Sobre a CLT e a Fila #2

Programador Sincero
Programador Sincero
6 min readMay 6, 2016

No texto passado eu falei sobre a questão da fila para aumentos em empresas que só contratam como CLT. É até meio óbvio que exista esta priorização porque afinal, não existe nenhuma empresa que saia distribuindo aumentos por aí (na verdade sabemos daquela empresa americana né!).

O que ninguém conta é que existe uma segunda fila. A fila dos próximos funcionários a serem demitidos. Embora seja muito bom ser mandado embora de um emprego CLT que pague nem sempre o objetivo é ser mandado embora e ter que começar tudo de novo.

Para cair nessa fila, é simples:

  1. Seja incompetente, mas não a ponto de ter outros caras fazendo o seu trabalho. Seja o atacante com menos gols do campeonato. Mas faça um ou outro gol. Perca o pênalti no momento decisivo. Consiga o ódio da torcida. E peça silêncio da torcida ao fazer um golaço ou fazer um excelente jogo (que não seja decisivo, é claro!). Se você for muito incompetente, será demitido no prazo de experiência. Aí queima a carteira de trabalho. Não seja esse cara.
  2. Seja uma pessoa difícil. Seja agressivo, fale a verdade na cara, seja intolerável com as falhas dos outros, seja cusão de verdade. Seja irritante. Seja aquele cara que todo mundo tem medo quando chega na baia. Seja aquele cara que todos ficam felizes quando entra de férias. Sua vida será curta na empresa. Mas mostre as garras logo. Se você for legal no começo e voltar ao normal depois de 1 ou 2 anos, vão tentar te consertar. À força.
  3. Seja uma pessoa que ganha bem acima da média da empresa. Um dos principais critérios para demitir é o tempo de casa versus salário. Um bom salário por 5 anos acaba meio que inviabilizando uma demissão em alguma “marolinha”. Mas um bom salário, uma competência não-excelente e pouco tempo de casa faz com que o cara vá para primeiro da lista. Aliás, em tempos de crise, você pode até ser um Don Syme ou Eric Leppert que irá para o topo da lista da mesma forma.
  4. Seja um gerente. Se você for como a maioria das pessoas do meu tempo, terá objetivos bacanas. Colocar “Gerente de Contas”, “Gerente de Projetos”, “Gerente de Novos Negócios”, “Coordenador de Desenvolvimento” ou qualquer outra engrandecedora no LinkedIn é sempre um orgulho, sempre um motivo para sorrir. Mas infelizmente, quando você vira gerente, seu salário passa a ser pago pelo salário dos outros que realmente produzem de verdade. Seus relalórios, suas weekly meetings, suas reuniões de status com o cliente e tudo mais não ajudam muito a pescar os peixes quando o barco está no mar e a tripulação está com fome. Pense muito nisso ao buscar ser gerente, coordenador e ou similar. Se for por este caminho, busque ter um capital. Um capital é como algo que você tem de muito valor para a empresa, como por exemplo, conhecimento das regras e segredos de um sistema muito grande, domínio de regras de negócio, capacidade de usar pessoas para criar ou evoluir modelos de negócio lucrativos e por aí vai. Ser um gestor que quando entra em férias nada muda é convite para ser demitido. E digo mais: uma vez sendo gerente, é complicado voltar para a carreira técnica e é mais complicado ainda conseguir emprego como gerente em outro lugar.
  5. Seja uma pessoa com cargo de liderança vindo de fora. Se você entrar numa empresa tendo que liderar um monte de gente que não te conhece, que queria o teu lugar e que ganha menos que você, começará com desvantagem no jogo de ida, aos 30 do primeiro tempo do jogo de volta. Até dá para buscar o empate e ganhar. Mas você precisa fazer gols urgentemente. Tente virar o primeiro tempo com pelo menos 4 a 2. E não tome o quinto gol. As empresa funcionam muito como o futebol, onde a justiça não existe e nem sempre o melhor vence. Pense nisso ao fazer certos movimentos na sua carreira ao mudar de empresas.
