Movimento de cura: mulheres indígenas em Brasília

Coletivo Proteja
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4 min readAug 10, 2019

Começou hoje, 9 de agosto, a primeira Marcha das Mulheres Indígenas tendo como lema “Território: nosso corpo, nosso espírito”

Três mulheres indígenas olha para a lente da câmera. Duas são mais velhas e sorriem. A mais jovem parece desconfiada
Foto: Andressa Zumpano |CPT-MA

Brasília - O primeiro dia da Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, aberta hoje em Brasília e segue até o dia 14, foi de intensas movimentações. Representantes de povos de várias partes do Brasil chegaram à capital com o objetivo de dar visibilidade às ações das mulheres indígenas, discutindo questões inerentes às suas diversas realidades, reconhecendo e fortalecendo os seus protagonismos e capacidades na defesa e na garantia dos direitos humanos, em especial o cuidado com a mãe terra, com o território, com o corpo e com o espírito.

As organizadoras da marcha esperam entre 1,5 mil e 2 mil mulheres, representando cerca de 100 povos. Sônia Guajajara destacou que a mobilização é importante para a conquista e a preservação de direitos e citou, como exemplo, a manutenção da demarcação das terras indígenas com a Funai, uma das pautas principais do Acampamento Terra Livre, ocorrido em abril deste ano também em Brasília.

Logo pela manhã, representantes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que organiza a marcha, realizaram uma coletiva de imprensa para apresentar os objetivos da marcha e os principais pontos da agenda de diálogos propostos. Estiveram na mesa Sônia Guajajara, Nyg Kaingang, Célia Xakriabá e Cristiane Pankararu.

Uma das preocupações presentes em quase todas as falas é sobre a atual política indigenista em vigor no Brasil, e o discurso de enfrentamento e retirada de direitos dos povos. Célia Xakriabá foi enfática: “Nós entendemos que a flexibilização do armamento no campo atinge também o útero das mulheres, mas principalmente o útero da terra. Cada vez que matam uma liderança indígena, matam também o útero do território, por isso nós mulheres indígenas iremos fazer frente a esse genocídio, esse etnocídio e a esse ecocídio”.

“Entendemos que as mulheres indígenas temos responsabilidade nesse momento como um movimento de cura para uma sociedade que se encontra doente” — Célia Xakriabá

Célia Xakriabá liderança indígena da APIB em coletiva de abertura da Marcha das Mulheres Indígenas
Foto: Juliana Pesqueira | Proteja Amazônia

Casas parlamentares

Ao longo do dia, atividades no Congresso receberam as mulheres indígenas para ouvir suas reivindicações. No Senado, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) celebrou o Dia Internacional dos Povos Indígenas, com uma audiência pública coordenada pelo presidente da comissão, senador Paulo Paim (PR-RS).

Ana Patté, representante da Apib da região Sul, reforçou a necessidade de fortalecer a luta e a união das mulheres indígenas, criticou a reforma da Previdência e cobrou apoio para a demarcação de terras indígenas: “As mulheres indígenas estarão em Brasília para mostrar a força que temos”.

O senador Paulo Paim leu um documento defendendo a preservação das línguas indígenas e ainda criticou a autorização do governo para o uso da Força Nacional de Segurança na Esplanada em caso de manifestações populares, como é o caso da Marcha das Mulheres Indígenas.

Já na Câmara, a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas realizou ato em defesa dos povos indígenas e contra a mineração em territórios tradicionais. O recente anúncio de que o governo vai abrir as terras indígenas à exploração mineral, principalmente na Amazônia, onde se concentra a maior extensão das terras indígenas (98%), o maior número de indígenas isolados, 60% da população indígena brasileira, e o maior número de pedidos para pesquisa e lavra de minérios, tem gerado preocupação entre povos indígenas, ambientalistas, indigenistas e outros segmentos que atuam na defesa dos territórios e dos direitos dos povos originários.

O ato contou com a participação de representantes da Apib, do Conselho Indígena Missionário (Cimi), da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), além de lideranças de diversos povos indígenas, como Yap Oromon, de Rondônia, que lembrou da violência histórica sofrida pelos povos indígenas, e o caso dos cinta-larga que tiveram exploração de diamantes em suas terras.

Imagens: Juliana Pesqueira | Proteja Amazônia

Sônia Guajajara, reforçou a agenda das lideranças indígenas para o enfrentamento dos ataques do governo federal: “Hoje, Dia Internacional dos Povos Indígenas, marcamos o início da Marcha das Mulheres Indígenas, que seguem para Brasília para lutar pelos seus direitos e contra os desmontes do governo Bolsonaro. Estamos aqui para dizer que os povos indígenas do Brasil não aceitam essa agenda e essa política genocida do atual presidente. Estamos aqui para reforçar esse posicionamento contra a mineração, contra a entrega dos nossos territórios e contra a entrega da Amazônia. Reforçamos também nosso posicionamento contra o desmonte das instituições de saúde indígena”.

Foto: Erick Terena | Mídia Índia

Ao final do ato na Câmara, a deputada Joênia Wapichana, representando a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, leu uma nota pública contra a mineração em terras indígenas. O texto foi publicado no site da Apib. Confira trecho da nota:

“O Presidente da República ao anunciar que não demarcaria mais nenhuma terra indígena e ao comparar os índios a animais e seus territórios a zoológicos, rompe com a Constituição Federal e a obrigação da União de proteger a vida e os bens indígenas”

(Com informações da Agência Senado)

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