Reportagem | O apoio emocional como estímulo para a saúde

Wesley Loebens
Precisamos falar sobre a vida
4 min readDec 11, 2017
Imagem ilustrativa / arquivo internet

Cintia*, 43 anos, atentou contra a própria vida aos 27. A história teve início na manhã de 10 de setembro de 2001, nas ruas do Centro de Porto Alegre. Uma súbita hemorragia gástrica a levou para uma longa internação, com muita perda de peso. Como consequências disso vieram a síndrome do pânico e o medo: das pessoas, de sair do quarto, de seguir em frente.

Conversamos com Cintia, para entender como funciona a reabilitação após situações extremas. Com um ânimo que contrasta com o peso da história, ela nos conta como superou essa fase delicada. Apesar de muitos grupos de ajuda e rodas de conversa, a saída foi o tratamento psiquiátrico aconselhado pela família. Principalmente pela irmã.

“A síndrome do pânico traz um sentimento de incapacidade total. Você fica dependente das pessoas que estão ao seu redor, e existe uma cobrança da sociedade para que você fique bem logo. A solução do fim é atraente”, conta Cintia.

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Em 2002, em casa, a jovem não suportou a pressão, novamente por não acreditar na cura da hemorragia. De volta ao hospital, ela foi encaminhada para um psiquiatra, onde iniciou um novo tratamento. Após ter a medicação ajustada, Cintia passou para um quadro de melhora, mas nunca abandonou o atendimento médico. “Tive acompanhamento de dois profissionais, um psicólogo e um psiquiatra. Meu melhor resultado foi com o psiquiatra, que foi quem entrou com a medicação. O psicólogo tentou mexer com sentimentos em um momento de muita fragilidade. Foi difícil”.

No início de 2017, 15 anos após o início do tratamento, Cintia suspendeu a medicação sob orientação médica. Ela destacou que, sem o apoio familiar, nada disso teria sido possível.

A psicóloga Claudilene Basei conta que, nessas situações, a primeira coisa que deve ser feita é buscar um especialista para uma avaliação e diagnóstico. Caso necessário, ele encaminhará o paciente ao psiquiatra, para eventual uso de medicação.

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Em geral, as pessoas buscam o atendimento psicológico apenas quando estão lidando com algum problema. Basei afirma que, além de combater os sintomas das doenças mentais, o tratamento terapêutico também proporciona autoconhecimento e melhor autoaceitação, e isso resulta na tranquilidade para enfrentar desafios.

“O processo terapêutico oferece a possibilidade de rever velhos padrões, estabelecer novos objetivos, desenvolver novas habilidades, e consequentemente, criar condições para relacionamentos mais saudáveis”.

Outra opção de apoio emocional é o Centro de Valorização da Vida (CVV). A população pode entrar em contato com a ONG através do celular, chamadas via Skype, conversas pelo chat ou envio de e-mail. Em todos os canais de comunicação há voluntários prestando serviço de acolhimento 24 horas por dia.

Atualmente, o CVV possui 80 postos de atendimento em 18 estados brasileiros e no Distrito Federal. As ligações podem ser feitas através do número 188 de forma gratuita e anônima. Até 30 de setembro de 2017, apenas o Rio Grande do Sul tinha o serviço de ligação sem custo. A partir desta data, o Ministério da Saúde assinou um convênio para torná-la gratuita em todo território nacional. A expectativa é que até 2020 todas as cidades possam contar com o atendimento pelo 188.

Anildo Fernandes, membro do Centro de Valorização da Vida (CVV). Foto: Michele Mueller

O Centro de Valorização da Vida não se considera assistencialista, mas um programa que preza pela escuta compreensiva. O voluntário não pode criticar, aconselhar ou desvalorizar a dor do outro, ele deve apenas ouvir. “A sociedade não tem tempo, não dá atenção e não ouve o próximo. As pessoas só querem falar sobre suas tristezas e alegrias sem serem julgadas, mas infelizmente isso não acontece”, ressalta o Porta Voz do CVV Anildo Fernandes.

Os postos organizam grupos para prestar apoio. O GASS é o Grupo de Apoio aos Sobreviventes de Suicídio — sejam sobreviventes de si ou familiares que tiveram a experiência. Nos encontros, eles podem desabafar, exteriorizar as culpas e falar sobre as motivações do ato. Já o GAP é o Grupo de Apoio às Perdas e nessas reuniões é possível falar sobre as diversas perdas ao longo da vida: emprego, família, amigos e outras.

Segundo um levantamento da Organização Mundial da Saúde, nove em cada 10 suicídios poderiam ser evitados. Para prevenir e evitar, o CVV também realiza palestras em empresas, escolas, universidades e instituições religiosas. “Quando nós conversamos com uma pessoa que está em ideação suicida e falamos dos meios de prevenção, nós estamos canalizando essa pessoa para que ela tenha uma sobrevida. O errado é usar aqueles velhos tabus, como: quem se mata não dá sinal. Quem pensa em se matar ou que se matou deu muitos sinais”, finaliza Anildo.

SERVIÇO

Novo Hamburgo
Grupo de Apoio aos Sobreviventes de Suicídio
Encontros: primeira e terceira terça-feira de cada mês
Horário: 19h30 às 21h30
Local: Rodoviária Normélio Stabel, Sala da Administração.

Grupo de Apoio as Perdas
Encontros: primeira e terceira quarta-feira de cada mês
Horário: 19h30 às 21h30
Local: Rodoviária Normélio Stabel, Sala da Administração.

Porto Alegre
Grupo de Apoio aos Sobreviventes de Suicídio
Encontros: primeiras quintas-feiras de cada mês
Horário: 15h às 17h
Local: Avenida José Alencar, 414, Sala 2015

Em caso de auxílio:
CVV (Centro de Valorização da Vida) — telefone 188 (ligação gratuita) para o Estado do Rio Grande do Sul e 141 (custo de uma ligação local) para todo o território nacional. Pelo site www.cvv.org.br, via chat ou Skype.
O atendimento pessoal é realizado nas unidades do CVV em horário comercial.
CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) mais próximo.

Emergência:
Unidades Básicas de Saúde, Unidades de Pronto Atendimento, Pronto Socorros, Hospitais, SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Emergência) pelo telefone 192.

  • Cíntia preferiu não se identificar durante a entrevista.

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