De volta para o passado

Bruno Barbieri
Pra ler e ouvir
Published in
3 min readAug 6, 2014

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Pra ler ouvindo: Good Riddance (Time of your life) - Green Day.

Quando eu tinha sete anos de idade o meu filme preferido era o "De volta para o futuro". Toda semana eu fazia manha na locadora pra minha mãe alugar a fita e ainda lembro dele passando “pela primeira vez na televisão” pelo menos umas cinco vezes. Mas diferente de todos meus amigos, eu não queria ser o McFly que tinha o skate que voava, fazia incríveis solos de guitarra e dirigia o Deloreon.

Eu queria ser o cientista maluco. Queria inventar uma máquina do tempo e ter um laboratório todo bagunçado só pra mim. Eu queria tanto ser o Doutor Brown que sempre que tomava banho e vestia minha "roupa de sair", eu corria pro meu pai e gritava: Pai!! Arrupia, pai!! Mais arrupiado, pai! Mais! Mais! E isso, na língua de um menino de 7 anos significa: Pai, por favor, usa seu gel pra arrepiar meu cabelo.

O sonho de menino continuou até que as aulas de física e química apareceram no colégio. Daí eu percebi que ser cientista era bem mais difícil do que eu esperava. E como todo adolescente preguiçoso, resolvi escolher uma profissão bem mais fácil, fui estudar pra virar publicitário. Pelo menos ainda dá pra inventar alguma coisa fazendo isso, né? — foi o que eu perguntei pro meu orientador profissional.

No mês passado, alguns anos mais velho, eu me peguei no meio de uma madrugada de trabalho, olhando pra uma página em branco no Word tentando ter alguma ideia que prestasse. Tava difícil, viu. Resolvi então colocar meu fone de ouvido, apertar o botão do shuffle do Mp3 player e dar uma chance pro destino escolher a música que me traria a tal da ideia genial.

Ele começou a tocar músicas que eu não esperava. Comecei a rir. Mas a cada música que ele tocava eu lembrava de alguma coisa, de alguma pessoa, de várias pessoas. Eu fui parar em lugares estranhos. Lugares que eu já tinha até esquecido que existiam. Era como se eu estivesse vivendo aquilo. As vezes até o cheiro do lugar eu sentia.

Quando tocou Mr. Jones, eu fui parar no meu antigo quarto com um armário cheio de adesivos de banda enquanto assistia o Disk MTV com a Sabrina Parlatore. Ah, Sabrina!

Com Cheia de Manias (sim, eu tenho Mp3 do Raça Negra) eu voltei a ter nove anos e lembrei do dia que puxei a saia da minha mãe e disse: Mãe, eu quero a fita da música do motelzinho de aniversário.

Read My Mind do Killers me fez lembrar da época em que eu sabia ler pensamentos.

Nosso Sonho do Claudinho e Bucheca me levou pros bailinhos no pátio da Escola Estadual Júlio Ribeiro.

Great Expectations fez meu coração acelerar, a mão tremer e mais uma vez, fez eu me apaixonar.

A sirene de Praise You do FatBoy Slim, me fez dar gargalhadas de um amigo tentando fazer a dança do clipe no meio do corredor de um hotel barato.

Com o Green Day eu me vi escrevendo uma música no guardanapo da cantina e ainda senti o cheiro do cabelo da Michele da oitava C.

Miss Alissa me fez lembrar dos tubinhos de Jägermeister, mas só dos tubinhos porque o que acontecia depois deles é quase impossível.

She’s Got Issue do Offspring me levou pras aulas de laboratório onde finalmente eu entendi o que estava acontecendo: eu estava viajando no tempo.

E foi assim que vinte e três anos depois, eu consegui realizar meu sonho. Eu não precisei aprender química quântica, escrever nenhuma tese e nem virar cientista maluco. No meio da madrugada, eu simplesmente apertei um botão e pronto. Eu descobri um jeito de viajar no tempo. E mais do que isso, meio que sem querer, eu realizei o sonho do menino do cabelo arrupiado.

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