Luccas Neto e sua Polishop TV só para baixinhos
O ano é 2026 e sua torradeira hightech imprime um anúncio da Americanas na fatia de pão levemente torrada, junto de um QR Code que o leva para uma propaganda de 15 segundos estrelando um ex-BBB. Após assisti-la, lhe é desbloqueada a temperatura média-alta do aparelho.
Depois do vitaminado café da manhã, você recebe um SMS para classificar em até cinco estrelas a qualidade da tostagem do pão e, se possível, compartilhar nos stories do Instagram para receber um bônus de R$ 2,50 em sua próxima compra.
Em um tom melancólico, constata que tudo mudou, menos o saudoso canal do Luccas Neto, que não só previu essa realidade ultrapublicitária, como também foi o precursor dela.
Abrem-se as urnas e são colocados todos os vídeos do canal Luccas Neto — Luccas Toon, dos quais oito são sorteados ao acaso para esta análise.
Em um deles, o espectador mal imerge na história quando é capturado pela primeira interrupção publicitária. “Atenção mamães e papais” anuncia a voz do além em uma tentativa de burlar a lei da publicidade infantil. As cordas vocais de Luccas Neto marcam presença pela primeira vez no vídeo, ao contrário dele, que segue ausente.
Desenvolvimento, conclusão da história e, por fim, mais uma propaganda, formam o esqueleto dos vídeos, e tudo regado de muitos efeitos sonoros, trilhas de risada desconexas, entre outros sons livres de direitos autorais.
Apesar de aparecer na capa e no título dos vídeos — além de duplamente no nome do canal — Luccas sequer dá as caras na maioria deles, se dando apenas ao trabalho de fazer uma pontinha com o seu catálogo Polishop e chegando para entregar o vale refeição mensal dos Aventureiros — os heróis que carregam o canal nas costas enquanto Luccas Neto desaparece por alguns meses.
Já na obra de nome ‘Luccas Neto ganhou um celular mágico’ temos a presença de nosso protagonista pela primeira vez após sete vídeos. Apesar do grande feito, não há nada para se comemorar. Luccas furta um celular e engata a confissão do crime no merchan do Miojo do Luccas Neto, fazendo a vítima suprimir qualquer tipo de sentimento negativo enquanto anuncia para as mamães e papais que o produto é fonte de inúmeras vitaminas.
Sofrendo com sonhos lúcidos e mensagens do inconsciente, o espectador se vê obrigado a conferir o e-commerce do Gugu Neto e se depara com dois sites diferentes: o Luccas Neto Livros, cujo carro-chefe são as várias edições de álbuns de figurinhas do próprio, e a Loja Luccas Toon.
Nesta segunda, são encontrados os mais diversos produtos: Enxaguante bucal, achocolatado, gel corpo e cabelo, kit de mágica, shampoo 3 em 1, baldinho de praia e complexo vitamínico — este último tendo como base fragmentos do Miojo do Luccas Neto.
Nosso figurante ainda utiliza seu canal para o plantio de fake news. Em ‘Luccas e Gi fingem ser piloto (sic) de avião por um dia’, além do suposto protagonista não aparecer, o vídeo sequer chega a ser sobre aviões. Não bastasse, ainda conta com parte do título em inglês para enganar a criançada fora dos limites territoriais nacionais.
E no final de tudo, o que lhe resta além do vazio existencial e de dívidas supérfluas? O espectador, após zerar o cartão comprando o inseticida do Luccas Neto e o talão de cheques do Luccas Neto, busca ajuda médica imediata e desinscreve-se do canal Luccas Toon, finalizando este capítulo de sua vida.
Em uma proporção de oito vídeos para uma única aparição de Luccas, roteiros e atuações merecedoras de Emmy Internacional e lições de moral que variam entre valorizar a família e colocar laxante na garrafa da diretora da escola, Luccas Neto se prova ser, antes de um artista, um publicitário. Munido de meia dúzia de clickbaits e com o apelo infantil, tomará em suas mãos, em um futuro não tão distante, toda a indústria do audiovisual, e apenas sua face estampará os telões da Times Square.
