programação suspensa no ar ✺ semana 7
Reflexão 1 (o momento de perigo)
por Eugênio Lima
O neoliberalismo/necroliberalismo, um sistema que sempre operou com um aparato de cálculo, revela outra face ainda mais terrível: o que é mais importante, a economia ou a vida? “Precisamos cuidar da saúde das empresas”.
Em meio a pandemia da Covid-19, a necropolítica segue operando de maneira global para decidir quem tem direito à vida. O dilema segue… é preciso definir quem não tem valor e pode ser descartado. E, diante disso, outra questão surge: o que fazer com aqueles que decidimos não ter valor? Essa pergunta, é claro, sempre afeta as mesmas raças, as mesmas classes sociais e os mesmos gêneros. Vivemos um tempo no qual a soberania estatal é, em última instância, a soberania da morte?
O Brasil — do ponto de vista estatal –, neste momento, talvez seja o lugar onde este falso dilema esteja mais presente no dia a dia. Aqui é o dínamo mundial da negação da pandemia e, portanto, da vida — posição que é compartilhada por uma parcela da população que finge não ver as consequências nefastas dos seus desejos de consumo e do seu senso de oportunidade. Aqui, tem gente que vem a público dizer que agora é o momento propício para investir na bolsa, tamanha é a oportunidade que a crise propicia para os mais “ousados”, ou seja, é um ótimo momento para ganhar dinheiro com a morte dos outros.
O colapso no sistema de saúde é uma oportunidade. Estamos diante de um quadro muito sombrio do descaso criminoso de um governo pelo seu povo.
Sendo assim, no tempo que nos toca viver proponho uma reflexão:
Quanto tempo demoraria para pronunciar o nome de todas as pessoas que se foram na pandemia? Quanto demoraria para lembrar que todas elas tinham história e que eram agentes ativas do mundo dos vivos? E se, junto a elas, como disse Achille Mbembe no seu artigo “O direito universal à respiração”, somássemos todas as pessoas mortas pela aids, cólera, malária, Ebola, Nipah, febre amarela, Zika, chikunguya e outras pandemias mundiais que durante séculos devastaram povos sem nome em terras remotas?
E depois desta crise, vamos voltar a como éramos antes?
Durante a pandemia ter um ponto vista sobre a história é sobretudo olhar o nosso tempo a partir de um instante de perigo.
E com certeza estamos neste exato momento.