Cachaça de Paraty: tradição secular atrai turistas e conquista com sabor único
Além das belas paisagens, o município oferece variedade do produto que há cerca de 400 anos movimenta a economia local
Daniela Nogueira e João Victor Tavares
Estrada estreita, curvas fechadas, subidas e decidas na serra. O caminho para se chegar a Paraty, cidade histórica do Rio de Janeiro, não é considerado longo, mas propõe desafios até mesmo para motoristas experientes. Com uma densidade populacional de apenas 43 habitantes por quilômetro quadrado, o município fluminense se assemelha bastante a uma vila. Crianças esperam o ônibus escolar. Casas à beira da estrada. A fauna e a flora ainda gigantes em comparação a população que ali habita.
Em seus 350 anos de história, Paraty tem a economia ligada, principalmente, ao turismo. Alguns comerciantes da região atribuem 90% do lucro aos visitantes da cidade. Paulistas, mineiros e muitos europeus desembarcam na cidade em busca de conhecimento e tranquilidade.
Além das paisagens exuberantes e belas praias, Paraty oferece ainda várias opções de lazer cultural durante todo o ano, como programas de música, teatro e fotografia. O grande destaque ocorre no mês de agosto com o Festival da Cachaça de Paraty. Criado em 1982, o evento tem como objetivo movimentar a cidade durante o período considerado baixa temporada para o turismo.
A Cachaça de Paraty é reconhecida nacional e internacionalmente. A qualidade da aguardente da cidade chama a atenção de leigos e especialistas na bebida, que comparecem anualmente ao festival para degustar as novidades do segmento. A cidade já contou com cerca de 100 alambiques ao longo dos anos de 1700. Hoje sete cachaçarias funcionam no município.
Da tradição às inovações
Logo na entrada de Paraty, na estrada que liga a cidade ao município paulista de Penha, avistamos o restaurante e destilaria Engenho D’Ouro, uma jovem empresa que vem se destacando na fabricação do produto. Fundada por Francisco Carneiro em parceria com o filho em 2000, a cachaçaria teve início como um hobby, mas despertou a atenção dos consumidores e se tornou rapidamente conhecida na região.
Quem nos conta essa história é Adriano César, atual gerente do alambique e da loja que expõe os produtos fabricados. Segundo ele, a produção é totalmente orgânica e livre de agrotóxicos. “A gente aproveita o próprio bagaço da cana, a sobra da moagem, o vinhoto, que é a sobra da destilação, e isso tudo vira fertilizante. Então é um processo natural. O processo começa no canavial, são sete hectares de cana. Isso proporciona uma produção anual em torno de 18 mil litros. É tudo aqui dentro do sítio”, explica Adriano.
O grande diferencial da cachaça produzida em Paraty é seu sabor único. A “Azuladinha”, por exemplo, é destilada da tangerina e dificilmente será encontrada em outra região do Brasil. A “Caramelada”, feita com melaço de cana e gengibre, e a “Gabriela”, com melado, cravo e canela, são as preferidas dos visitantes, sendo os carros-chefes das cachaçarias da cidade.
“A cachaça de Paraty é muito tradicional, tem uma qualidade reconhecida mundo afora e nós temos o primeiro selo de procedência do Brasil. São 450 anos de tradição, de famílias, as pessoas vem pra Paraty por causa da cachaça”, conta Luiz Fernando Barreira, proprietário de uma loja especializada. Para manter o selo de Indicação de Procedência, os alambiques precisam seguir as técnicas de plantio, incluir medidas de redução dos impactos ambientais, além de estarem atentos ao corte da cana e o período adequado para moagem. Tudo isso precisa ser confirmado por meio de relatórios anuais que passam sob a fiscalização do Conselho Regulador da Associação dos Amigos e Produtores de Cachaça de Paraty (Apacap).
A loja recebe visitação diária de vários turistas interessados na riqueza e sabor da pinga de Paraty. Durante a visita da reportagem, uma caravana de visitantes da Alemanha se deliciou com as bebidas produzidas no alambique. Andreia se interessou pela variedade de bebidas que a cachaçaria apresenta. “Eu já visitei Paraty há uns 15 anos, gostei e quis vir de novo. Acho muito legal, porque a gente pode experimentar e aprender um pouco. O envelhecimento em barril nacional, madeira francesa, acho interessante”, explicou a alemã.
A importância do turismo é unanimidade na fala dos produtores. Tauan Ferreira Rodrigues, 35 anos, é responsável pelo alambique da Cachaça Paratiana. Com produção de 60 mil litros por ano, alguns produtos da marca já foram levados para festivais no exterior, como é o caso da “Mulatinha”, premiada em evento em Berlim, na Alemanha, neste ano. “Aqui em Paraty praticamente 90% da renda da cidade vem do turismo e isso não deixa de ser diferente na venda das cachaças. Existem sete alambiques aqui e várias cachaçarias no centro histórico. Desses alambiques, quatro tem visitação com loja o que ajuda a girar bastante o nosso produto. Como o produto é de qualidade então acaba sendo fácil vencer. Mas vendemos muito para fora também, exportamos pra outros países e estados”, explica orgulhoso.
Em Paraty por causa da paisagem exuberante, praias e ilhas, Katia Killen, 27, também da Alemanha, disse ter adorado as cachaças saborizadas e pretende voltar. “Minha mãe vai me visitar aqui no Brasil e vou trazer ela para Paraty, e eu vou, com certeza, levá-la para experimentar todos esses sabores de cachaça”, afirmou animada.