Por que devemos saber como priorizar produtos?

No dia a dia, atuando na área de produto, de vez em quando me pego pensando: por que os produtos falham? Por que aquele produto super revolucionário não conseguiu entregar o que prometia? E por que esse mesmo produto não conseguiu durar tanto? Você também pensa nisso? Pois chega aqui, puxe uma cadeira e vamos conversar.

Paulo Henrique
Pretux
10 min readMay 5, 2022

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Pra cego ver: Sala de reunião com cinco mulheres debatendo alguma pauta (Foto: Tachina Lee)

Por que os produtos falham?

"95% dos novos produtos introduzidos no mercado falham."
Harvard Business School

Muitas vezes nos deparamos com uma ideia incrivelmente inovadora ou um produto que promete revolucionar o mercado atendendo a todas as expectativas dos clientes. Mas, muitas vezes, também percebemos que esses produtos não duram o suficiente ou que nem chegam a durar. O que ocorre para que isso aconteça? E o que ocorre para que isso aconteça com bastante frequência? Provavelmente não vamos ter uma resposta 100% certa, mas umas das coisas que impactam na vida dos produtos e faz esse cenário ser mais possível de ocorrer é o próprio FOCO.

Mas foco em que? Numa feature? Numa necessidade? No mercado? Quando um produto inovador surge há uma certa expectativa e necessidade de colocá-lo no mercado e tentar expandir ao máximo. Acontece que esse movimento acelerado acaba "atropelando" o que devia ser um desenvolvimento saudável daquele produto e, ao invés de focar em resolver o problema (aquele que era o objetivo inovador inicial), as equipes ficam mais focadas na execução do produto. Seja apostando em ideias disruptivas ou em features que irão facilitar a vida do usuário.

"Grande parte do desafio de inovação é descobrir o problema que precisa de solução."
Scott Berkun

Diante desse cenário, as empresas acabam buscando um problema para solução, em vez de direcionar todas as energias para encontrar o problema primeiro antes de qualquer solução. Nessas circunstâncias, etapas importantes que auxiliam na descoberta do problema, como uma boa pesquisa em UX (ux research), descoberta de produto, entre outros métodos, muitas vezes são ignorados ou não recebem a importância ideal, deixando um gap para encontrar o verdadeiro problema.

Por não ter o entendimento adequado do problema, outras informações e verdades acabam sendo aplicadas, seja uma opinião de alguém mais antigo na empresa(como um CEO), seja a opinião da equipe de tecnologia, seja a opinião do mercado que diz que aquilo vai ser um sucesso ou qualquer outra que não condiz com o problema que devia ser priorizado.

A partir disso, fica difícil conseguir ter um objetivo e determinar qual caminho o produto deve seguir ou qual funcionalidade será introduzida. Devido a essa confusão o produto final aquele que chega nas mãos dos usuários, não é o que era prometido e muito menos aquele que conseguiria resolver o problema. Tudo isso acaba gerando diretamente uma forte influência na vida útil do produto.

Por que priorizar é importante?

Porque é através da priorização que é possível alocar e utilizar seus recursos de forma otimizada em um FOCO específico, proporcionando um melhor resultado para sua empresa. Através da priorização você evita desperdícios tanto de dinheiro, como também de tempo, além de evitar deixar equipes desmotivadas por trabalhar em algo que não gerou o devido valor.

A priorização deve vir após haver insumos suficientes acerca da descoberta do problema. Com a definição adequada do problema fica bem mais fácil priorizar uma tarefa ou funcionalidade e permitir que o produto final consiga atender as necessidades do usuário.

Priorizar não é algo fácil, mas também não é impossível. Durante esse processo você pode evitar algumas armadilhas, para que sua priorização consiga cumprir o seu objetivo, são elas:

  • Não priorize com base no que seus concorrentes estão fazendo;
  • Não priorize com base nas solicitações de setores internos (ex: equipe de vendas e etc);
  • Não priorize só pensando no que é fácil;
  • Não priorize apenas com base no seu instinto.

E então, como realizar uma priorização?

A priorização de produtos possui uma gama de variados recursos e métodos que auxiliam durante todo o processo, mas a utilização de cada um vai depender da necessidade e da realidade de cada produto ou projeto que está sendo desenvolvido. Vale ressaltar que é comum a prática de juntar ou utilizar mais de um método na priorização, claro dependendo de cada cenário. A priorização é um processo que deve ser realizado em equipe, já que o desenvolvimento do produto costuma envolver várias equipes desde a descoberta até a concepção do mesmo.

Então, com esse entendimento, podemos conhecer alguns métodos de priorização que podem ajudar no dia a dia de quem trabalha com produtos:

Matriz GUT

A Matriz GUT é uma ferramenta que ajuda na priorização das resoluções dos problemas, que foi criada por Charles H. Kepner e Benjamin B. Tregoe, especialistas em resolução de questões organizacionais.

