o futuro da USP: debate dos reitoráveis
Nesta quinta-feira (05/10) ocorreu o debate entre candidatos à reitoria e vice-reitoria no Auditório Professor Fernão Stella de Rodrigues Germano do ICMC. Nós do prosa fomos conferir o evento e queremos aqui esclarecer alguns pontos e dar nossa impressão sobre o debate.
A reitoria é um órgão que superintende todas as atividades universitárias. O reitor é tido como agente executivo da universidade, ou seja, tem como funções a administração da Universidade, representação e nomeação de coordenadores e diretores das unidades. Ele deve ser professor titular e é nomeado pelo governador do estado de São Paulo a partir de uma lista com três nomes.
Ao vice-reitor cabem as mesmas competências e exigências que o reitor, devendo substituí-lo caso seja necessário. Reitor e vice-reitor também podem optar pela divisão das funções.
Os candidatos estão organizados em quatro chapas, apresentadas a seguir:
Cada chapa apresentou em fala breve os pontos principais de seu plano para a gestão, seguido de uma rodada de perguntas e por fim uma fala para considerações finais.
Ao final, tivemos também uma participação do Centro Acadêmico Oswaldo Cruz, da Faculdade de Medicina, que apresentou uma carta reivindicando algumas mudanças relativas à gestão do Hospital Universitário da USP.
Propostas das chapas
Nas propostas o tema mais enfatizado foi o da crise financeira e dos cortes dentro da universidade. Duas das chapas, a chapa 2 e a chapa 3 (Maria Arminda e Paulo Casella, Ildo Sauer e Tércio Ambrizzi, respectivamente) enfatizaram a importância do capital humano (servidores e docentes) para a universidade e argumentaram que a saúde financeira é necessária, mas que não pode ser feita sem planejamento estratégico como havia acontecendo nos últimos anos.
Em particular, a chapa 2 traz à tona o dito “Silêncio no Butantã”: a não participação da USP nos problemas e na construção do país. Maria deseja retomar o prestígio da USP frente ao Brasil. Além disso, relembra que no Brasil as universidades públicas tem também um “papel civilizatório”, de formar cidadãos e contribuir com a solução das questões sociais, e considera que a instituição é crucial para a construção do Brasil. Defende uma USP soberana nos seus interesses
A chapa 3 (Ildo) destacou a necessidade da presença da USP no debate público, e defende um protagonismo da Universidade nas questões urgentes e centrais do país, de forma direta e indireta. Defende um novo diálogo com a sociedade, e destacou que as grades que cercam a reitoria são o reflexo de uma universidade que se fecha ao diálogo e à convivência democrática. Na questão financeira, defende investimentos privados com a ressalva de que a USP não perca sua soberania e que não se torne submissa aos interesses de alguns grupos. Na questão financeira, sugere cortes de gasto com inovação, como por exemplo sua própria pesquisa, que construiu painéis solares para suprir energia ao instituto.
“As grades que cercam a reitoria são o reflexo de uma universidade que se fecha ao diálogo e à convivência democrática.” — posicionamento de Ildo Sauer
A chapa 4, de Ricardo Terra e Albérico Ferreira pretende dar continuidade e também ampliar os trabalhos feitos pela gestão Zago, argumentando que começar do zero é algo ilusório. Ricardo afirmou que a USP é “Uma federação frouxa de institutos isolados”, e que pretende torná-la uma “universidade real”. Os candidatos também acreditam que “a democracia na universidade é um equívoco”, e que em nenhuma das grandes universidades de renome há espaço para votações, e que as coisas na universidade seguem um rumo meritocrático, não democrático. Desejam reformar o Código de Ética e o Código Disciplinar, enfatizando a necessidade de ordem e regras de conduta. Destacaram a necessidade de um vice-reitor atuante, e o candidato a vice, Albérico, mostrou que seria ativo como um mediador entre a reitoria e os institutos, e entre a USP e a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP)
“a democracia na universidade é um equívoco” — posicionamento de Ricardo Terra
E por último, a chapa 1, formada por Vahan Agopyan e Antonio Carlos Hernandes argumenta a favor das mudanças já feitas pela gestão anterior, mas também acredita na valorização do recurso humano da USP. Os processos de internacionalização da universidade e de interdisciplinaridade foram destacados. Vahan disse da necessidade da USP contribuir com a sociedade como instituição, para além da contribuição individual de cada um dos membros da comunidade, e acredita que a universidade deve formar além de profissionais, formar cidadãos. O candidato à vice, Antonio (ex Pró-reitor de Graduação), disse que devemos trazer para a sala uma maior diversidade, para assim tentar se aproximar da realidade brasileira.
