Deixando o ego de lado para avançar em UX Writing

Tamíz Freitas
Pretux
Published in
5 min readFeb 22, 2021

Não importa qual é o seu background na produção de conteúdo: basta aterrissar no UX Writing para perceber que priorizar o contexto do usuário é fundamental na escrita voltada à experiência. Como colocar isso em prática? Pesquisando!

Cena do filme “A Chegada”, quando a linguista Louise Banks se comunica com alienígenas (Sony Pictures Entertainment)

Neste artigo, compartilharei o conhecimento aprendido durante o Bootcamp de UX Writing, ministrado por Bruno Rodrigues e promovido pela How Bootcamps, em dezembro de 2020. Minha participação no curso se deu graças a uma bolsa, viabilizada pela Comunidade PretUX, à qual sou grata pela oportunidade.

O Bootcamp se dividiu em três pilares: Usabilidade de Texto, Semântica e Arquitetura da Informação. Neste artigo, destacarei os pontos relacionados à Semântica e sua contribuição para a Escrita Orientada à Experiência do Usuário (UX Writing). Mas antes, gostaria de colocar alguns enunciados que podem ser úteis ao preparo do terreno para a discussão:

  • UX Writing tem a ver com objetividade e pressupõe (além de concisão e clareza): utilidade e orientação;
  • De 2014 para cá, vivemos a era da ferocidade no consumo da informação e as pessoas têm priorizado o acesso direto aos dados para terem mais tempo livre e consumirem outros dados;
  • Não existe receita de bolo e o contexto sempre será decisivo na criação de conteúdo para um determinado público.

Semântica é o ramo da Linguística que se interessa pelo significado das palavras, frases e outras formas de comunicação. Conhecer os termos mais utilizados pelo público é um dos caminhos para o sucesso de UX Writing numa aplicação. Entender como o usuário se comunica rende insights valiosos ao UX Writer e, logicamente, ao negócio. Traçando um paralelo com o filmeA Chegada”, de Denis Villeneuve: foi necessário à linguista Louise Blanks imergir no contexto dos alienígenas, descobrindo sua linguagem, para que então pudesse entender qual o propósito da visita inesperada ao planeta Terra.

No cenário da informação para mídias digitais, Bruno Rodrigues defende que as definições de Semântica e UX Writing são idênticas:

Screenshot da aula 03 do curso

Para mergulhar nesse universo — por sinal, uma notória demonstração de empatia e de Design Centrado no Usuário — , todo o material semântico recebido dos públicos é levado em consideração. Atenção total a:

  • E-mails;
  • Interações nas Redes Sociais da empresa;
  • WhatsApp;
  • Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC);
  • Outros.

O que importa é entender a persona da marca ou do produto e ver quais são os termos mais utilizados por ela ao opinar sobre aqueles. Não é sobre o UX Writer ou a empresa entender o que é colocado nos componentes. Por isso, é válido o exercício de dar um descanso no ego do profissional, pois ganha-se mais ouvindo dos usuários do que opinando sobre a melhor opção com base em achismos. Aí é que entra a beleza do negócio, pois UX Writing sem a parte de Research perde sua potencialidade. Pesquisar, pesquisar e pesquisar mais um pouco: essa não é só a rotina do UX Researcher, mas também do UX Writer.

Pescaria Semântica

O método apresentado por Bruno Rodrigues, em uma das aulas do Bootcamp, tem o intuito de propiciar um momento para a entrevista do público, para coletar frases, palavras e expressões usadas ao se referir a um produto ou marca. Os resultados da pesquisa servem para a construção do Dicionário de Vocabulário Controlado e do Manual de Padronização da empresa que, ladeados pelo Manual de Tom e Voz, guiarão a atualização ou a construção de novos componentes, considerando o contexto do usuário em todo o processo. É importante ressaltar que tanto o Dicionário quanto o Manual não são documentos estáticos e precisam ser atualizados, uma vez que as pessoas também atualizam o modo de se referir às coisas. Não há uma recorrência definida, mas é preciso atentar às mudanças dentro e fora da empresa, pesquisar novamente e aplicar as atualizações.

PNGTree

Hora da pescaria

A partir da escuta com o grupo, criar uma lista de palavras e expressões negativas (a serem evitadas), positivas (a serem adotadas) e neutras (alternativa ao termo negativo). A criação dos verbetes no Dicionário de Vocabulário Controlado dependerá desses resultados.

  • Objetivo: escutar e anotar termos mais utilizados pelos usuários;
  • Duração: entre 1h-1h30;
  • Público: cinco a sete pessoas, todas responderão a três perguntas (uma de topo, uma de meio e uma de fundo de funil);
  • Se for fazer mais de três perguntas: separá-las nas categorias acima, de modo a direcionar o objetivo da escuta, deixando as questões mais importantes para o final;
  • Não anotar as opiniões: o que interessa é saber se as pessoas usam determinada palavra de forma negativa ou positiva;
  • O ideal é gravar para ficar atento aos detalhes da dinâmica in loco;
  • Gírias e expressões regionais entram nas negativas e não servem de base para representar o público em sua totalidade, pois não há garantia de que todos as compreendem.

Na prática…

Coca-Cola Journey México

Foi proposto o exercício de nos entrevistarmos e coletarmos as palavras e expressões mais usadas sobre as Bebidas da Coca-Cola. As perguntas, previamente informadas pelo professor, foram:

Em que momentos você costuma tomar bebidas da Coca-Cola? (topo)

De que bebidas da Coca-Cola que você gosta e de quais você não gosta? (meio)

Se a Coca-Cola fosse lançar uma bebida com um novo sabor, qual seria? (fim)

Em aproximadamente 15 minutos de dinâmica, os termos encontrados pela equipe foram esses:

Posteriormente, definimos cada um dos verbetes no Dicionário de Vocabulário Controlado:

  • Normal → Sabor tradicional do principal refrigerante da marca;
  • “Comer fora” → eventos casuais ou festivos mais propícios para o consumo das bebidas;
  • “Muito doce” → excesso de açúcar;
  • Enjoativa → sabor desagradável ao paladar;
  • Adoçada → palavra escolhida pelos pesquisadores, no sentido de fugir do teor negativo implícito no termo “açúcar”.

Manual de Padronização

A Pescaria Semântica também gera insumos para o Manual de Padronização que, segundo Bruno Rodrigues, deve orientar a escrita dos componentes a partir de cada produto digital da empresa. Por exemplo: No aplicativo X, tais palavras podem ser utilizadas no botão para estimular a compra. Não devem ser usados os termos Y e Z.

Ele pode ser publicado como:

  • Parte 2 do Manual de Tom e Voz;
  • Capítulo do Design System;
  • Documento à parte.

“UX Writing é pensar em detalhe” — Bruno Rodrigues

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Tamíz Freitas
Pretux
Writer for

Apaixonada por Comunicação (línguas, culturas e sotaques), é formada em Jornalismo e estuda UX Writing.