O que os dados dizem sobre o Bolsa Família e o auxílio emergencial no Nordeste e no RN

Maranhão tem o maior aumento de número de famílias com ambos benefícios*

Jefferson Tafarel
Potydados
6 min readAug 12, 2020

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Jefferson Tafarel e Marcos Pinto

O número de famílias que receberam o Auxílio Emergencial e o Bolsa Família cresceu no Nordeste, entre abril e maio. Foto: Reprodução/Pixabay

Os três meses iniciais do recebimento do auxílio emergencial, em conjunto com o subsídio do programa Bolsa Família, tiveram um alcance expressivo nas famílias dos estados da região Nordeste. No Rio Grande do Norte, apesar de a maior parte do total recebido ficar concentrado nos grandes centros urbanos, a quantidade de famílias que receberam a ajuda financeira durante a pandemia e tinham direito ao Bolsa Família aumentou entre abril e maio. Esse mesmo fenômeno também aconteceu na maioria dos estados nordestinos, como mostram os gráficos ao longo da matéria.

Cristiane, mãe de três filhos e desempregada há quatro anos, se inclui entre as mães de centenas de milhares de famílias assistidas pelas duas fontes de renda. Ela afirma que está conseguindo se manter durante a crise do Covid-19 graças ao pagamento do Bolsa Família e do auxílio do governo, pago aos que ficaram sem renda durante a pandemia.

“Esse auxílio veio como uma certeza que não vai faltar o pão na mesa, o arroz e feijão no prato”, relata a moradora de 35 anos da cidade de Natal/RN, que chegou a trabalhar como auxiliar de classe.

Na maioria dos estados do Nordeste houve um crescimento superior do total dos valores dos benefícios a nível nacional, de abril a maio. O RN ficou de fora desse conjunto, com variação de 0,06%. Em todo o país, o aumento do total distribuído foi de 0,16%. Entre os que tiverem esse aumento acima do Brasil como um todo, Maranhão teve uma elevação muito mais alta do que todos os estados nordestinos e em relação a variação percentual nacional.

Especialmente em relação à quantidade de famílias atendidas nos meses de abril e maio e em comparação com o Brasil, as variações percentuais de alguns estados, incluindo o RN, ficaram menores: em todo os estados e Distrito Federal, o aumento de total de famílias foi de 0,38%. Bahia, por exemplo, foi um dos estados que ficaram com crescimento próximo desse valor.

Em junho, o Brasil teve crescimento de 0,11% em ambas as variáveis. Quase todos os estados da região Nordeste ficaram com um acréscimo percentual menor. Porém, o Rio Grande do Norte teve aumento de 0,12% no valor total do pagamento do auxílio emergencial para os beneficiários do programa. Alagoas ficou com o mesmo resultado no número de famílias.

Já com os números do Bolsa Família nesses três meses, a quantidade de pessoas que recebeu somente por meio do programa, sem ser assistida pelo auxílio durante a pandemia, diminuiu, assim como o valor total por estado só pelo programa assistencial, de abril a junho. A diminuição em quase todos os estados do Nordeste foi maior que os números do Brasil no geral.

A agência Fiquem Sabendo conseguiu, através da Lei de Acesso à Informação (LAI), acesso a esses e a outros dados de todos os municípios do país, inclusive da quantidade de famílias que receberam apenas o Bolsa Família ou os dois benefícios, de abril a junho deste ano. É possível identificar, por exemplo, as cidades onde apenas uma ou nenhuma família não receberam o auxílio, mas continuou recebendo o Bolsa Família — nenhum estado do Nordeste se encontra sob essa condição nesse período.

Sobre o RN

Em média, cada família que recebeu o auxílio e que já recebia o dinheiro do programa em abril acrescentou a sua renda 1128 reais, um valor significativamente maior que o salário mínimo em vigor atualmente. Já em maio e em junho, esse valor diminuiu um pouco, para cerca de 1126, como consequência do aumento do número de famílias beneficiadas e do total distribuído. Ainda assim, permaneceu maior que um salário mínimo.

Observe, por exemplo, que as regiões em torno de Natal e Mossoró estão em verde: são as cidades onde os valores totais são mais altos.

