Versions of Me: Um Déjà vu sonoro

paula
PseudoResenhas
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5 min readApr 15, 2022

Com incríveis 62 compositores, Anitta nos abre o livro de sua vida para contar sobre todas as versões de si mesma em seu quinto álbum de estúdio, Versions of Me, lançado em plena quarta-feira para não ser ofuscado pelo feriado de Sexta-feira Santa.

Somando-se os dois algarismos da quantidade de compositores, temos o numeral 8, que, na numerologia representa o infinito; Algo que não começa nem termina, apenas existe. Talvez este seja o grande conceito do álbum, já que algumas faixa de apenas dois minutos e pouco parecem durar uma eternidade, devido a repetições exaustivas do refrão e um instrumental que não empolga.

O dito cujo

Começamos nossa jornada rumo ao empoderamento dos brasileiros hispanohablantes com o single Envolver, que passa uma linda mensagem sobre ejaculação precoce e filosofias de pegar-mas-não-se-apegar. Em apenas 18 segundos é dada a marretada certeira no family friendly, já expulsando os tradicionalistas. Na tentativa de parecer conceitual, o final da música dá uma estourada nos tímpanos e se despede.

Uma surra de onomatopeias recebe o ouvinte na próxima faixa, intitulada Gata. Este é mais um hino de emancipação feminina escrita majoritariamente por homens. Nesta, porém, Anitta terceiriza a sacanagem, colocando um rapper qualquer para fazer referências a nheco nheco enquanto ela fica apenas nas alusões.

No bingo da baixaria, I'd Rather Have Sex pontua com louvor já nos primeiros 14 segundos. Anitta informa em meio a um asmr que prefere não brigar, e sim, nhanhar com o boy. Um ponto positivo da canção é a tentativa de hitar no Tiktok, com a letra que manda ir para a esquerda e para a direita. Os amantes de dancinhas vão se deliciar! De quebra, a cantora ainda inaugura a categoria de músicas em que ameaça tirar a roupa, um tema que passa a ser recorrente no álbum.

Chegamos ao momento ‘paródias Galo Frito’ com Gimme Your Number, onde um crime é cometido e a clássica La Bamba — belíssima canção de amor em que o último romântico promete ensinar sua amada a dançar — é desconstruída e deixada em frangalhos com Anitta e o desconhecido do feat implorando o número de um outro desconhecido para provavelmente realizarem o ato. O ponto positivo fica por conta da produção que, ao trabalhar mais a introdução das músicas para durarem pelo menos uns 10 segundos, garante mais tempo de stream para a cantora. E quando menos se espera, um pequeno déjà vu de roupas caindo ataca novamente.

A obra fonográfica já mostrou a que veio há muito tempo, e poderia facilmente ser um EP de 3 faixas. Seu maior ponto positivo é apresentar a mesma temática em trilhões de versões diferentes para que alguma delas consiga furar a bolha e gerar um hit orgânico nos reels do Instagram.

O momento nostalgia do álbum fica por conta da desinteressante faixa Maria Elegante, que mais parece aquele toque de celular personalizado “Maria, te ligam” do extinto serviço de trambicagens. Em seguida, o sonífero Love You chega para dar uma pausa no período fértil da cantora e fazer uma linda declaração ao objeto do desejo: Eu te amo mas não quero te amar. A inspiração da música deve ter sido a gravadora exigindo uma mudança de tema.

Mudança essa que continua no single Boys Don't Cry, onde, após seis faixas implorando pela atenção masculina, Anitta se empodera e avisa que não aguenta mais os boys lhe dando tanta atenção. O lacre continua na aguardadíssima faixa-título Versions of Me, que chega para mostrar todas as versões de Any, e inova ao apresentar apenas uma: A da mona que vai espatifar a janela do carro do crush caso desconfie que ele está de butuca em outra. Após alguns cenários catastróficos, a música nos deixa sem grandes explicações.

A cantora representa o feminismo liberal em sua forma mais pura ao retornar ao tópico ‘homens’ com a canção Turn It Up, e, novamente, roupas caem e ela pede inúmeras vezes para se aumentar algo que a própria não conta ao ouvinte o que é.

Em Ur Baby, temos uma faixa patrocinada pelo site de apostas Sporting Bet. Nela, a cantora pergunta repetidamente se o alvo da composição ‘quer valer’. Além da publi, ela ainda avisa ao flerte ‘quero ser o seu bebê’ mais do que o necessário para que ele entenda.

Nessa parte final do disco, temos uma chuva de singles, para facilitar a vida do ouvinte que quer ouvir apenas as músicas mais conhecidas, sem ter que garimpá-las no álbum.

Girl from Rio, rebaixada de faixa-título para apenas single, veio para empoderar as mulheres de bunda grande e cintura fina. Novamente, a cantora terceiriza a baixaria, ficando apenas nas alusões enquanto os ilustres convidados fazem a festa.

A versão beta do grande sucesso internacional da MC Melody, Faking Love, retoma a figura que gosta de pisar em homens. Sabemos que não passa de um personagem, mas fica o questionamento: Será que Anitta acha que engana alguém?

E finalmente a garota do Rio se recupera com Que Rabão, voltando a seduzir o gênero masculino com uma composição datada de 2015 que não acrescenta muito na narrativa do álbum. Já a composição Me Gusta realmente é um caso a parte: Contando com um time de 10 autores, a faixa não entrega nada que qualquer outra com apenas 3 não entregasse. Poderiam ter economizado nas contratações.

E para encerrar com chave de ouro, a finalíssima Love Me Love Me ilude ao dar a entender que seria mais uma pausa na libido e acaba retomando o tópico ‘queda de roupas’ para situar o ouvinte mais uma vez, caso ele ainda não tenha entendido que roupas, de fato, estão caindo.

Como saldo final do álbum de maior densidade demográfica do cenário brasileiro, temos uma obra que prometeu muito e cumpriu pouco. Não há como apresentar ao público um projeto que, teoricamente, falaria sobre todas as versões de si mesma enquanto se faz parte de uma fração minúscula da composição do mesmo. No mais, fica a torcida para que Anitta encontre, com urgência, uma costureira para arrumar as suas roupas que ainda estão caídas.

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