Manifesto contra a descultura, por uma humanidade em reconstrução.

Matilde Magro
Community Lotus
Published in
3 min readDec 1, 2020

Vivemos numa realidade a entrar no pós-distópico. Quando a maioria da pertença humana se sente a abraçar um real que se adequa à natureza da qual o homem faz parte e não o seu contrário.

Uma humanidade em reconstrução quer-se sábia em não repetir os erros anteriores de demagogias bacocas e hegemonias cristalizadas na irrealidade. A fase distópica está a passar, porque assim se quer uma realidade humana que não transcende a natureza mas faz parte dela.

A realização da insignificância do individuo e do colectivo passa pela aceitação da importância da acção.

A “descultura” que vemos presente homenageia o horror. Somos contra o horror. O horror que pereça onde faz parte, do vazio de amor, da ausência de compaixão, da intolerância ao bem.

A “descultura” promove que o bonito transcenda o conteúdo e a mentira a verdade. As “fake news” não são mais que propaganda desinformativa de corpos mal educados, mal formados por academias burocráticas, autocráticas, colonizadoras e patriarcais. A História está repleta de erros crassos, não reais, cheios de amarguras de uma humanidade que se transforma constantemente numa ideia de sobreposição do real, que nunca consegue. Esta luta desumana contra si própria traz-lhe a morte e o presságio da continuação do horror que se faz a si própria.

Negamos isso. Não fazemos parte.

A larga e silenciosa maioria transforma para o positivo o que uma minoria grita que a beleza é feia e a verdade mentira. O óbvio, o bom senso, acaba por triunfar na demasia que é a calma após a tempestade.

O bom senso não é mais que o sentido do bem. Já dizia Arendt, “o mal não tem profundidade”. De superficial e amargo por sua própria des-existência, desistência da existência. O mal não tem profundidade.

Uma humanidade em reconstrução traduz-se no elevar dos heróis dos nossos tempos, os que nos lembram da ancestralidade da reverência ao que nos sustenta. Os heróis dos nossos tempos, os indígenas, os aborígenes, os ditos selvagens mais civilizados que qualquer tentativa de civilização contrária.

Uma humanidade em reconstrução traduz-se na co-criação entre si pelo belo, pelo conceptualmente bom, radicalmente bom.

Uma humanidade em reconstrução traduz-se na beleza que é o quotidiano da compaixão e do sentido comunitário. Nos diálogos difíceis cheios de afecto, que perdoam um passado que já não faz sentido.

Sentido, de sentir. A capacidade de existir.

Famílias que outrora amarguradas por idealismos fúteis e desembarcados dos cais empáticos, hoje ousam a saída da cobardia por uma igualdade que não assenta na hegemonia da semelhança, mas sim na valorização da qualidade de se sentir única, único, unique.

Família colectiva, aldeias comuns, a competitividade rasca de quem se vê inferior sem aceitar que a sociedade do mérito e da valorização da repetição e da falta de criatividade, se expressa no vazio das reacções à solidão humana. Uma falsa aparência pouco modesta de quem se está a “cagar” para a humanidade comum. “Borrifando-se” num éter colectivo, alimentando-se do bem dos outros para mérito próprio, sem conseguir vaiar o conteúdo que o promoveu originalmente.

Tentativas de apropriação retraem-se a medo de uma história que já não se conta de vencidos de guerras inúteis, más, vazias.

Agora a história conta as vencedoras da realidade, a capacidade de erguer o que se tentou, sem nunca conseguir, destruir.

Agora a história conta os verdadeiros heróis, que por dentro conseguiram alterar sentidos humanos de beleza e a não vã-gloria dos desnutridos de cultura real.

Quem são os teus antepassados do chão que pisas?

Quais características tuas abraçam a diferença sem a pisar?

Quais as tuas acções em prol do amor ao teu parente, vizinho, amigo, amante?

Quem és tu por detrás das máscaras de egoísmo, vaidade e mesquinhez?

Não assinamos a descultura. Erguemos os heróis dos nossos tempos.

Pós-distopia diz-se reconstrução de uma humanidade baseada na bondade. Este é o tempo.

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