“Pecado Mortal”: ainda dá tempo de aproveitar a melhor trama da TV

Já se passaram 15capítulos e a novela é a melhor em produção atualmente. É um pecado a audiência não corresponder

Bruno Viterbo
5 min readOct 16, 2013

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Cada vez mais tenho certeza de que “Pecado Mortal” é a melhor novela já produzida pela Record em quase 10 anos, desde a retomada da produção em 2004 com “A Escrava Isaura”. E digo mais: é a melhor novela atualmente na TV brasileira. Sem exageros.

Num passado não tão distante, confesso, jamais imaginaria dizer isso de uma novela da Record. Todos sabem que a Rede Globo criou um padrão de excelência que nenhuma emissora chega perto. Evidente, a qualidade chega quando se tem grana para bancar uma produção. Na Record, apesar das demissões recentes e da reestruturação da emissora, dinheiro também não é um problema grave. Mas o que ainda habitava meus pensamentos — e o pensamento da maioria — é que novela da Record é “ruim”. Só por ser da Record.

Não é de hoje que a emissora da Barra Funda aposta em grandes produções. A trilogia de “Os Mutantes”, apesar do gosto questionável, obteve bons índices de audiência com um investimento alto. “Prova de Amor”, “Cidadão Brasileiro”, “Vidas Opostas” e “Poder Paralelo” foram bons exemplos tanto de produção quanto de história. Apesar de ainda não atingirem um padrão de qualidade — o status quo — instaurado pela Globo, essas novelas marcaram pela tentativa de entregar um produto para um telespectador que não é tão exigente. Pelo menos até agora.

“Pecado Mortal” atinge o ápice da produção de dramaturgia da Record. Se a serie “José do Egito” recebeu altos investimentos, a produção bíblica peca (sem trocadilhos) pelo texto didático demais. E olha que a Bíblia tem ótimas histórias. Esse didatismo acaba por passar a imagem de “doutrinação” e aí toda aquela produção requintada vai por água abaixo. Por outro lado, “Pecado Mortal” alia alto investimento com um texto matador, mesmo que ainda não atinja o “padrão Globo”. Carlos Lombardi tem nas mãos uma história afiada, ambientada num período pouco retratado em nossa teledramaturgia — o jogo do bicho e o tráfico na década de 1970 —, um texto fluído, com tiradas que arrancam risos (entendeu, Walcyr?) e cenas de ação que, é bom dizer, a Record sabe fazer muito bem. A direção de Alexandre Avancini também é correta, e o ritmo da trama é ágil. Pelo menos até agora, nenhum capítulo passou sem acontecer algo de importante na trama. Aliás, “Pecado Mortal” sim, tem ritmo de seriado (entendeu, Wolf Maya?).

Enquanto isso, as globais miram e acertam na mesmice ou na canastrice. “Amor à Vida” continua sem pé nem cabeça, com situações que faltam o bom senso — desisti de assistir e não me arrependo. “Sangue Bom” é uma novela correta, com alguns arroubos de criatividade textual, mas nada que faça a audiência vibrar como em “Cheias de Charme”, o último sucesso das 7. “Joia Rara” é a melhor novela global em produção, como já disse por aqui. Mas o texto e a história repleta de clichês — ainda que bem escritos — não fazem a audiência se empolgar e nem criticar.

Um autor ex-global era o que faltava à teledramaturgia da Record. Mesmo que Lauro Cesar Muniz tenha saído da Globo e ido para a emissora muito antes de Carlos Lombardi, a idade (e o esquecimento, o que é triste) pesam. Mas é bom deixar claro: Lauro fez ótimas novelas na Record (“Cidadão Brasileiro” e “Poder Paralelo”) e um dos maiores fracassos (“Máscaras”, que derrubou toda a programação da emissora). Por outro lado, Lombardi tem ainda a aura de um autor “descolado”, com novelas mais divertidas (“Uga-Uga”, “Kubanacan”) e com apelo sensual. A ida para a Record foi uma escolha sensata. Foi a oportunidade que o autor teve para mostrar que não é um autor só de “comédias com descamisados”. O drama e os ganchos de “Pecado Mortal” são muito bem desenhados.

Porém, “Pecado Mortal” padece da sempre constante falta de planejamento da emissora. “Dona Xepa”, novela anterior, entregou com índices baixos. O programa anterior (CSI de alguma cidade americana) entrega também com baixa audiência. A trama vem mantendo entre 5e 8 pontos, longe das expectativas da Record — e das minhas — e longe dos investimentos da emissora. Os públicos de cada atração são totalmente diferentes, o que prejudica a novela. O que vem depois da novela também não é grande coisa, salvo às terças com o “Aprendiz” (que não atrai tanto público, mas é um programa interessante). Nos outros dias, é um “Deus dará”: às segundas uma reprise da serie “A Lei e o Crime”; às quartas e quintas, sessão de filmes (às vezes bons, às vezes ruins) e às sextas, o “Câmera Record”, que mesmo não sendo um programa ruim, é uma sexta feira, dia de menor audiência. Complicado para uma novela segurar o público.

Isso só corrobora a máxima: cinema é do diretor, série é do produtor e telenovela é do autor. De nada adianta uma super produção sem uma história e textos de qualidade. A novela ainda falha por alguns exageros, como a trilha incidental num tom acima e algumas cenas de ação, que de tão tensas, acabam por ficar pesadas demais. A emissora também não tem uma programação que sustente. Mas esses pecados estão perdoados. Então, caro telespectador, deixe o preconceito de lado (que vocês tanto criticam em “Amor à Vida”) e assistam “Pecado Mortal”.

Junto a um elenco competente, com personagens bem construídos e bem interpretados, “Pecado Mortal” é o tiro certeiro da Record. Só falta o público perceber isso.

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Bruno Viterbo

Redator, às vezes fotógrafo (como na foto ao lado) e às vezes jornalista. Mas sempre encontrando tempo para assistir alguma coisa (boa) na TV.