A matriz tem como base 3 critérios, são eles:

  • Gravidade: responsável por avaliar o impacto ou intensidade que o problema pode gerar caso não seja solucionado.
  • Urgência: esse critério leva em consideração o prazo que aquele problema precisa ser resolvido, ou seja, quanto mais rápido um problema necessita ser solucionado mais urgente ele é.
  • Tendência: enquanto a tendência está relacionada ao padrão de evolução do problema, isto é, se o mesmo não for resolvido logo, a tendência é que ele piore aos poucos ou rapidamente?
Imagem exibindo a Matriz G.U.T e seus elementos (Material adaptado do curso de Priorização de Produtos)

Para poder utilizar a matriz é preciso utilizar uma escala de 1 a 5, onde quanto mais próximo ao 1 menor a necessidade de atenção aquele problema e enquanto mais próximo do 5 maior prioridade de atenção. Cada um dos critérios recebe uma frase de apoio de acordo com a pontuação, conforme imagem abaixo:

Imagem exibindo a pontuação em escala da Matriz G.U.T e seus elementos (Material adaptado do curso de Priorização de Produtos)

Vamos pegar como exemplo a Netflix e alguns problemas fictícios e aplicá-los em na matriz:

Imagem exibindo uma Matriz G.U.T preenchida

Matriz de Eisenhower

Essa matriz também é conhecida como matriz de urgência/importância, tem esse nome devido ao 34º presidente dos Estados Unidos, Dwight D. Eisenhower, considerado na sua época como um profissional com altos níveis de produtividade. A ferramenta é mais uma forma de auxiliar na priorização de tarefas.

Imagem exibindo a Matriz de Eisenhower e seus quadrantes (Material adaptado do curso de Priorização de Produtos)

Para utilizar a matriz é necessário posicionar as tarefas a partir de cada eixo e em quadrante relacionados, mas antes de realizar esse processo é preciso entender primeiro a diferença entre os eixos: importante e urgente.

  • Importante: diz respeito as tarefas relacionadas à objetivos ou metas;
  • Urgente: são tarefas que tem um prazo definido, ou "deadline";

O nível de importância e urgência fica maior para cada tarefa quando posicionada nos extremos de cada eixo. Continuando com o exemplo da Netflix, pode-se ter esse cenário:

Imagem exibindo a Matriz Eisenhower prenchida

É importante que a matriz seja sempre atualizada para que tarefas antigas sejam concluídas e que novas tarefas possam entrar.

Método MoSCoW

É um framework de priorização de features que foi criada por Dai Clegg enquanto trabalhava na Oracle. Sendo utilizado frequentemente em ambientes que aplicam metodologias ágeis, mas também pode ser utilizado em gestão de negócios, gestão de projetos entre outros.

  • Must Have (Tenho que fazer): aqui são determinadas as necessidades que são obrigatórias (não negociáveis) para aquele projeto, produto ou serviço.
  • Should Have (Devo fazer): aqui já são definidas as necessidades que são importantes, mas não vitais para o produto.
  • Could Have (Poderia fazer): são as necessidades altamente desejáveis, mas que acabam não sendo priorizadas devido a restrições, seja de tempo ou recursos;
  • Won’t Have (Não vou fazer): são as necessidades menos desejáveis e/ou menos críticas, são aquelas do tipo "Gostaria de ter".
Imagem exibindo o método MoSCoW e seus quadrantes (Material adaptado do curso de Priorização de Produtos)

O método MoSCoW é bem similar a Matriz Eisenhower e segue a mesma lógica para distribuição das necessidades do produto por quadrante. O diferencial para preenchimento seria já possuir um levantamento de requisitos e a equipe está familiarizada tecnicamente a respeito das necessidades. As regras da MoSCoW tendem a ser subjetivas e se não houver uma colaboração do time para isso a priorização não terá tanta precisão.

Matriz Esforço X Impacto

Apresentando mais uma matriz de priorização de tarefas, a origem dessa ferramenta é desconhecida, mas ela é bastante associada e utilizada no Lean Six Sigma. Nessa matriz as tarefas são posicionadas em dois eixos: vertical e horizontal. A vertical diz respeito ao impacto que aquela tarefa pode causar e o horizontal ao esforço, tempo, recurso que é necessário para executar tal tarefa. Além dos eixos, existem 4 quadrantes relacionados diretamente com os mesmos.

Imagem exibindo a Matriz Esforço X Impacto e seus quadrantes e eixos (Material adaptado do curso de Priorização de Produtos)
  • Quadrante I (Ver e Agir): designado a tarefas que geram mais resultados com menor esforço;
  • Quadrante II (Complexos): para tarefas que possuem uma execução mais difícil e exigem disciplina, melhorias constantes e paciência para serem concluídas.
  • Quadrante III (Prioritários): normalmente é atribuído para tarefas simples que exigem pouco esforço, mas que os resultados gerados costumam ser baixos.
  • Quadrante IV (Descartar): é o local para aquelas tarefas que requerem bastante energia e não trazem nenhum resultado para a organização, ou seja, são aquelas tarefas que costumam desestimular as equipes.

