Mas afinal, o que é ser uma liderança de design?

Jaqueline Rodrigues Damazio
Pretux
Published in
8 min readJul 16, 2021

“Não será confortável” — Anderson Gomes, na Aula 1 de Design Leadership.

O que faz o ato de liderar design ser diferente de outras áreas? Na prática, nada.

Assim começa o bootcamp de UX Design Leadership, oferecido pela HOW Bootcamps e ministrado pelo Anderson Gomes, head de design da plataforma de cursos Hotmart, e com apoio da comunidade Pretux no final de maio. Aqui, trago minha experiência acerca dos conteúdos ministrados no curso.

Fonte: Women Of Color In Tech

Segundo Anderson, não se tem uma característica em especial que vai definir a liderança em design. Assim como liderar negócios ou tecnologia — para citar área correlata, o designer que se propõe a ser líder absorve as mesmas fontes. Esse é o momento de se fazer as devidas contextualizações para o design desses mesmos conteúdos e entender se o seu papel é de gerenciar ou liderar.

Gerenciar é manter as coisas como estão em seu pleno funcionamento; liderar promove mudanças, atrai pessoas para uma direção. E o que pode promover mais mudanças do que a essência do design de projetar futuros possíveis? Neste momento, liderança e design se cruzam. Além de conseguir entender profundamente o problema com uma percepção sistêmica, o líder em design precisa ser um bom ouvinte (escuta ativa, estar presente naquele momento), se fazer entender (comunicação fácil), ter na manga soluções realmente validadas e poder replicar estas soluções para mais pessoas. Tá, mas é aí que tá: será que eu tenho capacidade real disso?

Lead Yourself

Na aula 1, começamos pelo conceito de liderar nós mesmos. Bem, mas o que isso quer dizer? A partir de alguns exercícios individuais, estabelecemos nossos propósitos e porquês através da dualidade Visão de Vida X Visão de Trabalho. Resumidamente, para avançar a jornada profissional e tornar-se uma liderança, essas duas visões precisam conversar e serem realistas com o que tu acredita e que faça sentido. E, por fim, marcar quais habilidades de liderança que eu via em mim mesma e como os outros me viam. Aqui, o primeiro desconforto: confirmar as leader skills na vida real colhendo feedbacks com quem já tinha trabalhado comigo em algum momento.

Obter esses feedbacks me deu um certo receio por ouvir/ler críticas, mas o show tem que continuar e receber críticas poderiam me ajudar futuramente visto que tinha acabado de virar UX designer nível pleno e estava assumindo mais responsabilidade no âmbito profissional. Conforme as instruções do Anderson, criei um formulário de feedback pessoal e mandei para cerca de 11 pessoas que trabalharam diretamente comigo, seja em trabalho CLT, freelancer ou projetos voluntários. 11 pessoas que não teriam amarras pra dizer tanto coisas boas ou ruins.

Feedbacks coletados durante a primeira semana do bootcamp Design Leadership

A surpresa? Foi bem equilibrado. No geral, não sou vista como alguém que impõe medo ou organizada — essa pesou bastante pois ainda tenho a melhorar — mas não deixaram de dizer que sou inspiradora e consigo cativar e engajar as pessoas, além de ser uma pessoa criativa e de iniciativa. E claro que mais uns puxões de orelha: ter mais confiança nos outros, ser transparente sobre prazos a cumprir e o que realmente consigo fazer sem precisar assumir toda e qualquer função.

Lead Around

É chegada a aula 2. Já definimos quem somos enquanto profissionais e coletamos feedbacks para compreender como somos vistos profissionalmente. Agora é hora de colocar em prática para trabalharmos com o que temos: hora de fazer escolhas, estabelecer prioridades e definir qual será a estratégia a ser usada para liderar design.

Para começo de conversa, definir uma estratégia é uma série de escolhas. Até quando você não tem uma estratégia, isso acaba sendo uma escolha. Também é entender o que dá certo e o que realmente funciona e o que tu tem a oferecer para o mundo.

Para manter focos específicos em projetos de design que exijam uma liderança, aplica-se o conceito de ROI (sigla em inglês para Retorno Sobre o Investimento): quanto de energia gasta para determinadas atividades. Neste caso, o que dá retorno em energia física, intelectual e emocional. E adivinha? A parte mais difícil da liderança é ter a tal da inteligência emocional. Pensando de forma sistêmica, o Roi of Energy se dará pela relação entre o engajamento gerado por determinada tarefa e a real energia gasta ao realizá-la.

Tendo real noção do que você tem de bom para oferecer ao mundo e do quanto de energia e engajamento despende em cada trabalho, atenção às prioridades. Ao estabelecer prioridades, o designer-líder-em-potencial começa com esse checklist:

  • Saber dizer não
  • Manter alguns focos
  • Pegar um problema a ser resolvido que será o teu PROJETO DE LIDERANÇA

O projeto de liderança deve ter mensurado o tempo de execução, tipo de equipe envolvida, responsabilidades, parâmetros de sucesso e contrapartidas. Para defendê-lo e conseguir desenvolver o projeto, será a hora de exercer a liderança e brigar pelo projeto.

Brigar no sentido metafórico da palavra, pois o que de fato o líder de design irá fazer consiste em desde tomar decisões racionais, conseguir pessoas que realmente acreditam no projeto (evangelistas) até ser o melhor vendedor do projeto e compartilhar oportunidades através da liderança do projeto ou organizando um evento.

