loureiro / Gazeta do Povo)

J á se foram 19 meses desde a tragédia que assolou Mariana e cobriu várias partes do país de lama. O rio, que era doce, a fauna e a flora que compunham o cenário majestoso de uma cidade histórica de Minas Gerais nunca mais serão os mesmos, mas ainda existem questões que podem ser corrigidas. A dúvida que paira no ar é sobre como está a situação do meio ambiente, da economia, das cidades e pessoas atingidas pelo desastre atualmente? E principalmente, o que a SAMARCO — empresa responsável — fez e tem feito a respeito?

Mais de um ano e meio depois, a situação de Mariana e demais cidades afetadas ainda não é boa. Após todo esse tempo, só agora a primeira parcela do acordo entre as empresas responsáveis (Vale, BHP) e o poder público será depositada, no qual o valor será destinado às obras de sa­ne­a­men­to bá­si­co, tra­ta­men­to de re­sí­du­os só­li­dos e cap­ta­ção de água na região de atingida.

A assessoria da empresa nos informou que no dia 28 de janeiro de 2017, foi aprovado com unanimidade pelas famílias de Bento Rodrigues, em assembleia geral, o projeto urbanístico do novo distrito, que deverá ser entregue à comunidade até março de 2019. Após a aprovação do projeto, a Fundação Renova — criada para conduzir o processo de reparação, mitigação e compensação dos danos gerados — dará continuidade ao processo de reassentamento.

Com a comunidade, é preciso trabalhar as questões específicas de cada família, fazer um plano de atendimento individualizado com base em um levantamento de dados socioeconômicos e de uso e ocupação das propriedades. A melhor forma para concluir essa próxima etapa será discutida com a assessoria técnica e a comissão dos impactos.

A tragédia ocasionou a destruição completa das matas ciliares do Rio Doce, a morte de vários animais, principalmente peixes — devido à contaminação e falta de oxigênio — e os cultivos de produtores locais. A ambientalista Juliana Lisita afirma que em longo prazo, o plantio de mudas nativas em toda a margem do curso hídrico ajudaria no processo de auto depuração do mesmo e na reconstituição dos nutrientes do solo. Mas ainda assim, é indiscutível a enorme perda ambiental.

Estudos sobre a contaminação da água estão sendo realizados e o Greenpeace alerta que os altos índices de Ferro e Manganês podem ocasionar intoxicação ao longo do tempo, com graves consequências para a saúde da população. “A pergunta que fica é quem irá provar daqui a vinte anos, quando as pessoas começarem a ter sintomas de intoxicação, que foram Vale e BHP as culpadas? Por isso, essas análises devem ser feitas agora, e a empresa deve criar métodos para limpar a água do Rio e analisar ao longo do tempo os níveis de agentes tóxicos para alertar as pessoas, que no momento possuem pouca informação sobre os reais riscos de uso da água do Rio Doce e de poços”, pontua o Greenpeace.

(Foto: Ramon Lisboa / Correio Braziliense)

Amanda Almeida, 22, estudante de psicologia e natural de Mariana, expõe a situação do seu ponto de vista: “Primeiro: muitas pessoas acham que a tragédia foi no município. Não foi. Foi em um distrito. E apesar de ter sido muito triste, a Samarco arcou com todos que perderam a casa e tudo que tinham. Tudo que é mudança afeta muito na vida do indivíduo, ainda mais com algo tão trágico. Uma história foi destruída por causa de uma empresa.” ressalta. Segundo Amanda, a maioria dos afetados eram pessoas humildes, que já não possuíam muito e que se fossem pessoas mais bem informadas, a história seria outra: “Acho que a discussão que tem que ser feita nesse caso é o que a Samarco está fazendo, colocando debaixo dos panos e “subornando” as pessoas que já tinham pouco. Para que assim eles não os processem (o que deveria ser feito), como não sabem dos seus direitos, aceitam… Por “ignorância” da população, eles não foram muito afetados no sentido da coisa e do pensamento humilde. Mas na verdade, nos direitos morais e humanos, eles foram muito afetados e não tem ciência disso. Se for pensar na saúde psíquica do indivíduo, eles estão até bem, manipulados, mas bem”, completa.

Segundo análise da economista Rosalva Flores, a economia local sofreu sérios prejuízos principalmente nas atividades pesqueiras, prejuízos também na agricultura e no turismo, aumento nos gastos domésticos e perda da autonomia financeira (ou dependência da Samarco), ampliação dos conflitos entre vizinhos e parentes, prejuízo no comércio, no lazer comunitário, endividamento, abalo emocional, impactos na saúde e reparação ainda longe de ser obtida. Consequentemente, alguns municípios afetados sofreram com o aumento das taxas de desemprego (até 25% maior) gerado pela paralisação das atividades da Samarco. No entanto, a Fundação Renova se comprometeu a priorizar a mão de obra local na reconstrução de Bento Rodrigues, o que pode gerar cerca de 6 mil novos empregos.

Não se pode mensurar o saldo total da tragédia, mas espera-se que os responsáveis consigam devolver às vítimas e localidades atingidas condições para seguir em frente o mais rápido possível, e que no futuro as marcas da lama estejam presentes apenas como uma memória triste.

--

--