Foto de Ariel Pilotto tirada do Unsplash

Assistindo à Imago Dei

Repensando a Comunicação de maneira a buscar a Justiça de Deus na Terra.

Idinei Carvalho Filho
Published in
4 min readJul 26, 2021

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Nos tempos primordiais, os seres humanos eram vistos como desprovidos de dignidade, escravos dos deuses, e esses deuses eram representados pelos reis — encarnações do divino, ou filhos dele. Também dentro da cosmovisão do mundo do Antigo Oriente Próximo existia a figura do sacerdote, que representava os seres humanos — lembrando que esses não tinham dignidade — para a divindade. A sociedade vivia na dependência da classe sacerdotal, enquanto esses eram os grandes detentores do poder. (REINKE, 2019)

Com uma apologética — defesa da fé — incrível, o livro de Gênesis traz uma afirmação chocante para o mundo do Antigo Oriente Próximo: “todos os seres humanos e não somente os reis, foram criados à imagem de Deus.” (GOHEEN; BARTHOLOMEW, 2016).

Assim, Deus criou os seres humanos à sua própria imagem,
à imagem de Deus os criou;
homem e mulher os criou. Gênesis 1:27

Toda a humanidade, prefigurada pelos pais primordiais Adão e Eva, recebe a Imagem de Deus — também chamada de Imago Dei — característica própria pela qual é possível se relacionar consigo mesma, com o próximo, com o mundo e com Deus. E esse princípio dá dignidade a todos os seres humanos, uma vez que o próprio Deus é digno. Ele compartilha conosco um de seus atributos mais sustentadores da realidade: a comunicação. É Ele quem sustenta esse mundo através de sua palavra, seus decretos, se revelando aos homens através da comunicação. Como bem disse Packer (2016): Deus é um deus que fala.

Devemos cuidar da forma como nos comunicamos, e isso não envolve apenas palavras, mas "todos os aspectos de nossa vida" (FRAME, 2008). Ao atuarmos no palco da criação interagindo com outras pessoas podemos cair em erro pela intenção e maneira de comunicar, corrompendo esse atributo de Deus em ferramenta de desonra para o próximo.

Interagindo com a mais multiforme Imago Dei: diferentes em gênero, altura, peso, etnia, aptidões, idiomas e culturas. As imagens de Deus, sacerdotes reais Dele aqui na Terra, ao se manifestarem de forma tão diversa, torna a comunicação diversa. Uma das manifestações da Imago Dei se dá na pessoa com deficiência (PcD). Logo, uma comunicação inclusiva, assistiva e universal é imprescindível.

O catecismo de Heidelberg (1563) ao expor o Oitavo Mandamento (Ex 20:15) diz assim sobre o que devemos fazer:

Deus não somente proíbe o furto e o roubo que as autoridades castigam, mas também classifica como roubo todos os maus propósitos e as práticas maliciosas, através dos quais tentamos nos apropriar dos bens do próximo, seja por força, seja por aparência de direito, a saber: falsificação de peso, de medida, de mercadoria e de moeda, seja por juros exorbitantes ou por qualquer outro meio, proibido por Deus. Também proíbe toda avareza bem como todo abuso e desperdício de suas dádivas.

Também o Catecismo Maior de Westminster (1647) nos diz somo como promover a situação positiva deste mandamento:

Os deveres exigidos no oitavo mandamento são: a verdade, a fidelidade e a justiça nos contratos e no comércio entre os homens, dando a cada um o que lhe é devido, a restituição de bens ilicitamente tirados de seus legítimos donos; a doação e a concessão de empréstimo, livremente, conforme as nossas forças e as necessidades de outrem; a moderação de nossos juízos, vontades e afetos, em relação às riquezas deste mundo; o cuidado e empenho providentes em adquirir, guardar, usar e distribuir aquelas coisas que são necessárias e convenientes para o sustento de nossa natureza, e que condizem com a nossa condição; o meio lícito de vida e a diligência no mesmo; a frugalidade; o impedimento de demandas forenses desnecessárias e fianças, ou outros compromissos semelhantes; e o esforço por todos os modos justos e lícitos para adquirir, preservar e adiantar a riqueza e o estado exterior, tanto de outros como o nosso próprio.

Isso pode nos indicar que uma vez que somos todos Imago Dei; que nosso Rei Jesus nos ordena a sermos sal e luz neste mundo (Mt 5:13–14)e a buscar o Reino de Deus e sua Justiça (Mt 6:33); que a comunicação é atributo de Deus; que há várias manifestações das imagens de Deus e que uma falta de comunicação inclusiva pode nos levar a quebra do oitavo mandamento, uma vez que estamos impedindo o crescimento tanto espiritual e vocacional do próximo.

Podemos pensar em formas de como o marketing, o design e a comunicação atual, nos moldes da ética deste século, estão fora dos padrões bíblicos de amor ao próximo e repensar a maneira de como atuamos nesse meio como profissionais de maneira a levar a justiça de Deus nessas áreas.

Bibliografia

Catecismo de Heidelberg (1563), pergunta 105.

Catecismo Maior de Westminster (1647), pergunta 141.

FRAME, John. A doutrina da vida cristã. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2013.

GOHEEN, M. W.; BARTHOLOMEW, C. G. Introdução à Cosmovisão Cristã: vivendo na intersecção entre a visão bíblica e a contemporânea. São Paulo: Vida Nova, 2016.

PACKER, James I. O conhecimento de Deus. Editora Cultura Cristã (Casa Editora Presbiteriana), 2016.

REINKE, A. D. Os outros da Bíblia: história, fé e cultura dos povos antigos e sua atuação no plano
divino. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2019.

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Idinei Carvalho Filho

amigo do Amigo. Designer, mestrando, trainee de professor, apaixonado por história e aspirante a teólogo de fundo de quintal https://linktr.ee/idineicarvalho