  6. Tenha valores diferentes dos da empresa. Este motivo é bem complicado mencionar e quase ninguém fala sobre isso. Mas é fundamental notar que há empresas com pessoas com um tipo de perfil diferente do comum. E este “ser diferente” pode ser fundamental para a sua continuidade ou não dos planos da empresa. Por mais que você seja uma talentosa engenheira, um talentoso faturista, uma excelente DBA ou o que for, para continuar nos planos, você tem que se enquadrar nos padrões de comportamento da empresa. Exemplo: se a política da empresa é trabalhar até mais tarde, você tem que fazer isso. Se a política é sair no horário, igualmente, faça a mesma coisa. Se a política da empresa é falar sobre os subordinados pelas costas, faça a mesma coisa. Se a política da empresa é lidar com suborno a operadores públicos e privados, aja da mesma forma. Se a política da empresa é meritocracia explícita, da mesma forma, evite puxar o saco e trabalhe. O ser humano é “grupista” e busca tanto se enquadrar em algum grupo quanto tenta preservar o grupo ao que já pertence. Se você for a ovelha negra, seus futuro é ou estará limitado na empresa. Aí é preciso avaliar qual é o custo (ético, moral, ou mesmo postural) para se enquadrar.
  7. Seja alvo de inveja. Se você tem um carro melhor do que seus pares (leia-se: chefes, pares e subordinados!) de baia, se mora num lugar melhor, se tem um cônjuge lindo, se tem filhos bonitos, se tem um corpo bacana, se tem aquele brilho no olhar irritante, se tem aquela felicidade inerente às pessoas bem resolvidas e de bem com a vida, se tem aquele Facebook recheado de checkins, presentes, amores e etc… cuidado. Mesmo. Você muito provavelmente estará sendo alvo de pensamentos, conchavos, planos malignos e outros recursos soturnos para ser boicotado/boicotada no seu emprego. É incrível, mas o que mais vemos nas ruas, em todos os tipos de empresas, são pessoas falando que tal pessoa “se acha” ou “ela tem inveja de mim”. E é verdade. Eu já vi isso muitas e muitas vezes. Promoções negadas, projetos chatos, gente bacana e ética sendo esquecida nos almoços… Quem é que não conhece um caso desses? Para evitar este tipo de problema, não adicione gente do seu emprego no facebook, tente baixar o nível das conversas no almoço, não exponha seu mundo interior para ninguém da empresa, tente-se manter na média. Tente. Tente. Tente. Não consigo dizer aqui para não se despersonalizar para baixar o nível e cair no mesmo nível de gente escrota do escritório. Às vezes a sobrevivência depende de “flexibilidade” e de baixa o nível moral para se adequar à cultura da baia, que no fim, é cultura da empresa.
  8. Sua contratação pode ter sido apenas por motivos políticos. Ao mudar de emprego estando empregado em cargos de sênior para cima, tente sentir quais são os reais motivos de tua contratação. Muitas vezes um cara é contratado porque precisa colocar “alguém nessa vaga porque o cliente quer”. Querem alguém minimamente útil para se manter no cargo enquanto o antigo dono da vaga cai para cima. E neste caso, você estará sempre numa grande desvantagem. Se o antigo dono da vaga ainda está por perto, este é um sinal extremo de alerta. Você será sempre comparado com este cara ou com essa ex-gerente... As pessoas irão sempre consultar o antigo ocupante da vaga e seu crescimento profissional estará prejudicado. Lembre-se do post sobre que eu falei sobre a fila das promoções (https://medium.com/programador-sincero/sobre-a-clt-e-a-fila-bf4b142fa08f#.vrnnsql12). Às vezes é mais fácil politicamente colocar um cara de fora no vácuo formado pelas movimentações nas esferas superiores do que simplesmente promover algum cara que esteja na fila. Inclusive, esta prática é tão comum que empresas sérias hoje em dia abrem processo de concorrência interna para vagas novas antes de ir para o mercado. Outro grande problema de ter o ex-dono da vaga por perto é que ele estará usando você para compor o argumento de que “eu fui o melhor cara para esta vaga e, mesmo contratando de fora, não tem ninguém que faça o meu antigo trabalho melhor do que eu. Me aplaudam!”. E muitas vezes os laços de amizade criados por este antigo gestor ou líder podem ser usados para retirar apoio às tuas iniciativas e para te expor ao achincalhe com o objetivo de provar que o cara de fora não serve para nada, que o antigo gestor era bom e principalmente, para provar que há subordinados prontos para pegar a tua cadeira também. Recomendação: NÃO aceite cargos de liderança sem que o antigo líder ou gestor tenha se afastado. NÃO, NÃO E NÃO. Você será demitido em pouco tempo (antes de um ano) e será muito humilhado antes. A não ser, é claro, que você seja um cara que tenha costas quentes e poder suficiente para se manter neste cargo.

Acho que é isso galera!

Abraços

Programador Sincero (programadorsincero@yahoo.com.br).

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