A Sogra que te Pariu e a ruptura temporal de Rodrigo Sant'Anna
A famosa Teoria da Relatividade estabelece que nada pode ultrapassar a velocidade da luz, e que, caso isso ocorra, o espaço-tempo deixa de existir para o corpo que a tenha alcançado. Também se estabeleceu ser impossível atingir tal velocidade, mas, como sempre, a sucateada ciência brasileira, mesmo sem orçamento algum, nos provou ser sim possível realizar esse feito.
Rodrigo Sant’Anna é o responsável pelo experimento A Sogra que te Pariu: O primeiro ambiente 100% livre do conceito de tempo, onde tudo e nada coexistem em harmonia.
A segunda sitcom nacional da Netflix — já que a primeira foi a série O Mecanismo, que narrou as desventuras da Operação Lava Jato — inova ao trazer conceitos pouco explorados no gênero, como a trilha de risadas facultativa, que ora está presente no episódio, ora some sem grandes explicações.
Neste universo fictício, todos os outros personagens são meros figurantes em suas órbitas solitárias e, vez ou outra, colidem com o astro rei.
Nossa sogrinha começa nos inserindo no contexto de sua personagem: Mãe, dona de casa e empoderada, ela chega para passar a pandemia com o filhote e a mona dele. Esta, infelizmente, reforça muita rivalidade feminina ao longo dos 10 episódios.
Ao entrar na mansão dos pombinhos, Rod é imerso em uma cápsula vagando a 300.000 Km/s (coincidentemente, a exata velocidade da luz) pelo universo. 76 semanas se passam em um piscar de olhos e a linha do tempo da velha finalmente colide com a do espectador.
Algumas intrigas e questões familiares como ciúmes, desconfiança e falta de responsabilidade afetiva preenchem vários minutos do tempo de tela por repetidas vezes até caírem em um limbo temporal.
Papo vai, papo vem e o enredo continua o mesmo: Rodrigo Sant’Anna é atacado mas não deixa barato, atacando novamente o grande nome da Fazenda 12, Lidi Lisboa. A sensação de Dejà Vu acalenta os corações dos mais dispersos, que, caso tenham perdido determinada discussão, rapidamente encontram o fio da meada após o mesmo conflito ser apresentado alguns minutos depois.
Uma novidade que a obra traz para as produções audiovisuais é a completa ausência do monopólio capitalista, já que, apenas no primeiro episódio são citadas as marcas: Tio João, Globo, Velho Barreiro, Gelol e Lojas Americanas. Estas não receberam nem pagaram um centavo pela citação.
São muitas as críticas explícitas na obra, como o fato dos atores contratados para interpretar os filhos do casal tenham, provavelmente, em torno de 40 anos de idade, refletindo uma sociedade em que a juventude é forçada a crescer cedo.
Também não faltam críticas contra a indústria da beleza, ao passo que Rô Sant'Anna fica irreconhecível enquanto botoxado e harmonizado, a ponto de mal conseguir abrir a boca para falar o texto.
Alguns enredos existem e rapidamente se desfazem como dunas ao sofrerem a ação dos ventos e as piadas sem timing expressam o tempo que já não existe nesse universo.
Como em uma grande vinheta de ano novo da Globo onde o mundo é feito de algodão doce, Sant’Anna tem a sua redenção perante ao público e coloca um ponto final no ranca rabo com Lidi, encerrando sua saga em muito bom humor e energias positivas — tirando o fato de que ele vai preso.
Talvez a próxima temporada se aprofunde na inequidade do sistema judiciário e vá além, mostrando sua natureza questionadora e que, de fato, não veio para ser apenas mais uma série alienada da sociedade em que está inserida.