Pato Pesquisa — Parte 1 de 2

Renato Diniz
Projeto Pato
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5 min readJul 5, 2018

Durante os meses de maio e junho tive a oportunidade de desenvolver e aplicar um Censo Regional na organização em que atuo, o Students For Liberty Brasil. Contando com a participação de varios estados do nordeste, o censo busca analisar a relação entre as demandas e o que os voluntários de fato encontram dentro da instituição. A pesquisa tem caráter interno, entretanto, acredito que alguns dados possam ser de interesse para outros gestores de voluntários. A seguir, resultados comentados do censo aplicado:

Perfil

O modelo de questionário utilizado baseia-se no CAT (Culture Analysis Tool) e busca compreender melhor quais os problemas encontrados pelos membros da organização para produzir um diagnóstico da situação (Connors, 2012). Foram coletadas 98 respostas de voluntários de acordo com a distribuição a seguir: Alagoas (13), Bahia (21), Ceará (9), Maranhão (8), Paraíba (7), Pernambuco (21), Piauí (6) e Rio Grande do Norte (13). Quase 80% dos elementos são masculinos (79,6%) e 45,9% com idade entre 18 e 20 anos (37,8% entre 21 e 23 anos, 7,1% entre 24 e 26 anos e 9,2% acima dos 26 anos). Além disso, 54,1% dos voluntários estavam a até seis meses atuando na instituição, com 24,5% atuando de seis meses a um ano e o restante estando presente a um tempo superior a um ano.

Questionário comentado

Missão e valores

  • Minha organização ideal me ajuda a entender de forma clara qual é minha missão enquanto membro — 91,4% sim e 5,1% não.
  • Minha organização ideal me ajuda a entender como o meu trabalho se encaixa na visão da organização — 91,8% sim e 8,2% não.
  • Minha organização ideal me encoraja a aumentar minha participação cada vez mais — 95,9% sim e 4,1% não.

Comunicar continuamente a missão, a visão e os valores da organização distingue facilmente as organizações cujos voluntários permanecem leais e motivados por aqueles que são continuamente frustrados pela falta de engajamento voluntário (Grace, 2009). Nosso desejo de se sentir parte de algo é tão poderoso que nós podemos fazer coisas irracionais, até gastar nosso proprio dinheiro para continuar pertencendo. Organizações que são capazes de inspirar dão aos seus membros um senso de propósito e de participação que tem pouco haver com incentivos externos. Estas organizações desenvolvem voluntários capazes de sustentar intempéries e inconveniências para continuar ajudando a construir a visão da organização. Quando a instituição comunica claramente o que ela acredita (valores), como a região seria afetada caso esse objetivo fosse alcançado (visão) e qual o caminho que será percorrido para isso (missão), voluntários irão percorrer distâncias inimagináveis para tornar tudo isso realidade (adaptado, Start With Why, 2009).

Supervisão

  • Minha organização ideal possui superiores que coordenam e supervisionam minhas atividades diretamente — 71,4% sim e 28,6% não.

Num estudo com milhares de organizações em 20 países, foi avaliado o quais os fabricantes, escolas e hospitais que aderem a três princípios básicos de gestão: metas, incentivos e supervisão. Foi descoberto que um grande número de organizações não segue nenhum desses fundamentos, que adotar o básico gera grandes melhorias nos resultados, como produtividade e longevidade, e que a supervisão de funcionários estimula o engajamento (Bloom et al., 2012). Simon Sinek aponta um resultado ainda mais supreendente, onde funcionários que possuem chefes omissos apresentam cerca de 40% de de, entretanto se os mesmos chefes passarem a criticar o desempenho de seus funcionários de forma regular, apenas 22% se sentem desengajados (Gallup, 2013). Voluntários em geral desejam alguem para direcionar suas atividades. Quando bem treinados, supervisores guiam voluntários em suas atividades e favorecem o engajamento.

Comunicação interna

  • Minha organização ideal me incentiva a entrar em contato direto e frequente com o corpo diretor — 70,4% sim e 29,6% não.

Membros de nível mais baixo tendem a perceber funcionários de alto escalão dentro da organização como distantes e que exigem uma comunicação mais formal. Isso gera um impedimento a motivação e dificulta a comunicação interna (Winter & Jackson, 2006). Ainda neste mesmo estudo, Richard e Brent contam que o CEO também tinha uma política de portas abertas, o que significava que os funcionários poderiam “ligar para ele imediatamente para expressar suas preocupações”. No entanto, vários membros mais abaixo na hierarquia organizacional consideravam esses mecanismos como “atos simbólicos” ao vez de tentativas genuínas de estabelecer canais de comunicação pelos quais os funcionários podem expressar suas preocupações à gerência.

É compreensível que funcionários seniores de organizações voluntárias não tenham de fato tempo suficiente para entrar em contato com todos os seus voluntários, porém é crucial que os mesmos tentem desenvolver uma imagem de abertura e facilidade de comunicação. Uma possibilidade é estabelecer o contato com alguns membros aleatórios com periodicidade aleatória. Por exemplo, duas vezes na semana um funcionário sênior telefona para dois voluntários da organização. Isso irá repercutir histórias entre os membros sobre como um funcionário sênior buscou entender um pouco mais de sua situação, de forma genuína e sem necessitar algo em troca, gerando histórias que enriquecem a cultura organizacional e desenvolvem sentimentos de confiança e cooperação através da instituição.

Participação na tomada de decisões

  • Minha organização ideal inclui membros na tomada de decisões operacionais — 90,8% sim e 9,2% não.
  • Minha organização ideal me encoraja a opinar sobre pontos que podem ser críticos no funcionamento da própria organização — 96,9% sim e 3,1% não.

Engana-se quem ainda acredita que a maioria dos voluntários não querem se envolver no planejamento e gestão de suas organizações. Se as contribuições dos voluntários para organizações são tão valiosas quanto aponta a literatura, seja em relação à custo-eficiência, qualidade do serviço e impacto, esperamos que todas as organizações públicas e sem fins lucrativos usem os voluntários ao máximo. No entanto, nem todas se aproveitam do máximo potencial destes voluntários para auxiliar em sua prestação de serviços (Nesbit et al., 2017). Rebecca, Robert e Jeffrey continuam defendendo que o escopo geral do envolvimento voluntário em uma organização é determinado em conjunto pelas decisões tomadas pela organização anfitriã e pelos indivíduos que se oferecem como voluntários. Os pesquisadores argumentam que as decisões da organização e dos voluntários sobre o seu proprio envolvimento se combinam para determinar o escopo geral do envolvimento de voluntários dentro de uma organização, seja esse envolvimento estreito ou amplo.

Há vários elementos que impactam as percepções que os membros têm sobre seus gerentes, bem como o grau em que os funcionários sentem que eles (funcionários) participam de decisões significativas sobre políticas, estratégias e objetivos da organização, em oposição às decisões básicas sobre a maneira como eles executam partes específicas de suas atividades. A questão de quem realmente define as prioridades é fundamental para o engajamento. Se os membros de uma organização, sejam voluntários ou funcionários, acreditarem que um pequeno grupo de pessoas estabelece prioridades com pouca sua participação ou influência, o grau de engajamento irá diminuir (Belling, 2009).

Continua…

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Renato Diniz
Projeto Pato

Coordenador Regional no Students For Liberty Brasil e escritor no @projetopato