O senhorio de Cristo no marketing

A busca por uma relação adequada entre fé e trabalho

Kaiky Fernandez
ProjetoCTA
5 min readAug 6, 2021

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Introdução

Talvez uma das áreas mais controversas na atualidade seja o marketing. Por um lado, ele se tornou um conhecimento indispensável para qualquer negócio ou instituição, diante do nosso contexto de maior complexidade e conectividade. Por outro lado, ele é constantemente motivo de críticas e questionamentos.

É comum encontrarmos cristãos que possuem vocação para atuarem no marketing em posições que são opostas. Primeiro (1), há aqueles que se encontram em crise, por não compreenderem como a fé cristã que eles professam tem relação com a profissão. Acham que não estão glorificando a Deus com o que fazem ou que o trabalho nessa área é menos digno do que em outras.

No outro extremo (2), há aqueles com uma visão totalmente fragmentada da realidade, como se a fé e o trabalho fossem duas coisas dissociadas. Nesse caso, a fé fica restrita ao âmbito individual e particular, enquanto o trabalho, ao âmbito coletivo e público.

Reconhecendo o senhorio de Cristo

O autor Vern S. Poythress (2019, p. 14) nos alerta para algo fundamental:

“(…) se Jesus é de fato o Senhor de todas as coisas, ele é o Senhor de todas essas áreas da vida. Ele já está aí em sua autoridade, presença e poder divinos. Você não pode ‘mantê-lo de fora’. E tentar mantê-lo de fora já é uma violação de sua reivindicação ao senhorio.”

Ele nos chama a atenção pelo fato de que não podemos manter Cristo fora dos negócios, da ciência, da economia, da educação ou de qualquer outra área da vida. O senhorio de Cristo não é uma questão de escolha pessoal. É um fato. Cristo é Senhor! O que cabe a nós é o reconhecimento desse senhorio e a compreensão das suas implicações práticas para a nossa vida.

Uma vez que reconhecemos que Cristo é Senhor sobre tudo, isso também diz respeito ao marketing! Somente assim poderemos ter uma relação equilibrada com essa — e qualquer outra — área do saber. Reconhecendo o senhorio de Cristo no marketing, podemos tanto fugir do extremo de não compreender o valor e importância dessa área (1), quanto do extremo de achar que ela não tem relação nenhuma com o que cremos (2).

É o reconhecimento do senhorio de Cristo que nos possibilita uma atuação adequada. Primeiramente, por sabermos que o nosso Senhor também é senhor sobre nossa área de trabalho e, por isso, ela é tão sagrada quanto qualquer outra área da nossa vida. Como consequência disso, por nos dar as diretrizes para uma atuação coerente, ética e comprometida com o bem comum.

A importância da ética cristã

O autor John Frame (2008, p. 31) nos lembra de algo basilar, no que diz respeito à importância do estudo da ética, mas que muitas vezes deixamos passar despercebido:

“(…) se desejamos ser discípulos de Jesus, devemos nos dedicar a fazer boas obras. Se temos de praticar boas obras, devemos saber quais obras são boas e quais são más. Portanto, precisamos estudar ética.”

É o estudo da ética cristã, ancorada na Escritura, que nos orienta em relação às nossas boas obras. Obviamente que o texto bíblico não é uma cartilha de instruções, tampouco algo exaustivo sobre as mais diversas situações e questões da nossa vida, principalmente naquelas mais contemporâneas, que estão historicamente deslocadas do contexto no qual ele foi escrito.

No entanto, a Palavra de Deus nos apresenta princípios e normas que são válidos e necessários para toda a nossa existência. Seja pro culto público, para criação de filhos, para formação educacional ou para o marketing. É isso que Albert Wolters (2019, p. 20) aponta:

“(…) as Escrituras falam de modo geral sobre tudo na nossa vida e no mundo, incluindo tecnologia, economia e ciência. (…) A não ser que essas questões sejam abordadas em categorias centrais das Escrituras, como criação, pecado e redenção, a avaliação dessas dimensões supostamente não religiosas da nossa vida será provavelmente dominada por uma das visões de mundo concorrentes do Ocidente secularizado.”

Portanto, precisamos buscar na revelação normativa de Deus as orientações para o nosso trabalho como profissionais de marketing. Precisamos nos dedicar com afinco ao estudo da Escritura para que tenhamos condições de ter uma atuação condizente com o que cremos.

Se isso não acontecer, outra visão de mundo irá moldar nossas práticas. Se não nos fundamentarmos em uma ética genuinamente bíblica, nos basearemos em algum outro padrão que, na melhor das hipóteses, será insatisfatório, e na pior, incoerente com o que cremos.

Conclusão

O reconhecimento do senhorio de Cristo no marketing nos livra de sermos omissos, ignorantes e charlatões. Três erros comuns que precisamos evitar se quisermos dar um bom testemunho e viver de forma integral, com a nossa fé permeando e reorientando toda a nossa vida.

No primeiro caso, a omissão diz respeito à desvalorização do marketing, como se ele fosse menos importante do que outras áreas, ou como se suas práticas estivessem, por si só, em oposição à provisão e à graça de Deus. Podemos sim reconhecer e clamar pelo favor de Deus, ao mesmo tempo em que trabalhamos com afinco para que nossos empreendimentos, negócios ou instituições tenham bons frutos.

No segundo caso, a ignorância diz respeito à inconformidade com a Escritura, como se ela nada tivesse a dizer sobre aquilo que fazemos nas nossas práticas comerciais, e assim atuamos de forma contraditória por falta de conhecimento e profundidade bíblica.

No terceiro caso, o charlatanismo diz respeito ao desprezo pela ética bíblica. Talvez seja esse o pior dos três erros. É quando intencionalmente há uma escolha por ignorar os princípios bíblicos, mesmo os conhecendo, a fim de um propósito “mais importante”, como a lucratividade do empreendimento ou o sucesso nas vendas.

Reconhecendo o senhorio de Cristo, não apenas intelectualmente, mas no coração, que é o centro das nossas cognições, vontades e afetos, poderemos atuar com a paz e a responsabilidade de saber que há um Senhor que é senhor também sobre o marketing. Poderemos trabalhar sabendo que nosso ofício é tão sagrado quanto qualquer outra área. Poderemos reorientar nossos planejamentos estratégicos, análises de métricas, campanhas de comunicação e estudos de mercado para além de um fim em si mesmos, mas como oportunidades para servir o outro a partir dos princípios revelados pelo próprio Deus na Sua Palavra.

FRAME, John. A doutrina da vida cristã. Tradução: Jonathan Hack — São Paulo: Cultura Cristã, 2013.

POTHRESS, Vern S. O senhorio de Cristo: servindo o nosso Senhor o tempo todo, em toda a vida e de todo o nosso coração. Tradução: Marcelo Herberts — Brasília, DF: Editora Monergismo, 2019.

WOLTERS, Albert. A criação restaurada. Tradução: Denise Meister — São Paulo: Cultura Cristã, 2019.

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