Ayn Rand e Frédéric Bastiat nas Escolas: por que há liberais frustrados?

Até as vitórias do movimento parecem ter virado motivo de discussão entre liberais. Mas há motivo para tanto alvoroço?

Amanda de Vasconcellos
O Prontuário
3 min readAug 16, 2020

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Essa semana vi acontecer no Twitter aquilo que considero a mais sagrada de todas as tradições liberais: a rinha de liberal. Não que nós, liberais, não concordemos uns com os outros de vez em quando, mas isso parece, por vezes, algo difícil de admitir. Especialmente na internet, o lugar mais propício do mundo a discussões intermináveis, as discordâncias internas entre os amantes do liberalismo se exacerbam acima do nível das discussões saudáveis.

A polêmica da vez foi, a meu ver, um dos maiores non issues discutidos nos últimos tempos: a Secretaria da Educação do governo Zema decidiu inserir os filósofos Frédéric Bastiat a Ayn Rand no material didático das escolas estaduais daqui de Minas Gerais. Essa decisão, claro, como qualquer outra, tem seus problemas, porém o que me parece é que partiu de muitos liberais uma reação exagerada.

Em linhas gerais, considero que tenha sido positiva a decisão de incluir pensadores liberais em um currículo que, como sabemos, é bastante engessado, e, sejamos honestos, enviesado negativamente contra o liberalismo (o que não considero que seja um grande plano maligno de doutrinação marxista, e, na realidade, questionar a existência ou não de doutrinação no ensino é uma das maneiras mais certas de causar uma rinha de liberal). Estamos, afinal, encorajando a diversidade de pensamentos quando decidimos ampliar as visões contempladas pelo ensino. Estamos permitindo que os estudantes tenham um contato com aquilo que acreditamos. Isso não é… Bom?

Certamente há desafios oriundos da medida. Ela pode, por exemplo, acabar resultando em proselitismo político, e os liberais estão mais que certos ao tentar dissociar sua imagem dessa possibilidade. O cerne da liberdade é justamente que não devemos impor a ninguém nossas visões, de modo que nada mais justo — e necessário! — que manter vigilância sobre o governo para que o pensamento liberal seja incluído, mas jamais imposto.

É também interessante pensar no significado dessa escolha. Como disse o próprio Bastiat, “o que se vê e o que não se vê”. Vi de liberais a crítica ferrenha de que essa seria uma medida de simples populismo para liberais. E, decerto, nenhum governo toma qualquer atitude sem pensar cuidadosamente nas implicações disso para seu eleitorado. Entretanto, uma vez mais, não vejo porque transformar a preocupação em alvoroço: nada impede que liberais mantenham uma postura cética quanto ao poder público quando comemoram boas decisões tomadas por ele. Devemos criticar, sim, àqueles que esquecem que esse ceticismo é central à filosofia liberal, mas não às boas decisões per se.

Por fim, vi a questão da relevância desses filósofos sendo levantada, e me recuso a discutir quem seria “o melhor liberal de todos os tempos”. Contudo, é certo que nem Rand nem Bastiat podem ser taxados de irrelevantes. A Revolta de Atlas, principal obra de Rand, foi votada como segunda obra mais influente nos EUA, perdendo apenas para a Bíblia. A Lei, trabalho mais conhecido de Bastiat, é uma perfeita introdução ao liberalismo político, apresentando todos os seus principais pontos com clareza impecável. Não, não foi uma seleção perfeita de autores, e não vejo por que não discutir qual seria o dream team de filósofos liberais no Twitter — que virou a nova mesa de bar nessa quarentena. Todavia, mais uma vez questiono: por que o alvoroço?

Encerro, então, este texto enfatizando esse questionamento. A divergência intelectual é absolutamente essencial para a defesa plena das liberdades, e jamais advogarei pelo fim dela. Defendo, porém, que as divergências sejam apresentadas de maneira mais amigável e menos desesperada. E talvez eu esteja exagerando, talvez as pessoas se exaltem menos fora da internet — não é como se eu estivesse tendo muitas discussões em mesas de bar neste 2020 —, talvez eu esteja enviesada por uma amostra pequena no Twitter. Mas, sinceramente, o que o movimento liberal ganha quando até mesmo nossas relativas vitórias viram motivo de agressividade?

Obrigada por ler esse texto! Se gostou, não se esqueça de dar seus aplausos (de 1 a 50). Aproveite e comente: o que você pensa sobre isso? Você costuma participar desse tipo de discussão em redes sociais? E qual seria o seu dream team de liberais para incluir no material didático das escolas?

Se quiser ficar por dentro dos próximos textos, me acompanhe nas redes sociais. Até semana que vem!

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