Penso, logo penso mais um pouco

Tudo em excesso faz mal, que dirá transmissão sináptica

Carolina Pinheiro
DOSE
2 min readJul 28, 2018

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Em qualquer filme meia boca, podemos ver o embate entre um personagem mega espontâneo e outro taxado como medroso por ser precavido demais. Sinceramente, a supervalorização da imprudência travestida de coragem sempre me incomodou. É fato que o venerado Ferris Bueller poderia ter curtido aquele dia adoidado de mil maneiras — e nenhuma exigia tamanha insensibilidade e perturbação para com seu melhor amigo.

A questão é que ser despreocupado e leviano não tem nada de glamuroso. A inconsequência cobra um preço altíssimo e sempre sai ganhando quem fica atento à necessidade de um planejamento. Dito isso, para a turma do pense antes de agir — a minha turma, diga-se de passagem — não há nada mais exaustivo do que essa infinidade de cálculos racionais.

Eu tenho a plena consciência de que essa vibe espírito livre desleixado não dá certo, mas ficar refém das conjecturas também atrapalha, e muito. Primeiro, o overthinking traz dois problemas fatais para a sanidade mental: ansiedade e fatalismo. Você quer pensar, em todos os cenários possíveis, para se prevenir e tomar a melhor atitude? Ótimo. Só que não há limite quantitativo para esses cenários, o que acaba nos deixando presos a essa infinidade de hipóteses, que ultrapassam a linha da verossimilhança e nos levam à insensatez. Insensatez essa que estávamos justamente evitando ao pensar antes de agir.

Segundo e mais apavorante: a imprevisibilidade é inescapável. Não importa o quanto você especule, nunca saberá, ao certo, qual é o melhor caminho. Você pode reduzir as possibilidades para três, duas… Mas não dá para apostar com plena certeza. Eventualmente, temos que decidir qual apenas aparenta ser melhor, e então, executá-la. Ainda assim, permanecemos sem saber se as pessoas envolvidas vão corroborar, se o timing será correto, e todos os incalculáveis fatores que compõem uma circunstância, no mundo real.

Estou habituada a essas viagens particulares na minha mente toda vez que eu me deparo com alguma situação, desde sempre. A fim de fazer uma escolha embasada e fugir dos arrependimentos, eu praticamente arrumo as malas e cumpro o itinerário mental da vez sem pestanejar. A minha insatisfação se dá, somente, quando eu esqueço o caminho de volta para casa. Pensar demais não é sinônimo de perfeição, mas pode ser de estresse. Pensar demais sobre pensar demais, então, nem se fala.

Eu só sei que seria interessante optar, em um único e brevíssimo instante, pelos dois sabores de sorvete que eu quero na casquinha. Sem provinha prévia, nem nada. Sei também que gostaria de finalmente decidir qual tatuagem fazer. É possível que as pequenas coisas mereçam um agir menos pretensioso. Orgânico. Instintivo.

Mas, pensando bem, o meu instinto mesmo é pensar.

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Carolina Pinheiro
DOSE
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Internacionalista, mestre em Ciência Política, escritora e sonhadora profissional.