É uma ferramenta semelhante as outras de gestão de tempo por possui a possibilidade de medir o tempo desprendido na execução de uma tarefa acaba se aplicando com bastante aderência ao desenvolvimento de produtos.

RICE

Muitas das ferramentas apresentadas anteriormente são apropriadas para uso individual ou squads ou exigem uma visão holística reduzida para aplicação. Diante disso, nos ambientes organizacionais quando se faz necessário envolver um maior número de pessoas ou envolver mais setores para priorização de determinados projetos ou tarefas, pode ser utilizada a matriz RICE.

A matriz consiste num método de priorização com maior capacidade analítica e menos intuitividade. Ela utiliza de 04 (quatro) elementos que são posicionados por prioridade, são eles:

  • Reach (Alcance): esse elemento tem como objetivo avaliar quantas pessoas podem ser atingidas pelo projeto em um determinado período de tempo;
  • Impact (Impacto): já esse elemento busca fazer uma avaliação do impacto que será sentido por um indivíduo. E normalmente é utilizada a escala para conseguir quantificar esse impacto: 3 para impacto muito grande; 2 para impacto grande; 1 para impacto médio; 0.5 para impacto pequeno e 0.25 para impacto mínimo;
  • Confidence (Confiança): esse elemento diz respeito a forma como medir o nível de confiança quando se estima que um projeto vai ser grandioso ou que vai dar certo. O quão certo você está da veracidade de suas estimativas para esse projeto? É utilizada a seguinte tabela para calcular a confiança: 100% para alta confiança; 80% para confiança média e 50% para confiança baixa;
  • Effort (Esforço): nesse último elemento é medido o esforço do time e/ou integrantes para execução da tarefa/projeto. A unidade usada para medida desse elemento é a "pessoa-mês", ou seja, o trabalho que o membro de um time pode fazer em um mês.

Uma vez que todos esses elementos foram estimados basta realizar um cálculo onde se multiplicam Alcance, Impacto, Confiança e se divide pelo Esforço, ou seja, (Alcance X Impacto X Confiança) / Esforço que acaba gerando a pontuação RICE, conforme exemplo abaixo:

Imagem exibindo a Matriz RICE preenchida (Material adaptado do curso de Priorização de Produtos)

Matriz B.A.S.I.C.O

A matriz básico também tem uma abrangência parecida com a ferramenta RICE sendo aplicada na gestão de projetos e quando é necessário a participação de várias equipes e áreas.

Nessa ferramenta são utilizados 6 (seis) critérios:

  • B (benefícios para a organização): diz respeito ao impacto que uma determinada solução tem para os resultados dos processos;
  • A (abrangência dos resultados): já esse item demonstra o total de colaboradores da empresa que serão beneficiados com as melhorias dos projetos;
  • S (satisfação interna dos funcionários): enquanto esse é sobre o grau de satisfação que é gerado nos colaboradores,
  • I (investimento necessário): considera o quanto de recursos que serão necessários para as melhorias;
  • C (cliente externo (grau impacto)): compreende os impactos que as melhorias geradas nos processos terão em relação ao cliente externo;
  • O (operacionalização (grau de facilidade)): significa a maneira como uma determinada melhoria será aplicada
Imagem exibindo a Matriz B.A.S.I.C.O e seus elementos (Material adaptado do curso de Priorização de Produtos)

Outros Métodos de Priorização

  • DIBB
  • Matriz de Possibilidade X Impacto;
  • Modelo Kano;
  • Modo Waze;
  • RACI;

Como fazer uma boa priorização?

Mesmo com todas essas ferramentas e métodos apresentados, é importante lembrar que a priorização é, na prática, uma facilitação de times onde se deve tentar alinhar expectativas, manter o grupo envolvido, prezar pela escuta ativa, e realizar a mediação de conflitos. Para realizar uma boa priorização você deve ter:

  • Um objetivo bem definido, um caminho que se deve seguir;
  • Saber dizer não e decidir o que será feito;
  • Entender as ferramentas e saber qual e quando usar;
  • Não se apegar as ideias e soluções e escutar os seus clientes;
  • Saber negociar, facilitar e alinhar com os seus stakeholders.

A priorização de produtos vai te trazer foco e um objetivo para ser seguido durante o desenvolvimento do seu produto. Na prática você vai decidir o que fazer e também o que não fazer e isso pode trazer uma estrutura e uma base sólida para que seu produto não falhe.

Recomendações

Este artigo foi resultado do aprendizado desenvolvido no curso Priorização de Produtos com a instrutora Yasmin Conolly e que foi promovido pela How Edu. A participação nesse curso foi possível graças à iniciativa PretUX (uma comunidade preta única, maravilhosa e incrível) juntamente com a parceria da How Edu. Fica aqui meu agradecimento gigante pela oportunidade.

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Paulo Henrique
Pretux
Writer for

Product Designer, Tech, Nerd, Pernambucano e Curioso.