Perguntas às chapas
1_ Reposição salarial, progressão de carreiras e recuperação de perdas estruturais (creche, Hospital Universitário)
- Vahan: Progressão financeira dos funcionários e docentes é prioridade, juntamente com um plano de contratações, mas afirmam que o controle rigoroso de finanças continuará.
- Maria Arminda: Defende manter a gestão do Hospital Universitário, mesmo havendo déficit e argumentou que creche tem pouco impacto no orçamento. Defende também progressão e reposição salarial.
- Ildo: Quer recompensar funcionários, mas no quadro atual acha difícil prometer alguma coisa. Argumenta que pesquisas realizadas dentro da própria USP podem auxiliar a diminuir custos dentro da universidade.
- Ricardo: Sugere progressão horizontal de carreira como medida de curto prazo. Não promete aumentos percentuais no salário e sim o fornecimento de benefícios sem encargos (Vale refeição e alimentação).
2_ Políticas de inclusão para o novo perfil de ingressante, natureza pública e privada da universidade e mensalidade de alunos
- Vahan: É contra cobrança de mensalidade, afirma que é inconstitucional. Propõe projeto “Vem pra USP” para buscar jovens talentos nas escolas. Defende aplicação de pesquisas da USP dentro da universidade.
- Maria Arminda: Defende que não se deve temer a inclusão social como causador de rebaixamento de desempenho.
- Ildo: Defende participação da universidade no ensino básico público para garantir que alunos ingressem bem na universidade. Também lembra que cobrança de mensalidade na USP é inconstitucional e defende participação privada, desde que não afetem propósito da universidade.
- Ricardo: Destaca que cobrar mensalidade dos alunos é inconstitucional e vai contra o Estatuto da USP. Além disso, afirma que inclusão deve ser feita também através do ensino.
3_Pesquisas desenvolvidas na USP serem úteis à sociedade e como aplicá-las dentro da própria USP
- Vahan: a pesquisa agora se divide em boa ou ruim, não mais “aplicada ou fundamental”. Quer interação com sociedade
- Maria: Afirma que pesquisas devem promover vínculos permanentes com a sociedade e que devem ser voltadas, no contexto atual, às políticas públicas e a questões ambientais.
- Ildo: “Não precisamos de Mckinsey”, ressaltando a qualidade dos pesquisadores em solucionar problemas. Menciona em como a USP forma professores de outras universidades
4_Melhoria da democracia e Transparência na USP
- Vahan: defende que hajam regras claras e que devem ser discutidas pela comunidade. Considera a heterogeneidade da usp uma vantagem
- Maria: Enfrentar essas questões nunca resolvidas é essencial. Defende a liberdade do debate e transparência
- Ildo: As pessoas não se sentem parte da construção da USP. Precisamos ouvir e tratar cada caso de acordo com suas especificidades
- Ricardo: Sugere que democracia é um equívoco na universidade, e cita casos de “barbárie” na universidade. Quer reformular código de regras e conduta.
Impressões finais
Notamos uma divergência marcante entre as propostas de cada chapa, sendo as chapas de Maria Arminda e Ildo mais voltadas a uma vertente progressista, com uma quebra do que tem sido feito pelas gestões anteriores e com um enfoque maior no recurso humano da universidade e na utilização pela sociedade das pesquisas aqui desenvolvidas. Já as chapas de Vahan e Ricardo prezam mais pela continuidade da gestão anterior, principalmente em relação aos cortes de gastos. Algumas declarações da chapa de Ricardo nos surpreenderam, pois afirmam sem rodeios que a democracia dentro da USP não deve seguir o modelo de democracia que vemos na sociedade (“A democracia dentro da universidade é um equívoco”). A chapa de Vahan, apesar de defender a continuidade de alguns projetos antigos, dá sinalizações a favor da inclusão social e racial na USP.
Acreditamos que exista ainda um projeto de universidade que não leva em conta a participação de alguns servidores e dos estudantes que a compõem, sendo limitado apenas aos docentes e a cúpula mais alta da USP, que toma as decisões, elege reitores e nomeia cargos sem que haja uma consulta significativa a esses grupos.