VERDADE OU MENTIRA?
Pra ler ouvindo: Rancid — Evil is my friend.
Todo mundo vive por aí dizendo que é sincero, não mente pra ninguém e quer ouvir só a verdade dos amigos. Mas como já diz aquele sábio estêncil perto do Metrô Vila Madalena: “A verdade é que você mente todo dia.” Não adianta negar.
Começando pela resposta do clássico: “Tudo bem com você?” que ninguém tem coragem de dizer como está de verdade. Também não é fácil dizer a verdade quando uma amiga pergunta se está gorda. Muito menos dizer pro seu melhor amigo que você prefere dormir do que sair pra tomar cerveja com ele.
O fato é que dizer a verdade é bem mais difícil do que você imagina, pelo simples fato de ninguém querer ouvir a verdade. Ninguém! E o resultado disso? É viver nesse mundo cheio de mentiras que as redes sociais só deixaram mais fácil da gente perceber. Ou você acha que aquela sua amiga que aparece todo dia com um vestido novo, linda e sorrindo no seu Instagram é feliz o tempo inteiro? Tá, eu não vou afirmar nada por ela, mas eu sei que nem eu e nem o Wander Wildner conseguimos ser alegre o tempo inteiro.
Todo mundo posta foto de noite na balada abraçando os amigos, mas nunca a foto da manhã seguinte abraçado com o vaso. Sem falar da foto da gatinha que pegou na balada, mas nunca da cara dela sem maquiagem no dia seguinte. Mas eu entendo todo mundo. É muito difícil escolher entre a mentira e a verdade. Eu diria até que é uma escolha totalmente desleal.
A mentira não tem olheira e nem espinha na cara. Sempre veste preto para esconder a barriga, salto alto e sutiã de bojo. Tem cabelo liso como se fosse japonês, peito grande e nunca brochou. Passa toda noite rodeada de amigos bonitos e a cada fim de semana vê o pôr-do-sol de um lugar diferente. Além de tudo isso, ela ainda sabe dizer qualquer coisa sem machucar ninguém.
Enquanto a verdade, coitadinha da verdade. Ela tá sempre com a cara lavada. Tem tanta olheira que assusta quando aparece. Isso quando não chega dando voadora na porta. Tem barriga de chopp, espinha nas costas e adora vestir moletom. Não costuma ir muito aos eventos noturnos, mas é sempre a primeira a aparecer nas manhãs seguintes acompanhada da sua melhor amiga Ressaca. Sonha em viajar, mas prefere passar os fins de semana embaixo da coberta abraçada a um pote de sorvete de flocos.
Eu disse, uma escolha totalmente desleal.
Mas sempre que eu falo sobre isso, eu lembro de um cara chamado Henry Chinasky. Mentira! Esse é só o pseudônimo dele, o nome correto é Charles Bukowski. Um escritor que aos 10 anos de idade voltou da escola em uma sexta-feira com uma tarefa simples: ir até ao Desfile de Independência na manhã seguinte e fazer uma redação sobre o evento. Ele, ao contrario, foi andar de bicicleta com os amigos. Voltou pra casa naquela noite e escreveu uma redação lembrando de todos os desfiles que tinha visto na TV e a entregou pra professora na segunda. Na manhã seguinte, o menino recebeu a nota da redação: A+. No fim da aula foi chamado pra conversar com a professora que perguntou, sem rodeios, se ele tinha inventado tudo aquilo. O menino tremendo de nervoso não conseguiu continuar com aquela mentira e disse olhando para o chão que tinha inventado tudo aquilo. A professora não se aguentou de felicidade e disse: “Isso só torna sua redação ainda mais maravilhosa. Parabéns!”
E foi naquele dia, voltando pra casa com apenas 10 anos que ele entendeu algo que eu demorei um punhado a mais de anos pra entender: “Era isso que eles queriam: mentiras. Mentiras maravilhosas. Era disso que eles precisavam!”
E essa, infelizmente, é a mais pura verdade.