A Sogra que te Pariu e a ruptura temporal de Rodrigo Sant'Anna

paula
PseudoResenhas
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3 min readMay 10, 2022

A famosa Teoria da Relatividade estabelece que nada pode ultrapassar a velocidade da luz, e que, caso isso ocorra, o espaço-tempo deixa de existir para o corpo que a tenha alcançado. Também se estabeleceu ser impossível atingir tal velocidade, mas, como sempre, a sucateada ciência brasileira, mesmo sem orçamento algum, nos provou ser sim possível realizar esse feito.

Rodrigo Sant’Anna é o responsável pelo experimento A Sogra que te Pariu: O primeiro ambiente 100% livre do conceito de tempo, onde tudo e nada coexistem em harmonia.

A segunda sitcom nacional da Netflix — já que a primeira foi a série O Mecanismo, que narrou as desventuras da Operação Lava Jato — inova ao trazer conceitos pouco explorados no gênero, como a trilha de risadas facultativa, que ora está presente no episódio, ora some sem grandes explicações.

Rod travado após a consulta com o Dr. Rey

Neste universo fictício, todos os outros personagens são meros figurantes em suas órbitas solitárias e, vez ou outra, colidem com o astro rei.

Nossa sogrinha começa nos inserindo no contexto de sua personagem: Mãe, dona de casa e empoderada, ela chega para passar a pandemia com o filhote e a mona dele. Esta, infelizmente, reforça muita rivalidade feminina ao longo dos 10 episódios.

Ao entrar na mansão dos pombinhos, Rod é imerso em uma cápsula vagando a 300.000 Km/s (coincidentemente, a exata velocidade da luz) pelo universo. 76 semanas se passam em um piscar de olhos e a linha do tempo da velha finalmente colide com a do espectador.

Algumas intrigas e questões familiares como ciúmes, desconfiança e falta de responsabilidade afetiva preenchem vários minutos do tempo de tela por repetidas vezes até caírem em um limbo temporal.

Papo vai, papo vem e o enredo continua o mesmo: Rodrigo Sant’Anna é atacado mas não deixa barato, atacando novamente o grande nome da Fazenda 12, Lidi Lisboa. A sensação de Dejà Vu acalenta os corações dos mais dispersos, que, caso tenham perdido determinada discussão, rapidamente encontram o fio da meada após o mesmo conflito ser apresentado alguns minutos depois.

Uma novidade que a obra traz para as produções audiovisuais é a completa ausência do monopólio capitalista, já que, apenas no primeiro episódio são citadas as marcas: Tio João, Globo, Velho Barreiro, Gelol e Lojas Americanas. Estas não receberam nem pagaram um centavo pela citação.

São muitas as críticas explícitas na obra, como o fato dos atores contratados para interpretar os filhos do casal tenham, provavelmente, em torno de 40 anos de idade, refletindo uma sociedade em que a juventude é forçada a crescer cedo.

Também não faltam críticas contra a indústria da beleza, ao passo que Rô Sant'Anna fica irreconhecível enquanto botoxado e harmonizado, a ponto de mal conseguir abrir a boca para falar o texto.

Alguns enredos existem e rapidamente se desfazem como dunas ao sofrerem a ação dos ventos e as piadas sem timing expressam o tempo que já não existe nesse universo.

Como em uma grande vinheta de ano novo da Globo onde o mundo é feito de algodão doce, Sant’Anna tem a sua redenção perante ao público e coloca um ponto final no ranca rabo com Lidi, encerrando sua saga em muito bom humor e energias positivas — tirando o fato de que ele vai preso.

Talvez a próxima temporada se aprofunde na inequidade do sistema judiciário e vá além, mostrando sua natureza questionadora e que, de fato, não veio para ser apenas mais uma série alienada da sociedade em que está inserida.

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