Exercício de Projeto de Liderança, feito durante o Design Leaderhip
  • How Successful People Lead, livro primordial citado pelo Anderson Gomes que, em uma leitura rápida, ilustrou as principais características e modus operandi de pessoas em cargos de liderança.

Tem o projeto de liderança, os insumos, as pessoas e com quem dialogar para fazer acontecer? Agora é hora de negociar.

“Negotiate!”

Como “vender o peixe” para executivos ou outros líderes que serão capazes de investir em seu projeto de liderança? O ato de negociar é a capacidade de passar o seu ponto de vista. Sempre é bom ter em mente que nem sempre uma negociação é uma disputa — ou pode ser uma facilitação. Mas primeiro vamos por partes.

Na negociação, é necessário ceder algo de ambas as partes. O que você está disposto a ceder? Nesse momento é importante retomar o que acontecerá ao alcançar ou não os resultados de seu projeto. Mas para alcançar o seu resultado, qual sua abordagem ao negociar?

No livro “Negocie com Qualquer Pessoa”, Eduardo Ferraz define os seguintes estilos de negociador:

  • Competitivo
  • Cooperante
  • Impaciente
  • Perfeccionista
  • Sedutor

Na vida pessoal ou no âmbito profissional, as pessoas podem exercer somente um estilo de negociador ou combinar mais de um estilo — até mesmo emular um perfil de negociador diferente conforme a necessidade. Nesse momento, é interessante ter alguns trunfos para poder fazer a negociação de um projeto: será a expertise de mercado? Alguma habilidade especial? Ou uma proposta melhor que o padrão de mercado?

Como dito anteriormente, a negociação pode virar uma facilitação. Enquanto que a negociação se chega em um acordo e mantém uma estrutura de convencimento em uma estrutura hierárquica, a facilitação é horizontal (de igual para igual) e gera consenso além de envolver dinâmicas que vão exigir uma certa neutralidade.

Basicamente, facilitar muda o lugar-comum do problema para que a solução seja encontrada em conjunto com aqueles que tenham os conhecimentos que vão ajudar. Até a facilitação precisa ser negociada — pelo menos a sua participação. Sendo o designer um praticante da escuta ativa e também conhecedor de métodos de facilitação como Design Sprint, ele delimita as regras para poder promover a escuta de vários lados e gerar mudanças. Ou seja, fazendo metadesign ao projetar uma dinâmica a ser facilitada.

https://brasil.uxdesign.cc/google-design-sprint-como-funciona-e-como-aplicar-no-seu-projeto-279107363659

Promovendo o design

Definidos o projeto de liderança, habilidades de negociação/facilitação envolvidas e também a estratégia adotada, como o líder de design vai trazer de fato o design para o negócio que está inserido?

A cultura de design é projetada a partir do estado atual de uma equipe de design para o estado ideal. Pode ser uma consequência da maturidade de design dentro da empresa ou realmente projetada — criando mais maturidade a partir da construção de visão. Sendo assim, é relevante identificar o nível de maturidade onde está a empresa.

Qual o nível de maturidade na empresa que você trabalha? Fonte: Gabriel Silvestri.

Tendo em mente essa maturidade, se constrói a visão de design da equipe. A visão é um conjunto de propósitos, crenças, objetivos a alcançar, quais papéis necessários para que a visão seja de fato possível e métricas.

Começa-se a exigir do líder de design funções mais complexas e difíceis como saber gerir fazendo intersecção entre negócios, as necessidades de usuários e tecnologia. Sim, tecnologia pois não se lidera somente designer mas também desenvolvedores. Pois, afinal, o design é só uma das suas habilidades especiais para resolver problemas de todo e qualquer tipo independente da área.

Com base na visão de design pretendida, começa a parte gestora ao alocar seus designers: ter uma visão sistêmica de onde estão os designers e onde faltam designers, além de detalhar cargos e senioridades em cada equipe ou produto em que se esteja alocado. E também compreender onde se encontram, nessa visão, os profissionais, focando em escalabilidade, isto é, criar ferramentas para outros designers trabalharem (como profissionais de Design Ops, por exemplo).

E com base nessa gestão, saber liderar ao contratar pessoas que compartilhem das mesmas crenças e que vão somar ao crescimento da maturidade de design da empresa — e consequentemente performance. Praticar não somente a escuta ativa para compreender as respostas de possíveis contratados, mas também a forma como as respostas são dadas. Isto por si só já gera recursos para decisões de contratação.

O bootcamp Design Leadership da How te capacita para, mesmo sem estar em em uma posição de liderança, aplicar conceitos de liderança em conjunto com as ferramentas e pensamentos de design para poder ter voz ativa para defender seus projetos e — consequentemente — seus usuários.

Por fim, uma indagação do bootcamp é real: nem você nem eu somos designers, mas estamos designers. O design é apenas uma grande funcionalidade do seu cinto de habilidades. O conhecimento para se poder liderar não está em eventos de design mas também em outras áreas que sejam pertinentes para exercer o seu papel de líder/facilitador/negociador/projetor de futuros possíveis. Até logo.

https://brasil.uxdesign.cc/fazendo-a-transi%C3%A7%C3%A3o-entre-um-cargo-de-designer-e-l%C3%ADder-de-design-9886b03d029

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Jaqueline Rodrigues Damazio
Pretux
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Uma pessoa que produz e se retroalimenta de criatividade. Designer visual generalista com foco em digital. linkedin.com/in/jqrd/