Considerando somente o Bolsa Família, cada família em abril recebeu em média R$ 150. No mês seguinte, seguindo a tendência dos outros estados da região, esse valor chegou a 159 reais; em junho R$ 154, aproximadamente. Além disso, o Rio Grande do Norte foi onde ocorreu o maior aumento percentual, levando em conta apenas os lares assistidos pelo programa: 5,8%, frente a um aumento de 1% levando em conta toda o Nordeste, apenas entre abril e maio. Mais abaixo, estão os números dos outros estados da região sobre o Bolsa Família.

Em relação ao total por municípios, houve um aumento no total distribuído em ambas as rendas pagas pelo Governo. Quando se analisa a variação somente da programa assistencial, sem o benefício distribuído durante a pandemia, essa quantidade vem diminuindo de abril a junho.

Nordeste: divergências e extremos

Maranhão teve um aumento muito acentuado, como se pode notar nos gráficos, superando todos os outros estados da região em relação ao total de famílias beneficiadas e de valores distribuídos a lares com direito ao auxílio emergencial, somente em abril e maio. Inclusive em relação aos números somente do Bolsa Família, neste mesmo período: o estado teve redução acima de 10% em relação aos número de famílias que só receberam esse benefício no mês de maio e, consequentemente, também do valor total por município.

Para visualizar a versão completa do infográfico acima, clique aqui.

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Como se vê, Pernambuco se isola como o estado que não seguiu a tendência de aumento de famílias que receberam o auxílio emergencial e que são atendidas pelo Bolsa Família. Mesmo no valor médio distribuído por família pelo programa, ele também foi o único que apresentou redução no período, como pode ser visto no gráfico logo abaixo.

Em relação aos números de junho, o destaque é o estado de Alagoas, cuja variação percentual supera os outros da região Nordeste. Ainda sobre este mês, é possível observar que as variações percentuais começam a chegar a um patamar parecido, o que indica que a quantidade de pessoas beneficiadas começa a ficar constante.

Vários fatores podem explicar os motivos que provocam essas diferenças: desde a população, poder aquisitivo das famílias, a questões propriamente geográficas de cada estado. Os valores do auxílio emergencial, por variarem de acordo com a condição familiar (se só há um pai ou uma mãe por família, por exemplo) também podem causar divergências nos totais por estado.

Para entender melhor a situação do Nordeste e do recebimento desses benefícios pelas famílias potiguares, o Potydados entrevistou Daisy Nascimento Pereira, mestra em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Quando observado o valor total que foi recebido para as famílias beneficiadas com ambos os programas no RN, observa-se que a média ficou em torno de 2,38 milhões de reais, entre abril e junho. Muitas cidades de fora dos grandes centros urbanos (oeste, em Mossoró e leste, em Natal) ficaram abaixo dessa média: no total, somam 134. O que explica essa concentração de distribuição?

A priori, acredito que a concentração de benefícios em Natal e Mossoró se deve a densidade demográfica. Como a população é maior, a tendência é verificarmos a existência de um número maior de benefícios concedidos. Outra possível causa pode ser a existência de muitas famílias em situação de pobreza e extrema pobreza. A terceira causa [talvez] possa estar relacionada [ao crescimento da] taxa de desemprego, que foi maior com a pandemia nestas cidades.

Dois estados apresentam números muito divergentes nos meses de abril e maio, na região Nordeste: Maranhão e Pernambuco. Por que em Pernambuco tem uma tendência de diminuição da quantidade de pessoas que recebem auxílio emergencial e bolsa família? E por que o contrário acontece com Maranhão?

Acredito que a resposta pode estar relacionada ao formato das famílias. Como sabemos duas modalidades de benefícios foram concedidas a de R$ 1200 e a de R$ 600 reais. Talvez entre abril e maio, ocorreu uma mudança no perfil dos demandantes e/ou um tipo de benefício foi mais concedido do que outro. Novamente é importante analisar o volume de gastos em termos per capita, como também em termo de número de benefício concedido.

*Atualizado às 0h04, do dia 19/08/2020, para inclusão dos dados do mês de junho. As famílias com ambos os benefícios são aquelas que eram assistidas pelo Bolsa Família e passaram a receber apenas o auxílio emergencial.

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Jefferson Tafarel
Potydados

Jornalista. Brinca com Python e explora bases de dados públicas de vez em quando, expondo suas investigações por aqui. Gosta de gatos e alho-poró.