Não liderar não é uma opção

Programador Sincero
Programador Sincero
5 min readSep 23, 2016

A não-ação também é uma ação. A não-escolha também é uma escolha. Não liderar é o mesmo que ser liderado por um bosta. Você quer mesmo que isso aconteça com você?

Quando eu quis entrar para a área de programação, sempre tive muito medo. Medo de não conseguir entregar, medo de não conseguir entender o que precisa ser feito, medo de não conseguir aprender as coisas e principalmente, medo de ser mandado embora por qualquer problema.

Este medo fez com que eu desde cedo estudasse muito. Muito mesmo. Muitas páginas de livros por mês. Milhares de páginas de livros técnicos por ano. Graças a algumas sortes que tive, pude usufruir de acesso a cursos e material didático de excelente qualidade. Mas mesmo assim. Tive que estudar muito. E assim tem sido até hoje.

O grande problema é que com o tempo eu fui ganhando uma boa bagagem técnica. Fui me tornando um excelente técnico. E tendo atuando em papéis fundamentais para colocar projetos no ar, consegui subir até que rapidamente a cargos de “sênior”. Aliás, minha carteira de trabalho tem uma anotação de Analista de Sistemas Sênior com pouco mais de 2 anos de profissão (uma palhaçada, mas é o mercado! rs).

Com o tempo e com as diversas mudanças de empresas, adquiri ainda mais experiência e conhecimentos técnicos que me permitem dizer hoje em dia que sou um profissional de nível alto. E esta posição tem sempre dois lados: um lado bom, que é questão de salários e oportunidades bacanas e o lado ruim que é justamente, a expectativa extremamente alta que os contratantes têm ao meu respeito. Exatamente meus caros. O cara que me contrata hoje pensa que eu sou o filho da puta que vai resolver todos os problemas dele.

Entretanto, com o passar do tempo e minha idade um pouco maior, eu comecei a reparar muitos padrões no mercado. As empresas geralmente têm os mesmos problemas. Prazos zoados, gerentes incompetentes e times de merda. É foda. É quase sempre a mesma história. A empresa esperta contrata um sênior e espera que ele resolva todos os malditos problemas do time, das entregas, da integração contínua, da qualidade e o caralho. Então, o que acontece é que eu, assim como muitos de vocês, acabei sendo considerado um “líder” apenas porque eu trabalhei em muitos projetos e ganhei muita experiência. Mas, como eu já efetivamente liderei projetos e equipes, vi que o desgaste é incrível. E há algum tempo, ao participar de processos seletivos diversos, comecei a dizer coisas como:

Não quero ser líder. Só quero programar.

Ao dizer isso em entrevistas, acabei causando espanto em muitos processos seletivos. Ouvi frases como:

O quê????? Você não tem interesse em liderança de equipes? Não tem vontade de “crescer”? Você quer tudo isso “só” para programar?

E de fato eu sustentei a minha posição e mesmo assim acabei conseguindo os empregos com o salário que eu tava pedindo. Que legal né? Infelizmente, não.

No primeiro emprego que eu teoricamente só tinha que programar, caí numa maldita empresa GPTW e fui enganado no processo seletivo. Tenho muitas coisas pra contar sobre como é trabalhar nessas empresa que parecem ser legais pra caralho mas são uma grande farsa. Me fudi e graças a Deus fui demitido e saí com algum dinheiro. Depois conto com todos os detalhes do mundo —esta empresa, que está sempre contratando, é grande, é famosa e se finge ser jovem é uma desgraça na terra!

No segundo emprego, também disse que só queria programar e que não tinha vontade ser líder. Aí, efetivamente aconteceu o que eu pedi. Estava indo tudo bem, porque eu estava sendo liderado por caras muito bons e eu finalmente pude ter paz para fazer o que eu realmente amo: programar e criar coisas fodásticas. Tudo estava indo bem até que por forças de mudanças de prioridades do cliente, pegaram os caras bons do meu projeto e colocaram em outras coisas. E este vácuo foi preenchido com…. um filho da puta de merda que colocaram para ser meu líder. Aí fodeu tudo. Como eu havia dito que não queria ser líder, não quiseram me colocar como líder no lugar dos caras, o que de fato, eu não queria até então. E, cumprindo com a porra do combinado, o gestor geral colocou esse moleque para me liderar.

As coisas ficaram foda. Esse moleque deixou o poder subir na cabeça, começou a dizer que o time era “dele”, começou a cagar pela boca dizendo que “eu não preciso de um cara x, y, z” ou “o cara é muito bom, entrega e vale como um sênior para mim” e por aí vai. Chegou ao ponto de querer dizer para mim o que é um sênior, do alto dos seus poucos anos de vida. Além disso, ele pedia as coisas para mim com aquele maldito ar irritante, com aquele verbo um pouco mais no imperativo do que precisava, com aquele pequeno poder saltitando pelas ventas. Além disso, o cara não conseguia tocar nada direito. Não conseguia coordenar o que tinha que coordenar, sequer entendia a complexidade do projeto. Aí fodeu. Agi de forma profissional e comecei a notar a merda que estava fazendo comigo mesmo. Até critiquei para a gerência, até reclamei da situação mas não havia muito o que fazer — pequeno filho da puta já estava anunciado no cliente como gestor do projeto.

Notei que certas coisas não devem ser mudadas e quando mudam, causam distorções na alma e ferem a natureza humana básica. Um irmão mais velho não deve obediência a um irmão mais novo; um pai não deve ser liderado pelos filhos e assim vai. E foi justamente isso que notei: ao abdicar da minha natural posição de liderança, optei por não agir e com isso, dei espaço para algum filho da puta de merda agir no meu lugar e sobre mim. A não-ação foi uma escolha perigosa. E este absurdo de gestão poderia acabar até com a minha saúde. Deixei que a ordem natural das coisas fosse alterada por artificialidades criadas por um gerente de merda.

Portanto meus senhores, tomem muito cuidado ao não querer liderar depois de um certo tempo de estrada. Antes ser um líder bacana e se esforçar bastante do que ser liderado por um zé buceta qualquer e ficar doente, deprimido ou ser forçado a mudar de emprego, como estou fazendo.

PS: na empresa atual onde estou, pagam salário maior (e PLR maior) para quem é gestor. Quem programa se fode muito mais aqui.. Isto significa que para esses otários, não interessa muito ter um programador bom ou ruim. Basta entregar no prazo e sem bugs.

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