Chorar é ter um insight redentor

Mariana Farinas
Psicologia mastigadinha
3 min readJul 1, 2018

O choro que nos faz sentir melhor, em geral se precipita como resposta à um sinal nítido de segurança.

Esse sinal pode ser um rosto familiar, um carinho que persiste e não nos abandona, um gesto amistoso, uma voz solidária ou até mesmo uma imagem comovente em uma narrativa interna. Ele marca a transição de um estado de alerta para um mais relaxado e protegido. Fisiologicamente, isso significa que uma ativação do sistema simpático, responsável pelo estado de alerta, cedeu espaço para uma ativação do sistema parassimpático, que é o responsável pelo relaxamento, pela digestão e descanso. Outros sinais dessa passagem de um estado para o outro podem ser suspiros cada vez mais serenos, tremores seguidos de uma maior e mais tranquila entrada de ar e assim por diante.

O choro que nos faz bem é aquele que nos permite viver plenamente um senso de vulnerabilidade e alívio. A atenção fica no próprio corpo e nas imagens e narrativas íntimas que acompanham a comoção. Ele é acompanhados de grossas lágrimas, aumento de salivação e do nariz escorrendo. Essa umidificação do rosto como um todo e as contrações rítmicas do diafragma são seguidas por uma diminuição no ritmo cardíaco e da respiração. A digestão volta ao normal. É como se o corpo todo estivesse dizendo: “Bem, é isso então…”, em uma abertura para um outro jeito de estar.

Mas é claro, nem todos os choros são bons. Em momentos de insegurança, como na presença de quem não confiamos e em períodos em que passamos muito tempo com uma tristeza que não conseguimos resolver, o choro não se precipita fácil. O choro que vem quando não encontramos segurança suficiente para relaxar não se desenrola de forma a fazer a transição para um estado suficientemente tranquilo. Nestes casos podem vir choros reclamões, irados ou melodramáticos, com muitas vocalizações e poucas lágrimas. Podem surgir choros tremidos ou, simplesmente, um choro que não se desenrola e para logo que começa. Pessoas com depressão, síndrome do pânico e outros transtornos emocionais podem perder a capacidade de um choro que equilibra, pois também perdem a capacidade de manterem-se presentes nas poderosas sensações deste momento.

Chorar em situações cuja solução não está à vista — ou nunca chegará, como em um luto — é descansar temporariamente da luta. Esse descanso pode ter chegado a partir de um colapso, mas pode ser uma folga, um descanso antes de para voltar à luta, um lembrar que tudo passa. O choro nestas circunstâncias difíceis também podem ser um indicativo de que abriu-se alguma brecha de segurança.

A chegada e o desenrolar de um choro é um momento de entrega em que pode se aceitar algo muito importante com o sentido que isso de fato tem para nós. Pode ser uma lembrança comovente que estava esquecida, a compreensão do porquê algo que nos chateou, a importância do gesto de alguém, o valor afetivo de um momento de nossas vidas. A narrativa interna e a imagem a partir da qual o choro se precipitou torna-se um ponto de mudança poderoso para uma maneira renovada de perceber alguma situação. O choro bom é uma forma de insight comovido e redentor.

— Alan Fogel. Are all cries good for you?

Jay Efran, Mitchell Greene. Why We Cry: The Fascinating Psychology of Emotional Release

--

--