Sobre a minha idade e a minha paciência como programador no Brasil

Programador Sincero
Programador Sincero
4 min readDec 29, 2016

Direto ao ponto. Estou velho e de saco cheio. Não aguento mais fazer trampo de corno. Sério mesmo. Principalmente os trampos do tipo:

  • Montar relatório para um usuário puxando dados de uma base
  • Criar stored procedures
  • Entender procedures dos outros
  • Debugar código alheio
  • Lidar com códigos enormes cheios de ifs e constantes desconhecidas (“código de beneficiário <> 0233”)!!! WTF?
  • Entender javascript criado por losers
  • Escrever validação de forms. Aliás, fazer telinha é um saco
  • Treinar estagiário
  • Treinar juninho
  • Treinar pleninho
  • Aconselhar sênior iniciante

Eu estou com quase 40 anos. Mas mesmo assim, eu sempre venho me atualizando tecnicamente e normalmente estou estudando por volta de 1 hora por dia, todos os malditos dias da minha vida, incluso, sábados e domingos. Eu faço isso por um único motivo: quero lançar meu produto em algum momento de 2017 ou 2018. Mas no Brasil as coisas não são bem assim. Os programadores da minha idade sonham em ser gerentes ou sonham com a suposta estabilidade de algum empreguinho CLT. E esta postura irritante, de buscar a estabilidade, a mesmice e evitar os riscos acaba levando o programador velho a não se atualizar tecnologicamente. Além do cansaço natural da idade, o cara comum se assusta com as tecnologias novas da web, com stacks mais funcionais, com mudanças de paradigmas e tudo mais. Nuvem? Programação funcional? Engenharia de Front-End? Linux? Puta que pariu!

Durante o horário de trabalho eu venho suportando com paciência, durante todos estes anos, a incompetência generalizada do mercado de desenvolvimento de software no Brasil. Os programadores brasileiros são estúpidos em sua vasta maioria. Temos um problema generalizado de QI baixo neste país. Os caras simplesmente não conseguem ter um pensamento mais estruturado e uma organização mental clara o suficiente para que o código represente o que precisa ser feito. O código é sempre um lixo. O que poderia ser feito sem for e if insistentemente ainda é feito assim. O método continua tendo zilhões de linhas. As classes continuam sendo um acúmulo de métodos sem qualquer coesão ou lógica. O pleno desconhecimento de padrões de projetos assusta. O cara sequer consegue modelar uma família de classes usando tipos genéricos. O cara normal vive no copy-and-paste eterno, duplicando o que não precisa e não desacoplando o que precisa ser desacoplado. O que temos? Monolitos surgindo e crescendo sem precisar. E supostos arquitetos suspeitos vendem a ideia de que agora o projeto usa DDD só porque os projetos da solução estão em uma suposta organização que faz lembrar que o livro do Evans disse que é bacana. Um absurdo generalizado.

Em 2016, invariavelmente, a vasta maioria das empresa ainda está produzindo código que já nasce legado. Sem um processo mínimo de TDD, sem proximidade programador / usuário, sem um processo lean de desenvolvimento e sem o menor bom-senso, temos código sendo produzido que já nasce obsoleto e com alta probabilidade de necessitar de suporte caro. Isso sem falar que quase ninguém nas empresas sabe o que é UX. Coisas mínimas como, por exemplo, posicionamento de mensagem de validação na tela simplesmente são desconhecidas pelo homer simpson com uma IDE na mão. É uma situação de descaso geral com a profissão e usuários.

Diante de tudo isso, minha paciência a cada dia que passa diminui. Sei que minhas chances no mercado de trabalho, sendo funcionário/consultor, tendem a cair consideravelmente com o tempo. E isso é uma grande verdade: todo mundo sabe programadores mais velhos são ranzinzas, com menor flexibilidade e principalmente, não se submetem a trabalhos de corno como antigamente. Eu, com minha paciência menor a cada dia, sei que estou nos meus últimos empregos e sei que vou me foder com o tempo se eu não conseguir empreender. E sei que a cada dia que passa eu acabo buscando executar trabalhos “legais”, que sejam efetivamente relevantes para o meu currículo. Estou cada dia mais adepto do CDD (Curriculum-Driven Design) porque eu não suporto mais fazer mais do mesmo. Quando não consigo fazer as coisa que quero, quase sempre mudo de empresa, quase sempre me vejo deprimido e quase sempre fico com ainda mais vontade de empreender.

Infelizmente, ao olhar as vagas de empregos aqui em São Paulo ou mesmo em outras cidades, a situação é triste. É sempre mais do mesmo. É o fdp pedindo um recurso .net sênior com VB.NET ou C#, Web, JS e SQL. Nada de novo. Nada de relevante. Em Java os requerimentos técnicos para as vagas são até melhorzinhos. Mas não muda muito. É o mesmo JBoss, é o mesmo Struts, é o mesmo Spring e o mesmo JPA. Nada de muito interessante. Às vezes pinta uma vaga ou outra em projetos mais modernos de startups (startup não costuma considerar a stack .net para seus projetos né!). Mas em geral é aquele quadro depressivo. Ao comparar os job descriptions com mercados mais vibrantes como os EUA, Alemanha, Holanda e Reino Unido, nós estamos muito atrasados. Nosso mercado é uma cópia do que se falava há uns 5 anos. Um absurdo.

Será que vou ter paciência para aguardar a modernização das empresa e do mercado de TI do Brasil? Será que temos pessoas de qualidade para conseguir mudar este cenário retrógrado e desvantajoso para nossa economia? Será que é possível tentar empreender no Brasil e achar pessoas que já tenham contato com tecnologias open-source e tenham vontade de evoluir? Se eu abrir uma empresa que dependa deste nível de pessoas, vou conseguir pagá-las como? Quando teremos um ensino que premie o esforço e não a presença em sala de aula? Quando vamos parar de ser otários e quando começaremos a preparar pessoas de qualidade para podermos crescer de verdade? Onde estão estas pessoas especiais que deveriam guiar nossa evolução técnica no Brasil? Viraram gerentes? Desistiram? Estão acomodadas? São realmente muito raras? Foram trabalhar na Amazon ou no Nubank? Ou foram embora em definitivo do Brasil?

Estou sem paciência. Com vontade de mandar tudo à merda. Deprimido com a irrelevância de tudo o que faço. Putaço com a quantidade de merdas que tenho que consertar diariamente, que não precisariam acontecer. Putaço com este país.

Chega.

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