Precisamos falar sobre a mulher preta e ressentimento

Kathleen Ronise
projetoagostinhas
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3 min readApr 13, 2021
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“Tu criaste o íntimo do meu ser e me teceste no ventre de minha mãe. Eu te louvo porque me fizeste de modo especial e admirável. Tuas obras são maravilhosas! Disso tenho plena certeza!” Salmos 139:13,14.

Ultimamente tenho pensado muito acerca do racismo e de suas consequências na sociedade, e em questões que nunca antes tinham me despertado grande interesse. A edição do BBB de 2021 tem nos trazido discussões necessárias, uma vez que há uma quantidade significativa de pessoas pretas participando do programa. Alguns discursos específicos de mulheres pretas em relação às mulheres brancas me chamaram a atenção, principalmente um, dito pela participante Lumena, logo no início do programa, em uma conversa com Fiuk. Eles estavam conversando a respeito de uma atividade que deve ser realizada diariamente no confessionário e que precisa ser cumprida dentro de um tempo determinado. Lumena se sentiu prejudicada por Juliette e fez o seguinte comentário: “Mais uma vez, uma mulher fenotipicamente branca me tirando o direito de usar meu tempo ou me fazendo correr o risco de perder 500 estalecas. Como muitas vezes acontece lá fora, Fiuk, eu perco pra mulher branca”.

Apesar de Juliette realmente ter usado quase todo o tempo do grupo, essa frase me tocou num lugar diferente, e me despertou para uma questão: Será que esse é um sentimento só da Lumena? Será que o ato da Juliette foi suficiente para causar esse tipo de reação? Quanto de ressentimento, nós, mulheres pretas, temos em relação às mulheres brancas?

De acordo com o dicionário, ressentimento é compreendido como “mágoa que se guarda de uma ofensa ou de um mal que se recebeu”, ou seja, trata-se de um sentimento profundo que tem o potencial de nos corroer ao longo do tempo, a partir de algo que tenha sido dito ou feito por outra(s) pessoa(s), e que consequentemente, tenha atingido algum ponto interior sensível e específico.

Não estou, de forma alguma, diminuindo as desigualdades e injustiças que a comunidade negra tem em relação aos brancos, mas reflito sobre o lugar que isso tem ocupado dentro de nós. A Bíblia nos ensina que guardar mágoas, e sentimentos destrutivos em relação às outras pessoas não agrada o coração de Deus. No livro de Jó 5:2, lemos que “o ressentimento mata o insensato, e a inveja destrói o tolo”; Paulo, na carta aos Efésios, também recomenda e exorta o povo pedindo que “livrem-se de toda a amargura, indignação e ira, gritaria e calúnia, bem como de toda maldade. Sejam bondosos e compassivos uns para com os outros, perdoando-se mutuamente, assim como Deus perdoou vocês em Cristo (cap. 4:31 e 32).

A luta por direitos, respeito e igualdade é completamente legítima e precisa continuar, entretanto isso não deveria se transformar em ressentimento, a ponto de afetar nossa autoestima e nossa convicção de valor pessoal, ou ser motivo para ataques constantes às pessoas brancas, como uma espécie de vingança, uma vez que a Palavra de Deus nos garante que Ele dispensa o mesmo amor a todas as suas criaturas, sem fazer diferença por sua cor de pele, cultura ou o que quer que seja, e isso deveria ser o suficiente para que compreendermos que, apesar e além de todas as coisas, o nosso coração precisa ser renovado e liberto pelo perdão que Cristo nos dispensa e nos encoraja a imitar.

Porém, não posso negar que me identifiquei com a Lumena. Todas nós, de fato, já perdemos em algum momento para a mulher branca, seja profissionalmente ou nos relacionamentos amorosos, por exemplo. E isso dói, frustra, e vai minando aos poucos todos os bons pensamentos que poderíamos ter a respeito de nós mesmas. Mas acredito que podemos escolher não ficar neste lugar de dor e ressentimento. Precisamos clamar pela cura do Deus que não nos fez para nos sentirmos injustiçadas e perdedoras, mas que nos ama, nos valoriza e nos faz andar em lugares altos (Habacuque 3:19).

Oro para que nós, mulheres negras, recebamos a cura e nos apropriemos do que o salmista diz no Salmo 139: de que o Pai nos fez perfeitas, especiais e admiráveis, ainda que a sociedade muitas vezes diga o contrário. E que, principalmente, os nossos valores e o nosso caráter estejam sempre firmados Nele!

Com amor,

Kathleen Ronise

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